Título: CPMF faz juros subirem
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Fonte: Correio Braziliense, 06/11/2010, Economia, p. 20

Investidores elevam taxas dos contratos negociados no mercado futuro, embutindo o custo da recriação do tributo

Apesar de as discussões sobre a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) ainda estarem no terreno político, o mercado financeiro já passou a precificar a volta do tributo extinto há dois anos. Tanto que as taxas de juros dispararam ontem na Bolsa de Mercadorias e de Futuros (BM&FBovespa). Nos contratos com vencimento em janeiro de 2012, que aparecem entre os mais negociados, as projeções para os juros saltaram de 11,40% para 11,47% ao ano. Nos contratos com resgate previsto para 2013, a alta foi de 11,73% para 11,88%.

¿Pode parecer precipitado, mas os investidores não querem perder dinheiro. Têm que se precaver¿, ressaltou um operador de um grande banco estrangeiro. O ideal, segundo ele, seria que o governo enterrasse esse assunto, pois o país não suporta mais impostos. ¿Mas não há como descuidar. Como precisa de recursos para fechar as contas a partir de 2011, o governo dará todo o incentivo ao Congresso e aos governadores para levar o assunto adiante¿, assinalou.

Mesmo com todas as dúvidas sobre a CPMF, os consumidores podem se preparar. Além da possibilidade de terem de arcar com o novo tributo, poderão pagar mais caro nos crediários. A explicação é simples: bancos e financeiras usam o mercado futuro como parâmetro para formar as taxas cobradas nos empréstimos e financiamentos às empresas e às pessoas físicas. ¿Será um baque¿, ressaltou um técnico do Ministério da Fazenda. ¿Veremos uma inversão da curva, pois os juros ao setor produtivo e aos consumidores vinham caindo consideravelmente, a ponto de fecharem setembro nos menores níveis desde 1994¿, acrescentou.

A recriação da CPMF tem o apoio da presidente eleita Dilma Rousseff. Mesmo empurrando a discussão sobre o assunto para os governadores, que estariam necessitando de mais dinheiro para investir na saúde, é sabido que a futura administração terá muitos problemas para fechar o caixa, devido ao excesso de gastos nos últimos dois anos com o intuito de inflar a candidatura da petista ao Palácio do Planalto.

¿Como precisa dar um choque de credibilidade junto ao mercado, Dilma assumirá o compromisso de fazer o superavit primário (economia para o pagamento de juros) de 3,3% do Produto Interno Bruto no seu primeiro ano de governo¿, ressaltou o técnico da Fazenda. ¿Ou seja, em vez de fazer um ajuste fiscal de verdade, a presidente eleita apoiará a recriação da CPMF contando com uma parte das receitas para manter o equilíbrio fiscal¿, emendou.

Segundo Flávio Serrano, economista sênior do Espírito Santo Investment Bank, no início da semana, depois de decidido o resultado das eleições presidenciais, o mercado passou a reduzir as projeções de juros. Mas bastou Dilma aventar a possibilidade de volta da CPMF para que os investidores passassem a embutir ¿um prêmio¿ nas taxas negociadas no mercado futuro. Esse ¿prêmio¿, por sinal, também será exigido pelo mercado na compra de títulos públicos ofertados semanalmente pelo Tesouro Nacional. Será o preço da indefinição.

Diante da alta dos juros, o setor produtivo deu início a um movimento anti-CPMF. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, disse que a entidade é ¿totalmente contrária¿ à proposta. ¿Isso não resolve o problema da saúde. Acho que antes de pensar em novas receitas, temos de pensar em melhoria da gestão¿, frisou.

Valorização inédita As cotações do ouro atingiram um valor recorde ontem, ainda refletindo as medidas anunciadas pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos Estados Unidos) para estímulo da economia. A injeção de US$ 600 bilhões no mercado norte-americano, num ritmo de US$ 75 bilhões por mês, vai elevar as projeções de inflação e enfraquecer ainda mais o dólar. Nesse ambiente de crise, investimentos concretos, como o ouro e imóveis, tendem a ser valorizados. O preço do ouro à vista chegou ao nível inédito de US$ 1.397,25 a onça.

Expansão de 5,2% em 2008 » O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revisou ontem o crescimento econômico brasileiro de 2008 ligeiramente para cima. A expansão passou de 5,1% para 5,2%. A mudança já era programada, pois o desempenho final do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas geradas pelo país em um ano) é divulgado até dois anos após o fechamento do ano calendário. Em valores correntes, o resultado alcançado foi de R$ 3,032 trilhões. O destaque foram os investimentos, que aumentaram 13,6%, e o consumo das famílias (5,7%). O PIB per capita chegou a R$ 15.989,75, num incremento de 4,1% em relação a 2007. A massa salarial real subiu 7,9%.

Inflação dos alimentos Os alimentos não deram trégua para a inflação em outubro. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do mês, a ser divulgado na terça-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), deve trazer uma alta em torno de 0,70% ¿ ante 0,45% de setembro . O número reflete a mediana de 19 previsões de analistas de mercado ouvidos pela agência Reuters. A faixa de prognósticos variou de 0,61 a 0,71 por cento. ¿Em alimentos, temos uma sazonalidade forte, como a do feijão, que vai continuar sendo o grande vilão, e também as carnes e o leite¿, afirmou Newton Rosa, economista-chefe do SulAmerica Investimento.

A seu ver, além da pressão dos alimentos, a inflação sofrerá também a influência dos preços dos transportes, atingidos pelo aumento do álcool combustível. No caso dos itens alimentícios, a alta é vista com naturalidade nesta época do ano em razão de problemas climáticos no Brasil e no exterior. O impacto deve persistir no curto prazo, seja por questões sazonais e pelo fim de ano, quando alimentos relacionados às festas do período sobem, assim como os gastos com viagens. Assim, até dezembro, a inflação não deve desacelerar muito em relação ao patamar de outubro, segundo os especialistas.

Meta Para os economistas Elias Cavalcante e Tatiana Pinheiro, do Banco Santander, a alta dos alimentos será destaque também nos preços do atacado ¿ Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) ¿, que possivelmente registrará a deflação do minério de ferro. ¿Contudo, o que realmente deveria ser objeto de atenção são as medidas de núcleos do IPCA e a evolução da inflação dos preços dos bens intermediários nos IGPs (Índices Gerais de Preços), que mesmo descontando as pressões sazonais do período, seguem sinalizando inflação acima da meta e pressão de custos¿, alertaram.

Na avaliação do Santander, a entressafra da cana-de-açúcar explicará a elevação do preço do etanol e, consequentemente, da gasolina ¿ que recebe uma parcela do produto em sua composição. ¿Essas pressões devem permanecer ao longo de novembro¿, adiantaram Cavalcante e Tatiana.