Título: Marfrig negocia frigorífico no Uruguai
Autor: Rocha, Alda do Amaral
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2006, Agronegócios, p. B12

Numa estratégia agressiva de expansão, o Marfrig, terceiro maior exportador brasileiro de carne bovina e faturamento de R$ 2 bilhões este ano, negocia a aquisição do frigorífico uruguaio Tacuarembó, e também avalia a compra das plantas do Frigoclass, em Promissão (SP), e da Argentine Breeders & Packers - ABP - , na Argentina, ambas empresas do britânico Terry Johnson.

O presidente do Marfrig, Marcos Molina, afirmou que foi assinado um memorando de entendimentos com o Tacuarembó, mas a operação ainda não foi finalizada. No momento, o frigorífico uruguaio, que fica na cidade do mesmo nome, está sob "due diligence". Quanto à indústria do Frigoclass em Promissão, Molina admitiu que "chegou a conversar", mas disse que "não há nada definido". Sobre a Argentina, afirmou que ainda não considerou a possibilidade de compra. Procurado, o diretor jurídico do Frigoclass, Rodrigo Alberto Correia da Silva, disse que não há informações na empresa sobre a negociação.

A operação envolvendo o Tacuarembó, terceiro maior exportador de carne bovina do Uruguai, é estimada em US$ 35 milhões no mercado. Molina não confirma o valor. Já a planta do Frigoclass, em Promissão, estaria sendo negociada por US$ 23 milhões e a da Argentina, por US$ 20 milhões. O presidente do Marfrig também não comenta.

Com o investimento no Uruguai, o Marfrig deseja garantir acesso ao mercado americano de carne bovina in natura, assim como o fez o Bertin em julho deste ano, com a aquisição do também uruguaio Canelones. O Uruguai tem autorização para exportar carne in natura aos Estados Unidos Canadá, México e Caribe, mercados aos quais o Brasil ainda não tem acesso por conta de restrições sanitárias. "O Uruguai está em 11 mercados onde o Brasil não está", resumiu Molina.

O Tacuarembó, que abate 1.000 animais por dia, exportou US$ 77,4 milhões em carne bovina em 2005 e, neste ano, até agosto, já ocupa o terceiro lugar no ranking dos exportadores uruguaios, com vendas externas de US$ 64,450 milhões, de acordo com o Instituto Nacional de Carnes. O Marfrig deve fechar 2006 com exportações de US$ 500 milhões, segundo Molina.

No esforço de crescimento do Marfrig chama a atenção o interesse pelo Frigoclass, de Promissão, cuja planta está com operações suspensas por causa do embargo europeu à carne bovina de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná, após o ressurgimento da febre aftosa nesses dois últimos Estados há quase um ano.

Fontes do mercado afirmam que o Marfrig - que também tem unidade em Promissão - teria interesse na planta do Frigoclass porque ao adquiri-la evitaria que algum de seus concorrentes grandes o fizesse. Molina desconversa sobre tal intenção. Já a unidade da ABP, na Argentina, seria estratégica para o Marfrig que atualmente importa picanha daquele país para vender no Brasil. O empresário também não comenta.

Além da aquisição em curso no Uruguai, o Marfrig fez, em agosto passado, uma joint venture com a trading Quinto Cuarto, uma das maiores do Chile. Com o negócio, o Marfrig quer aumentar sua participação no mercado chileno, que é um dos maiores clientes do Brasil, mas que atualmente está fechado para a carne brasileira. A Quinto Cuarto faturou US$ 70 milhões em 2005.

Se concretizadas todas as operações - envolvendo Tacuarembó, Frigoclass e ABP - a capacidade de abate do Marfrig, que hoje é de 7 mil animais por dia em sete unidades, alcançará 10 mil animais, já que as unidades em negociação têm cada uma capacidade de 1 mil animais. Assim, só no Brasil, a capacidade de abate do Marfrig seria de 8 mil animais ultrapassando o Bertin, que tem 7 mil.

A investida do Marfrig no exterior é mais um capítulo do processo de internacionalização do setor de carne bovina brasileiro, iniciado em agosto de 2005, com a aquisição do Swift Armour na Argentina pelo Friboi. Depois foi a vez do Bertin, que comprou o Canelones no Uruguai em julho deste ano.

O movimento é visto como natural por especialistas, como José Vicente Ferraz, do Instituto FNP, já que decorre do crescimento recente do setor no mercado externo. Mas o movimento também contrasta com a recente tentativa estrangeira de entrar no segmento no país que, até agora, se mostrou frustrada. O Frigoclass, comprado em janeiro de 2005 pelo empresário Terry Johnson, suspendeu as operações após apenas quatro meses de funcionamento depois que a União Européia suspendeu parcialmente as compras de carne bovina brasileira.

Com operação totalmente voltada à exportação, o frigorífico ficou sem alternativa após as restrições européias. Para José Vicente Ferraz, a operação poderia ter sido melhor sucedida se o britânico tivesse buscado parcerias para atuar no Brasil, com pessoas que conhecem o setor no país.

O próprio advogado do Frigoclass, Rodrigo Alberto Correia da Silva, admite como correta a avaliação. Segundo ele, o trabalho, no momento, "é liquidar todas as pendências" decorrentes da operação do Frigoclass. Enquanto isso, diz, a operação é "reavaliada".