Título: Marketing excêntrico faz Red Bull faturar 2 bilhões de euros no mundo
Autor: D'Ambrosio, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2006, Empresas, p. B4
De fora, a construção impressiona e destoa da arquitetura clássica de Salzburgo, na Áustria. Os imponentes sete mil metros quadrados erguidos em uma estrutura de vidro e metal insinuam o espetáculo que está por vir. Lá dentro, uma coleção de 14 aviões raros e extremamente bem conservados, como o que pertenceu ao marechal Tito da Iugoslávia, dividem espaço com carros originais de Fórmula 1, exposições de arte, dois bares e um restaurante. Rapazes de ternos pretos e belas garotas com vestidos pretos justos, mas distintos, servem os coquetéis. Todos, obrigatoriamente, servidos com uma boa dose do energético Red Bull.
O que era para ser uma garagem de aviões transformou-se no Hangar 7, a melhor tradução da estratégia de marketing do excêntrico Dietrich Mateschitz, dono da marca Red Bull. Nada que esse executivo faz é simples ou despretensioso. Há três anos, o executivo bilionário, que já está na lista dos mais ricos do mundo, precisava de um lugar para guardar sua coleção pessoal de aviões, que crescia rapidamente. Montou o Hangar 7, no aeroporto de Salzburgo, e criou mais uma plataforma de venda da marca de energéticos.
Tudo é feito para multiplicar a venda de latinhas azuis, que este ano vai alcançar a marca de 3 bilhões de unidades, mas o negócio é muito maior do que isso. Além do Hangar, Mastechitz é dono de duas equipes de Fórmula 1, a Red Bull Race (RBR), por onde corre o inglês David Coulthard, e a Scuderia Toro Rosso (STR). Tem também dois times de futebol, um na Áustria e outro nos Estados Unidos, além de um estádio, também em Salzburgo, que já sendo ampliado.
A idéia foi criar uma marca de personalidade, irônica até, mas sobretudo fora dos padrões. O marketing inclui desde uma corrida de motos dentro de uma arena de touros, na Espanha, até o no único campeonato de aviões do mundo, onde os pilotos fazem acrobacias a 400 quilômetros por hora, rasgando os céus de grandes cidades, como Abu Dhabi, Budapeste e Roterdã.
A propaganda é globalizada. O slogan "Te dá asas", a entonação dada à frase, e a caricatura esquálida que sai voando depois de tomar um Red Bull são os mesmos no mundo inteiro.
Tudo gira em torno do marketing, que consome mais de 30% do faturamento ou algo como 600 milhões de euros. A produção é terceirizada e concentrada em uma única fábrica na Áustria. A responsabilidade está nas mãos da empresa austríaca Rauch, que também fabrica sucos de frutas e é bastante conhecida no mercado local.
Uma única fábrica, localizada em um país sem saída para o mar. Dividir a produção com outros países não seria uma logística mais barata e menos complicada? "Não se mexe em time que está ganhando", sentencia Volker Viechtbauer, diretor de recursos humanos e assuntos regulatórios. "A água dos Alpes faz toda a diferença na composição do produto e incentivamos a indústria local", afirma.
Mr. Mateschitz inaugurou a categoria de energéticos e conseguiu a proeza de construir uma marca que segue na liderança sem ser ameaçada por grandes nomes que passaram a disputar o segmento, como Coca-Cola e Pepsi. Também criou um modelo de negócios único: uma só fábrica e um só produto - as experiências com novas marcas ainda engatinham. A estratégia de foco em marketing e produção terceirizada também é adotada por outras grandes de bebidas, como a inglesa Diageo.
A empresa austríaca cresce a um ritmo de dois dígitos ao ano desde que foi fundada, em 1987. Para este ano, segundo Volker Viechtbauer, a previsão é alcançar um aumento de 28%, com um faturamento pouco acima de 2 bilhões de euros. O número de latas vendidas neste ano deve chegar a 3 bilhões. Foram 2,48 bilhões no ano passado. O negócio cresceu muito rápido nos últimos 10 anos. Em 1996, a Red Bull havia vendido 141 milhões de latas e quatro anos depois, alcançou a marca de 1 bilhão de latas.
Econômica quando se fala em números, a empresa diz apenas que a América Latina é a terceira região com maior volume de vendas, atrás da Europa e América do Norte.
O touro vermelho chegou ao Brasil em 1999 e, por aqui, também inaugurou a categoria de energéticos. Segundo dados da AC Nielsen de agosto, a Red Bull detém 64% de participação de mercado em valor e é líder em todas as regiões do país. Entre os concorrentes estão Flash Power, Flying Horse e a marca Burn, da Coca-Cola. O mercado brasileiro consome aproximadamente 74,3 milhões de latas de energéticos por ano e movimenta cerca de R$ 500 milhões. Mundialmente, essa cifra alcança US$ 1,7 bilhão.
No Brasil, a venda gira em torno de 45 milhões de latas ao ano. A empresa não abre o faturamento no país, mas a operação brasileira é a décima segunda entre os mais de 130 países onde atua. Segundo o presidente da companhia no Brasil, Stefan Kozak, no ano passado, subsidiária cresceu 16% no mercado brasileiro. Para 2006, a previsão é alcançar uma expansão de 20%.
A categoria cresce muito rapidamente na Europa. Na Áustria e países vizinhos, como Hungria, as geladeiras de Red Bull são mais numerosas e visíveis que as de refrigerantes. É comum ver os austríacos bebendo Red Bull durante o dia para matar a sede e ganhar energia. Nos postos de gasolina da Áustria a bebida é mais vendida do que Coca-Cola.
Já o brasileiro, e a maioria dos latinos, prefere tomar o energético misturado a bebidas alcoólicas, como uísque e vodca. Essa mistura garante a potencialização do efeito.
A empresa, porém, procura, ao máximo, fugir dessa associação, muito embora sirva vários drinques em seu bar no Hangar 7, em Salzburgo. "Este nunca foi o nosso foco de comunicação", diz o presidente da empresa no Brasil. "Fazemos um trabalho com personal trainners, clubes esportivos e atletas para disseminar outras ocasiões de consumo."
Embora esteja à venda também em supermercados, as lojas de conveniência casas noturas e bares são os lugares onde a venda é mais significativa. O preço médio no varejo é de R$ 6,00 - e se mantém na faixa de 2 euros no resto do mundo - mas pode chegar a R$ 15 em casas noturnas.
De forma discreta, sem o mesmo alarde e qualquer estratégia de marketing - parece até outra empresa - a Red Bull testa uma outra marca. Carpe Diem, o nome do restaurante que Mateschitz abriu no burburinho de Salzburgo, aos poucos também ganha as prateleiras. Trata-se de uma linha de bebidas funcionais, fora dos padrões, pelo menos latino americanos. Há desde água botânica, com pera, limão e acerola até uma linha de bebidas mais exótica, como a Kombucha, bebida gaseificada de gosto estranho que mistura chá de ervas e lactobacilos.
Com seis anos de vida, nem de longe a marca repete o sucesso das latinhas de energético. Representa menos de 2% do negócio. Engarrafadas em vidro, estão em 16 países, como a própria Áustria, África do Sul, Holanda e Inglaterra.
A repórter viajou a convite do governo da Áustria