Título: Custos de extração explodem no mundo
Autor: Capela, Maurício
Fonte: Valor Econômico, 26/02/2007, Empresas, p. B6

É possível contar nos dedos de uma mão as vezes que a indústria do petróleo conviveu com tantos indicadores em alta. De meia década para cá, não foi apenas o preço do barril de petróleo que disparou nas bolsas internacionais, viabilizando até a entrada em operação de campos de petróleo que sequer eram cogitados pelas gigantes do setor. Os custos de extração também assumiram um viés significativo de alta.

A explosão de custos é tão forte que a maior parte dos analistas ouvidos pelo Valor descartam qualquer redução no curto prazo, mesmo que o preço do petróleo ceda nas bolsas de valores de Nova York e de Londres. "Isso significa que para uma empresa de petróleo ter hoje o mesmo lucro de quando a commodity era negociada a US$ 22, é preciso que a cotação do barril fique acima de US$ 40", afirma Alexandre Oliveira, sócio-diretor da Accenture para área de recursos naturais.

Um exemplo do boom de custos está nos aluguéis das sondas usadas na prospecção da commodity. Independentemente da natureza do petróleo, ou seja, se é leve ou pesado, o aluguel diário de uma sonda para extração em locais profundos, como a realizada pela Petrobras nos oceanos, passou de US$ 150 mil no início dos anos 2000 para US$ 450 mil, hoje. O equipamento utilizado em superfícies de menor profundidade passou de US$ 20 mil para US$ 70 mil por dia no mesmo período.

"É muito provável que os custos de produção mantenham o ritmo de alta e até dobrem nos próximos cinco anos, porque há falta de equipamento disponível, de pessoal qualificado e de capacidade nas plataformas de extração", complementa o executivo da Accenture.

Caso as previsões de Oliveira se concretizarem, ficará evidente que o petróleo assumiu um novo patamar de referência e que isso viabilizará de uma vez áreas antes consideradas não-rentáveis ou pouco lucrativas. "Hoje, com a disparada do preço no mundo, o valor de referência para que se coloque um campo de petróleo em águas profundas em funcionamento é ao redor de US$ 35 por barril extraído, contra US$ 11 no início da década", afirma Saul Suslick, diretor do Centro de Estudos de Petróleo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O cálculo de Suslick é feito a partir de uma média de números de países como México, Noruega, Brasil, Estados Unidos, Rússia, Angola e outros.

Mesmo que o petróleo em questão seja o extraído de águas profundas de países como Rússia, Noruega ou México e não das nações que formam a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) - o cartel não fornece dados -, o fato é que, com a disparada da commodity nos mercados internacionais, as multinacionais do petróleo mexeram no seu portfólio de reservas. Mesmo porque o preço realmente disparou no mundo. No último dia de negócios de dezembro de 2000, o barril do tipo WTI negociado na Bolsa Mercantil de Nova York era de US$ 25,98, enquanto que no último dia de negócio de julho de 2006 era de US$ 75,68.

Um dos resultados práticos dessa explosão de preços, que contaminou os valores de referência, é a viabilização de extração nas tundras situadas no Canadá. Considerados de difícil manejo, esses campos, além de serem congelados, só fornecem a commodity após um processo de separação na areia betuminosa.

Extrair petróleo no Canadá é bem diferente - mas trabalhoso e custoso - do que nos campos da Arábia Saudita e do Kuwait, reconhecidamente os detentores do menor custo no mundo e de grande produtividade. "Há o fator Canadá à mesa. Mas o detalhe é que seu petróleo somente é lucrativo se o preço estiver acima dos US$ 40", afirma o executivo da Accenture.

Tanto é assim que o diretor do centro da Unicamp explica que atualmente o governo do Canadá estuda aliviar algumas taxas que recaem sobre o setor a fim de que exista um cenário favorável à inovação tecnológica. O objetivo é obter um forte desenvolvimento de equipamentos para que se barateie a extração nas tundras do país.

A Petrobras, por exemplo, conhece cada detalhe das dificuldades em se extrair petróleo em lugares de difícil acesso. Basta passar os olhos nos seus demonstrativos financeiros para se ter alguma idéia de como a companhia precisa suar a camisa para tirar das águas profundas cada barril do insumo, notadamente de origem pesada e que em outras palavras significa menos gasolina e óleo diesel, por exemplo, e mais produtos como piche.

No ano passado, a estatal viu seu custo médio de extração subir 15% e alcançar US$ 6,59 por barril de óleo equivalente. E esse aumento se deveu à valorização do real frente ao dólar em 11%, aos reajustes nos contratos (principalmente os de sondas) e à entrada em operação de algumas plataformas, como a P-50 e a P-34. A meta da companhia, contudo, é que seu custo unitário de extração alcance US$ 5,60 por barril em 2011.

No entanto, essa conta e mesmo a previsão da estatal ainda não embutem as participações governamentais. Se colocadas na contabilidade, o custo de extração da companhia dá um salto significativo. No quarto trimestre de 2006, por exemplo, com a parcela do governo federal, o custo de extração alcança US$ 17,59 por barril, ao passo que sem essa fatia, o custo desaba para US$ 7,24.

"É o pedaço do governo no barril na forma de royalties, por exemplo, e de outros impostos", afirma Lucas Brendler, analista de Investimentos da Geração Futura Corretora. A Petrobras, procurada, preferiu não se manifestar sobre o assunto.

O sócio-diretor da Accenture lembra que não é só no Brasil que o setor padece dessa relação entre custo de extração do barril de petróleo e royalties. E diz que essa taxa costuma atingir entre 15% e 70% dos custos da extração, dependendo do país. Nas nações da África, por exemplo, o consultor diz que os royalties têm uma fatia de 70%, enquanto que nos países do Mar do Norte não ultrapassa os 15%. O Brasil, afirma o executivo, está mais para os africanos.

A ascensão dos custos globais na extração do petróleo também foi impulsionada pela subida dos valores de outras matérias-primas, como o aço, impactado pela forte demanda asiática dos últimos anos. Como aço é usado na confecção das plataformas de extração, sua alta contribuiu muito para o novo patamar de custos.