Título: Céu de brigadeiro para a meteorologia
Autor: Saraiva, Jacílio
Fonte: Valor Econômico, 27/02/2007, Especial, p. F3

O céu está sem nuvens para os negócios das pequenas empresas de previsão do tempo. Nunca, e principalmente agora, diante das ameaças do aquecimento global, as condições climáticas ocuparam um lugar tão importante para setores da economia, como agricultura, aviação e companhias alimentícias. Aproveitando esse boom, as companhias da área de meteorologia incrementam seu parque de máquinas, desenvolvem softwares específicos para a área e se aliam à internet para divulgar serviços.

Os meteorologistas querem gerar previsões climáticas mais certeiras, com maior antecedência, e se preocupam em fornecer informações que possam ajudar, principalmente, o setor agrícola a driblar as armadilhas do tempo e a ter safras mais produtivas. Hoje, segundo especialistas, as previsões geradas com 24 horas de antecedência têm 97% de índice de acerto e as análises feitas há cinco dias garantem até 75% de exatidão.

As empresas da área de meteorologia são geralmente formadas por ex-funcionários de órgãos governamentais do setor, como o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

É o caso da Somar, de São Paulo, criada há 12 anos por três ex-funcionários do Inpe - uma das primeiras empresas privadas de meteorologia do país. Hoje, tem 12 estações meteorológicas na capital paulista e planeja estender suas previsões de seis para dez meses.

Além das estações próprias, usa análises de centros do Brasil e do exterior, como o Cptec e o Noaa (National Oceanic & Atmospheric Administration), nos Estados Unidos. A empresa também criou um site, o Tempo Agora, de acesso gratuito.

"Investimos de 20% a 30 % do faturamento em atualização tecnológica", diz Marcos Massari, diretor da Somar, que atende o Governo do Estado de São Paulo, Varig e Coca-Cola.

Além de fornecer boletins do tempo para produtores rurais, empresas de comunicação e agências de turismo, a companhia também se especializou no desenvolvimento de softwares para o setor de meteorologia. No ano passado, lançou o Lin TV, que exibe as previsões em canais de televisão.

O programa, baseado em imagens de satélite e mapas, roda em computadores com o sistema operacional gratuito Linux e aterrissou em emissoras como a Bandeirantes, SBT e Record.

Já o Vismet é um sistema de visualização e armazenagem de informações meteorológicas. A idéia é facilitar a rotina operacional das equipes técnicas dos aeroportos. Foi adquirido pela Infraero e é usado no Galeão, no Rio de Janeiro, e no aeroporto internacional de São Paulo, em Guarulhos.

Também em São Paulo, o site Climatempo, que trabalha com imagens de satélite, deve investir este ano 30% a mais do que em 2006, em valores não revelados, para driblar a concorrência. Os clientes do setor de agronegócio estão entre as prioridades da empresa.

"Em janeiro, contratamos quatro meteorologistas e compramos seis servidores que rodam os cálculos de previsão", diz a meteorologista e diretora executiva do Climatempo, Gilca Palma.

O site, criado em 2001, recebe mais de 100 mil visitas por dia. Em 2007, espera dobrar a capacidade do parque de máquinas para permitir um acesso mais veloz ao conteúdo on-line. Vai também estimular a participação dos usuários que, além de receberem a previsão por e-mail, poderão enviar informações e fotos dos aspectos climáticos das suas cidades.

Até março, o portal abriga ainda um novo site dirigido ao agronegócio. "A intenção é ajudar o agricultor e os investidores com dados sobre o futuro das colheitas, de acordo com as nuances do tempo", diz o meteorologista Marcelo Garcia. Os registros disponíveis no site passarão de quatro para 15 dias de previsão, com as tendências climáticas para os próximos três meses.

Mas são as ações das agências do governo, como Cptec, Inpe e Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) que inspiram as empresas que querem ganhar dinheiro com a previsão do tempo. O Inmet, por exemplo, passa por uma repaginação na sua rede de observação e deve fechar o ano com 500 estações meteorológicas, em todo o território nacional.

Os novos equipamentos vão aumentar em oito vezes a freqüência das medições climáticas, que incluem mapas meteorológicos a cada seis horas, com validade de até 72 horas.

Em 2006, foram investidos R$ 6,5 milhões para a aquisição de 250 estações adicionais, importadas da Finlândia, que serão implantadas em 2007. "Algumas das unidades ficarão no norte da Argentina, no Uruguai e no Paraguai, para monitorar eventos que nascem no sul e causam transtornos no Brasil", revela o diretor da entidade, Antônio Moura.

Um desses casos foi o Catarina, considerado o primeiro furacão registrado no Atlântico Sul que, em março de 2004, atingiu o Estado de Santa Catarina com ventos de 120 km/h.

Em Cachoeira Paulista (SP), os estudos do Cpetec, ligado ao Inpe, de São José dos Campos, avançam para identificar os processos que levam à formação de chuvas e às variações de temperatura, com a inclusão de dados em softwares de previsão numérica.

"A tecnologia permite previsões cada vez mais detalhadas, com uma maior antecedência dos eventos", explica Maria Assunção Dias, coordenadora geral do Cptec/Inpe. "Hoje, as previsões geradas com 24 horas de antecedência obtêm 97% de acertos e as análises realizadas com cinco dias de antecedência chegam a 75% de sucesso".

No ano passado, o Cptec recebeu um investimento de R$ 6 milhões, repassado para a sua infra-estrutura de informática, com a expansão do sistema de armazenamento de dados e a modernização dos servidores que processam as previsões. A verba veio de um PPI (Plano Piloto de Investimentos) do governo federal, através do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Em 2007, a continuação do PPI prevê uma verba de R$ 4,5 milhões. A expectativa é que a instalação de um cluster de 1,1 mil processadores, a partir de abril, permita ganhos de desempenho também na previsão dos poluentes atmosféricos. Cluster é um sistema em que dois ou mais computadores trabalham juntos para realizar um processamento de dados pesado - as máquinas dividem as tarefas e operam como se fossem um único equipamento.