Título: Ministro critica operadoras e Anatel
Autor: Moreira, Talita e Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2006, Empresas, p. B3

O ministro das Comunicações, Hélio Costa, distribuiu críticas às empresas de telefonia e à Anatel no polêmico discurso que fez na segunda-feira à noite, durante a abertura da Futurecom, congresso e feira do setor que acontece em Florianópolis.

Desde o órgão regulador até a revista britânica "The Economist" foram vários os alvos do ministro, cuja atitude foi considerada "política" por alguns e "descortês" por outros. Executivos das principais empresas do setor avaliaram, sob a condição de anonimato, que Costa foi agressivo.

O ministro apontou falhas no modelo regulatório e disse que "a evolução tecnológica não deve servir para encobrir questões do setor". Segundo ele, a universalização dos serviços telefônicos no país é fortemente baseada na oferta - e não na demanda. "Ofereço um telefone com assinatura de R$ 50 no interior de Pernambuco e digo que estou fazendo universalização."

Costa também atacou o regime de interconexão nas ligações de telefones fixos para móveis, remuneradas por uma tarifa conhecida pela sigla VU-M. "Temos que fazer uma grande discussão nesse sentido", afirmou. "Há uma assimetria que transfere anualmente R$ 6 bilhões das fixas para as celulares, dos quais R$ 1 bilhão só dos telefones públicos."

As operadoras de telefonia móvel argumentam que foi essa estrutura de interconexão que permitiu levar o celular pré-pago a consumidores de renda mais baixa. Mas, segundo Costa, isso não basta, já que menos de 50% dos municípios brasileiros têm hoje cobertura de celular (eles representam cerca de 10% da população do país).

Costa ressaltou que o assunto está parado "há muito tempo" na Anatel e que o ministério irá criar um grupo de trabalho para discutir questões como a VU-M, o Plano Geral de Metas de Competição (que o órgão regulador pretende colocar em consulta pública até o fim do ano) e a conversão do sistema de cobrança de pulsos para minutos. Esses assuntos, em princípio, são da alçada da agência.

Mas, pouco antes, em seu discurso, Costa fez um ataque à revista "The Economist", que publicou reportagem na qual apontava o enfraquecimento dos órgãos reguladores no Brasil. "A revista se esqueceu de dizer que quem define política de telecom no Brasil é o ministério, e não a Anatel", destacou. "E a matéria é tão ruim que diz que o ministro é das Telecomunicações [e não das Comunicações]."

Em outro momento, ele fez críticas ao Aice, o telefone voltado para baixa renda que foi desenvolvido pela Anatel, cujas vendas têm sido pequenas. "A adesão tem sido desprezível. Por isso eu insisti tanto no projeto [de lei em tramitação no Congresso] do telefone social."

O ministro também foi irônico com a Nokia, cujo nome foi citado por ele indiretamente. Costa afirmou que a empresa tentou "nokiautear" sua atuação e a da ministra-chefe da Casa-Civil, Dilma Roussef, porque eles escolheram o sistema japonês de TV digital. Ele qualificou a companhia de "lobista do padrão europeu".

A afirmação fez referência à apresentação da Nokia sobre TV digital num evento realizado na semana passada na Guatemala. Na ocasião, a empresa apresentou slides para ilustrar sua palestra. "A empresa que tentou fazer essa descortesia com o governo brasileiro até que sabe fazer celulares, mas não sabe fazer documentários. É muito ruim, um fracasso." A Nokia não quis comentar o assunto.

Executivos do setor evitaram rebater abertamente as declarações de Costa. "Ele é um ministro de Estado que veio até aqui representando o presidente da República", ponderou um deles.

Mas o presidente da Telefônica, Fernando Xavier, rebateu a afirmação de Costa segundo a qual não houve universalização do serviço de telefonia fixa no país. "Não podemos dizer que não seja um absoluto sucesso", disse ele, destacando que a adesão ao telefone fixo em São Paulo (mais de 30% dos domicílios) é maior do que em qualquer país da América Latina e muito próxima dos níveis da Europa. "Querer 100% de penetração é responsabilidade do governo, com os recursos do Fust."

O presidente da TIM, Mario Cesar Pereira de Araujo, disse acreditar que o ministro "vai mudar de opinião" sobre a VU-M, após um "debate democrático". Ele salientou que "não existe transferência de receita das fixas para as móveis" e que o modelo de reajuste baseado em custos, que entra em vigor em 2008, dispensaria a criação de um grupo de trabalho para o assunto.

Xavier e Araujo aproveitaram as respectivas apresentações no Futurecom para defender a revisão do modelo regulatório brasileiro. "Dez anos se passaram, muito foi realizado, mas o momento é de novo debate", disse o executivo da Telefônica. Ele se referiu às barreiras regulatórias existentes hoje para que as operadoras de telefonia atuem na plataforma batizada de "triple pay", que permite a transmissão de imagens, voz e dados.

Xavier deixou claro que opções no âmbito da televisão por assinatura despontam como oportunidade de negócios também para as operadoras de telefonia, mas há entraves legais. Ele ponderou que as empresas de TV por assinatura já oferecem "triple play".

O presidente da TIM seguiu na mesma linha. "Havia uma separação por serviços, mas esse modelo está no fim", disse. Ele lembrou que as transformações são tão rápidas que se tornam um desafio para os órgãos reguladores. Citou como exemplos o site de vídeos YouTube, que alcança média de 100 milhões de acessos por dia, ou o Skype, que oferece telefonia pelo protocolo de internet, com 113 milhões de clientes registrados. Ambos utilizam a infra-estrutura das operadoras de telefonia, mas chegam ao consumidor de forma independente. (*Do Valor Online)

As jornalistas viajaram a convite da organização da Futurecom