Título: Para defesa, Duda Mendonça é gênio criativo
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 16/08/2012, Política, p. A6

O publicitário Duda Mendonça é um "gênio criativo" e virou réu do mensalão por causa de um "delírio mental" do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Essa tese foi defendida, ontem, perante os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) numa estratégia elaborada por dois especialistas em assuntos diversos da advocacia para, de início, desconsiderar a parte técnica da acusação e, num segundo momento, criticar a conduta do Ministério Público.

Primeiro, Luciano Feldens, um dos mais renomados advogados em lavagem de dinheiro, procurou afastar a alegação de que Duda ocultou valores recebidos pela campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, e de que fez remessas ilegais para o exterior. "Falta o elemento essencial da lavagem de dinheiro que é a conversão de negócios ilícitos em lícitos", disse Feldens, utilizando termos técnicos de direito.

Em seguida, Antonio Carlos de Almeida Castro, um estrategista da advocacia criminal que atua para vários políticos em Brasília, fez duros ataques a Gurgel, chamando a denúncia de "aberração". "O Ministério Público tem o dever de acusar de forma precisa, de forma concisa e sem adjetivos", disse o advogado, conhecido como Kakay. "Mas vossa excelência [Gurgel] afirmou que jamais enfrentou uma onda de ataques tão grandes. Foi algum advogado que intimidou vossa excelência?", perguntou.

Em quase 36 horas, dividas em oito dias de sessões, advogados de defesa dos réus do mensalão se revezaram para criticar Gurgel, qualificando a denúncia como "criação mental", "ilusionismo jurídico" ou "marca de fantasia".

Ontem, Feldens e Kakay tiveram as duas horas finais da defesa, já que, além de Duda, atuaram para Zilmar Fernandes, sócia do publicitário. Duda foi denunciado no mensalão por receber R$ 11 milhões de empresas de Marcos Valério, não declarar o valor ao Fisco e remeter o dinheiro ilegalmente ao exterior. Zilmar foi acusada de sacar R$ 1,4 milhão no Banco Rural para entregar o valor a Duda e remetê-lo para fora do país. Ambos foram denunciados por lavagem de dinheiro praticada 53 vezes e evasão de divisas.

"A acusação tratou os dois (Duda e Zilmar) como se fossem um só. Eu até brinquei com o ministro Luiz Fux dizendo que seriam como Leandro e Leonardo", disse Kakay. "Chamá-la [Zilmar] de braço financeiro é um delírio mental", continuou. Já Duda é, segundo ele, "um gênio criativo, ganhador de seis leões de ouro em Cannes".

Feldens reconheceu que Duda errou ao não pagar tributos, mas ressaltou que ele o fez posteriormente. "Duda errou, sim, e pagou. O Banco Central não o dispensava de declarar os valores que recebeu." Segundo o advogado, o publicitário fez um acordo com a Receita e quitou R$ 4,3 milhões em tributos.

Adotando um tom mais político, Kakay negou a existência do mensalão. Ele procurou desqualificar o denunciante, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), dizendo que, após seu grupo político ter sido flagrado cometendo irregularidades, "partiu para o ataque, pois sabia que o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu seria implacável" no episódio de pagamentos de propina nos Correios, estatal que teve uma diretoria entregue ao PTB. Dirceu é o réu número um do mensalão.

O advogado também criticou as CPIs, que "quebram sigilos a granel". "Vossas excelências vão decidir aqui se vale ou não a prova produzida em CPI. Aquilo é um palco. Mas esse processo serve para definir uma série de parâmetros."

Kakay questionou até o fato de Gurgel sentar-se ao lado dos ministros. "Vossa excelência senta-se à direita do presidente, pode lanchar ao lado dos ministros e eu não posso nem abrir uma barra de cereal."

Antes da defesa de Duda, Roberto Pagliuso, advogado de José Luiz Alves, chefe de gabinete do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto, disse que seu cliente não tinha como saber que a origem dos recursos do suposto esquema do mensalão era ilícita, pois achava que a fonte das verbas sacadas para pagar dívidas de campanha era o PT. "Ele não tinha percepção de absolutamente nada que pudesse induzir à prática de crimes", disse Pagliuso.