Título: Regiões oposicionistas na Bolívia ameaçam declarar autonomia
Autor: Uchoa, Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 04/10/2006, Internacional, p. A11

Governadores e comitês cívicos dos quatro Departamentos (Estados) bolivianos controlados pela oposição, Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando, resolveram não acatar a reforma constitucional em debate e ameaçam declarar autonomia se o governo do presidente Evo Morales insistir em seu objetivo de "refundar" o país. Eles alegam que o processo constituinte que o governo tenta aprovar dará poderes excepcionais à Assembléia, que poderia, em última instância, conceder poderes ditatoriais a Morales.

Jornais locais disseram que a decisão de desacato, complementada pela ameaça de uma declaração de autonomia regional, foi tomada na noite da segunda pelos representantes dos quatro Departamentos, conhecidos como "meia lua" por causa de sua disposição geográfica. Santa Cruz e Tarija são os maiores produtores de gás e petróleo do país, enquanto Beni e Pando, na região amazônica, têm na pecuária e na extração vegetal suas principais atividades.

Não houve declarações dos outros cinco departamentos da Bolívia, cujos governadores e comitês cívicos são favoráveis ao governo e que não apoiaram as mobilizações iniciadas há quase dois meses pela "meia lua" em repúdio às transformações políticas impulsionadas pelo esquerdista Morales.

O presidente disse que o país não se dividirá, apesar das declarações de "algumas famílias que antes viviam do Estado e agora tentam confundir a população". Ele afirmou que a Assembléia Constituinte tem como objetivo apenas "integrar melhor os bolivianos".

"As ameaças da chamada 'meia lua', que está cada vez mais se tornando quarto-minguante, respondem apenas à estratégia [da aliança de oposição direitista] de fazer a Constituinte fracassar", disse Alex Contreras, porta-voz do governo.

A nova crise eclodiu quando a Constituinte, em polêmica votação, decidiu na semana passada declarar-se "plenipotenciária", embora sem ignorar os Poderes hoje estabelecidos. A "meia lua" rejeita uma assembléia de natureza constituinte originária, que poderia mudar toda a estrutura do Estado, inclusive sobrepondo-se aos três Poderes. Exige que tenha atribuições de reforma parcial.

"Em caso de ser aprovada uma reforma constitucional à margem da lei convocatória, expressamos nossa decisão de não acatar o texto da nova Constituição", disse resolução dos representantes dos quatro Estados, lida pelo governador de Santa Cruz, Rubén Costas.

A lei convocatória da Constituinte diz que o "novo testo constitucional" deve ser aprovado por dois terços dos votos, o que obriga o governo, que tem 137 dos 255 constituintes, a negociar com a oposição. Mas o governo quer que as mudanças sejam aprovadas por maioria simples, e a maioria absoluta aprovaria apenas o texto final.