Título: Para Palocci, FHC foi "deselegante"
Autor: Rodrigo Bittar, Cesar Felicio e Maria Lúcia Delgad
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2004, Política, p. A7

O governo reagiu em peso, ontem, às críticas do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à administração do PT, que considerou incompetente. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, disse que faltou "elegância" às críticas do ex-presidente e acrescentou que muitas das ações feitas pelo governo atual em quase dois anos foram para "corrigir equívocos cometidos no período anterior". Na última segunda-feira, em seminário do PSDB, FHC classificou o governo petista de "incompetente". Ontem, ao comentar o substancial crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no último trimestre, Palocci elogiou o desempenho do governo em todas as áreas, mesmo naquelas em que há assumidos problemas gerenciais, como o programa Bolsa-Família. Para o ministro, o "ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sempre tem sido um homem muito elegante, essa é uma característica de sua personalidade. Não sei por quê, em um determinado momento, ele se desviou desse procedimento, que é tradicional na sua conduta, se referindo dessa maneira ao governo. Só ele pode responder a isso", comentou o ministro. "A condução do processo econômico vem sendo feito de maneira efetiva, com resultados, se nós olharmos o esforço que foi feito - inclusive para corrigir equívocos cometidos no período anterior". O presidente do PT, José Genoino, se encarregou de responder formalmente ao ex-presidente, em coletiva à imprensa durante o encontro nacional de prefeitos. "O ex-presidente veio para a disputa e o PT está muito à vontade para disputar com ele", disse. Segundo Genoino, "a competência de Fernando Henrique nos deu o apagão, o maior desemprego e maior endividamento da história do País. Ele não quer que o Brasil dê certo porque os números da economia o estão incomodando. É uma posição sectária e arrogante". O ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, enfatizou que tem um enorme respeito pelo ex-presidente, mas considera que FHC tenta, com tais críticas, ganhar espaço na mídia e se fortalecer para disputar com o governador Geraldo Alckmin, no PSDB, a candidatura pela presidência da República. "O Fernando Henrique deve olhar, primeiro, para a disputa interna (no PSDB). E, só depois, para a outra disputa, que é com Lula", disse o ministro. "O governo FHC recorreu ao FMI três vezes. Nós, no governo Lula, estamos saindo do Fundo", afirmou. Além de citar indicadores econômicos , Rebelo alfinetou o ex-presidente lembrando que o sociólogo pernambucano Gilberto Freire recusou-se a participar da banca da USP na ocasião da defesa da tese de mestrado de FHC. "Esse governo Lula expressa muito mais o Brasil de Gilberto Freire que o da sociologia francesa da USP", disse Rebelo. O ministro afirmou, ainda, que o maior exemplo de incompetência do governo anterior foi a crise de abastecimento de energia. Rebelo afirmou, ainda, que durante os seis primeiros anos de FHC adotou uma linha de política externa que ignorava a existência da América Latina. O ministro enfatizou ainda que o ex-presidente tem conflitos ideológicos, pois em 1996 defendeu arduamente a globalização, e em 2001 assumiu um discurso crítico em relação às conseqüências desse processo para os países em desenvolvimento. O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, considerou as declarações do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso como retórica ideológica dos tucanos para atrair a atenção de determinados setores da sociedade. "É preciso humildade por parte de FHC e dos tucanos. Considero positivo para o Brasil que o PSDB e o ex-presidente se disponham a comparar os governos. Inclusive podemos começar pelo crescimento da economia e do emprego", ironizou Dirceu, no Rio. O governador paulista Geraldo Alckmin rebateu a reação dos petistas. "Se o próprio PT critica o governo, porque nós da oposição também não podemos? Não pode existir monopólio na crítica. O governo precisa aprender a ouvir críticas e entender que criticar não é ofender", disse. O ex-ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, promotor do seminário em que FHC discursou disse que o discurso do ex-presidente serviu de baliza para o partido: "Não foi discurso de candidato, e sim da voz mais importante do partido. Ele assumiu a liderança e diz que o processo da sucessão no PSDB passa por ele". Defensor da candidatura do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o ex-ministro diz que FHC não pode fazer o mesmo -" Ele perderia a legitimidade como comandante do processo". Para Mendonça de Barros, a divulgação de indicadores econômicos positivos não obscureceu a crítica do ex-presidente. "A política econômica em vigor é tucana. O PT a contesta", diz. Ele relembra que Lula dizia ser contrário às exportações enquanto houvesse gente passando fome no país. "É isto que precisamos explorar na sucessão presidencial". (Colaboraram Janaina Vilella, do Rio, Henrique Gomes Batista, de Brasília e Maria Cristina Fernandes, de São Paulo)