Título: Crescimento indiano cria nova 'casta', a dos milionários
Autor: Lakshman, Nandini
Fonte: Valor Econômico, 08/01/2007, Especial, p. A10

Mesmo para os padrões de Lonavala, cidade montanhosa a pouco mais de 100 quilômetros de Mumbai onde os novos ricos indianos gostam de passar o fim de semana, a casa de campo de Rakesh Jhunjhunwala é extravagante. O bangalô de 1,4 mil metros quadrados ostenta piscina, banheira, sala de karaokê, academia, salões de festa e varandas, onde Jhunjhunwala hospeda familiares, amigos e sócios. Em Mumbai, esse fumante inveterado de 47 anos, fundador da empresa de investimentos Rare Enterprises, acaba de comprar um apartamento de cobertura, duplex, de US$ 5,4 milhões, no elegante bairro de Malabar Hill.

"Tenho muito mais do que preciso", diz Jhunjhunwala, cujo valor patrimonial é estimado em pouco menos de US$ 1 bilhão. "Mas me dá liberdade para fazer o que eu gosto e de gostar do eu que faço."

Embora milhões de indianos ainda vivam na extrema pobreza, a economia cresce muito e as fileiras de abastados crescem a passos largos. Atualmente, cerca de 83 mil indianos possuem mais de US$ 1 milhão; há dois anos, eram 71 mil, segundo estima a American Express. O número aumenta 13% ao ano. Pela matemática da AmEx, em 2009 haverá 1,1 milhão de pessoas físicas com ativos no valor de US$ 100 mil, uma soma nababesca na Índia, em comparação com o número atual de 700 mil.

"Estou surpreendido com a riqueza neste país", diz Sujay Chauhan, que no ano passado deixou o seu emprego no instituto de pesquisas tecnológicas Gartner para fundar a Aquasale, uma concessionária de barcos em Mumbai. Ele já tem sete encomendas de iates, num valor total de US$ 10 milhões.

Grande parte disso é dinheiro novo; não provém de fortunas tradicionais. Setores pulsantes como o de serviços de software, telecomunicações, finanças e imobiliários alimentam novos milionários a cada dia. O índice das principais ações da Bolsa de Valores de Bombaim, que mantém o antigo nome de Mumbai, dobrou nos últimos dois anos e trouxe ganhos tremendos para seus muitos investidores.

"A Índia é o mercado que mais cresce em criação de riqueza", diz Nicholas Windsor, diretor de serviços financeiros pessoais do HSBC India, que ano passado criou uma unidade de private banking, de administração de grandes fortunas, para atrair clientes com investimentos de mais de US$ 500 mil.

"Para nós é um momento fabuloso", diz Ravi Trivedy, diretor de serviços de assessoria da consultora KPMG, que ajuda os bancos a personalizar serviços para os ricos.

O primeiro lugar em que a nova classe endinheirada normalmente mostra seu dinheiro é em grandes casas ou apartamentos luxuosos. A demanda por casas com mais de 280 metros quadrados, palacianas para os padrões indianos. Elas costumavam ser construídas apenas em Mumbai e Nova Déli, mas começam a aparecer em cidades menores, segundo a consultoria imobiliária Cushman & Wakefield.

Em setembro, a Ambience Builders & Developers investiu US$ 120 milhões em um terreno de 60 acres em Hyderabad, onde planeja construir casas de alto padrão. Cada uma das grandes cidades indianas tem entre 400 e 500 casas estimadas em mais de US$ 2 milhões, de acordo com a agência imobiliária Knight Frank, de Mumbai.

"Todos se sentem bem ao dar às suas famílias uma vida confortável", diz o ator e apresentador de talk shows Rohit Roy, que no ano passado mudou-se para um apartamento de quatro quartos de frente para o mar em Juhu, um subúrbio luxuoso de Mumbai.

Os carros, é claro, são outra grande forma de fazer uso dos milhões. Apesar de impostos que dobram o valor dos carros importados, as vendas de modelos de alto luxo ganharam força. A rede de concessionárias National Garage, que vende várias marcas, incluindo Ferrari, informa que a demanda pelos automóveis de mais de US$ 200 mil é muito maior do que a oferta. Para sustentar a imagem da Ferrari, recusou 700 clientes que "não se encaixavam em nosso perfil de produto", diz o diretor de marketing, Farhad Vijay Arora.

Na Navnit Motors, os clientes compraram no ano passado 200 BMWs de até US$ 150 mil e 10 Rolls-Royces de até US$ 600 mil - o quádruplo de cinco anos atrás. "Estamos vendo um aumento repentino no interesse nesses carros de luxo", diz o diretor da Navnit, Sharad Kachalia.

Para satisfazer a explosão na demanda, no próximo ano a BMW pretende abrir uma fábrica de montagem de veículos em Chennai e espera elevar as vendas para 1,8 mil unidades ao ano. A meta não deverá ser difícil de alcançar: a rival Mercedes-Benz, que possui fábrica em Pune, vendeu mais de 2 mil carros no ano passado.

Embora os indianos abastados tradicionalmente sejam cautelosos em ostentar seu dinheiro, mais pessoas também querem mostrar sua riqueza nas roupas. Louis Vuitton, Hugo Boss, Valentino, Gucci e Fendi abriram lojas na Índia nos últimos dois anos. A Kimaya Fashions, uma loja de alto padrão em Juhu, que há vários anos vende roupas de desenhadas na Índia para pessoas da sociedade e estrelas de Bollywood - a Hollywood de Bombaim - começou a vender mais marcas internacionais, como Roberto Cavalli e Giorgio Armani. "O conto sobre Índia apenas começa a se desdobrar e agora sabemos que é para valer", afirma o diretor da Kimaya, Pradeep Hirani.

Há potencial de sobra para crescer. O mercado de roupas e acessórios de luxo na Índia movimenta US$ 434 milhões por ano e pode chegar a US$ 800 milhões até 2010, segundo estimativas da consultoria Technopak Advisors. No ano passado, os indianos gastaram US$ 141 milhões em relógios de luxo e o ritmo de aumento nas vendas é de 40% ao ano, diz a Technopak.

"Não sou uma pessoa de comprar acessórios, mas gosto de carros e relógios", diz Arun Mansukhani, 37, diretor da operadora de telefonia celular Hutch. Sua coleção inclui um Tag Heuer, um Montblanc e um Cartier, além de um Porsche e um BMW.

As vendas de vinho também decolaram no país, com o respaldo de grupos como a Sociedade de Vinho da Índia. A associação, criada em setembro, promoveu uma degustação no majestoso Taj Palace Hotel, em Mumbai, onde divas da sociedade e estrelas de Bollywood provavam tikka - uma espécie de espeto de frango - e Château Latour de US$ 160 a garrafa.

Nem todos os indianos ricos se sentem confortáveis em mostrar suas novas riquezas. Umesh Chadha, que dirige a empresa de gás e petróleo Luminous Energy, de Mumbai, com escritórios nos Estados Unidos e em outros três países, tem três carros, mas não se importa em locomover-se pela cidade nas frágeis "moto-táxis" de três rodas. Embora Chadha goste de passar as férias nos Estados Unidos - planeja um cruzeiro ao Alasca no próximo ano - ele jura que não mudou muito em comparação aos seus dias de infância em Shivaji Park, um confortável, mas não extravagante bairro de Mumbai. "Eu mantive os meus valores de classe média", diz ele.

Alguns são ainda mais relutantes em se exibir. Há três anos, o cirurgião oftalmologista Burjor Banaji comprou um sedã Classe C da Mercedes-Benz para se locomover ao trabalho. Gostou da Mercedes, mas a vendeu em setembro para "fugir da atenção, que era um pesadelo". Agora, dirige um sedã Octavia da Skoda, subsidiária tcheca da Volkswagen. "Eu adoro", diz Banaji, "porque é anônimo".