Título: Desafio de Nogueira Batista em Washington é ser ouvido
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 26/02/2007, Finanças, p. C10

O economista Paulo Nogueira Batista Junior promete fazer barulho nos próximos meses, enquanto se prepara para assumir a vaga de representante do Brasil no Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas a capacidade do governo brasileiro de influenciar os rumos da instituição é bastante limitada e isso não mudará com sua chegada.

A indicação de Nogueira Batista, um professor da Fundação Getúlio Vargas que é amigo do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e tem sido um crítico persistente da atuação do Banco Central, causou espanto e apreensão ao ser anunciada na última sexta-feira. Muitos viram na escolha mais uma exibição de força do grupo que tem pressionado por mudanças no BC e na política econômica do governo.

Nogueira Batista substituirá Eduardo Loyo, um discreto professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio que foi diretor de estudos especiais do BC no início do governo Luiz Inácio Lula da Silva e representou o país no Fundo por dois anos. Loyo deve permanecer no posto até a reunião que a instituição faz todos os anos na primavera do Hemisfério Norte, em abril.

Num artigo publicado pelo jornal "O Globo", no sábado, Nogueira Batista disse que seu papel na diretoria do FMI não será "se sentir em casa, ou incorporar-se a uma rede tecnocrática internacional", e que suas opiniões críticas serão úteis para a organização. "Não é necessário, nem recomendável, que [o diretor] seja um admirador incondicional do Fundo e das suas políticas", escreveu o economista.

A parte difícil será se fazer escutar. Países como os Estados Unidos, o Japão e a Alemanha, controlam votos suficientes para fazer seus pontos de vista prevalecer nas discussões do FMI. Juntos, o Brasil e os outros oito países latino-americanos que Nogueira Batista representará (Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago) têm somente 2,43% dos votos.

Ele chegará ao Fundo num momento especial, em que a instituição vive uma profunda crise de identidade e encontra dificuldades para levar adiante um ambicioso programa de reformas proposto pelo seu diretor-gerente, Rodrigo de Rato. O governo brasileiro está insatisfeito com o andamento do processo, mas suas queixas até agora não tiveram conseqüências visíveis.

A principal reforma em discussão no Fundo é a mudança do sistema de divisão do poder na instituição, com a criação de uma nova fórmula para calcular as cotas que definem o número de votos que cada um dos 185 países-membros do FMI tem. O modelo atual privilegia os países ricos e o objetivo da reforma é ampliar a influência dos países em desenvolvimento no Fundo.

A primeira etapa da reforma foi aprovada no ano passado, com aumentos nas cotas de quatro países (China, Coréia do Sul, México e Turquia) e a definição de critérios para a nova fórmula. O Brasil votou contra, por discordar desses critérios. A discussão sobre a nova fórmula ainda está numa fase muito preliminar e ninguém deve esperar uma solução antes da reunião de abril.

O debate divide os países em desenvolvimento. Apenas 22 acompanharam o Brasil no voto contra a resolução do ano passado, incluindo Índia, Argentina e Egito. Os países africanos, que receberam alguns benefícios com a resolução, votaram a favor. Várias nações asiáticas também, por causa da proximidade com os países que conquistaram cotas maiores com a resolução.

Outra prioridade da agenda de reformas que Nogueira Batista encontrará em discussão em Washington é a criação de uma linha especial de crédito para socorrer países emergentes. A idéia, que tem no Brasil um de seus principais defensores, é oferecer uma espécie de seguro a países com políticas econômicas prudentes. Em situações especiais, o dinheiro poderia ser sacado quase automaticamente.

O debate sobre o tema empacou por dois motivos. Países com interesse no mecanismo, como o Brasil, acumularam um volume tão confortável de reservas nos últimos anos que pagaram tudo que deviam e não precisam mais de dinheiro do FMI agora. E os países ricos, que têm várias dúvidas sobre a conveniência de criar o instrumento, não conseguiram chegar a um acordo sobre o desenho mais adequado para a nova linha.