Título: Reestruturação da Telefónica preocupa investidores
Autor: Valenti , Graziella
Fonte: Valor Econômico, 16/08/2012, Emrpesas, p. B3

Durou pouco. Menos de um ano negociando só com base em fundamento, e o risco societário está de volta, assombrando o setor de telefonia. Mais especificamente a Telefônica Brasil. A companhia, que já chegou a valer R$ 62 bilhões na BM&FBovespa, em abril, travou abaixo de R$ 55 bilhões, chegando a R$ 54,1 bilhões.

Nesse curto intervalo, os investidores e os analistas do setor respiraram aliviados e pensaram que veriam a companhia, depois da junção de Vivo e Telesp , ser negociada apenas com base nas perspectivas para os negócios.

Mas a paz terminou desde que a matriz espanhola Telefónica assumiu, no fim de maio, que estuda alternativas para vender ativos em busca de melhorar seus indicadores de liquidez e que avaliava o que poderia ser feito com os ativos latino-americanos.

A empresa vislumbra a possibilidade de vender em mercado parte excedente ao controle das empresas na região, após transformá-las numa só companhia.

Os analistas do setor admitem que isso é um fator de pressão sobre as ações - o preço, que estava acima de R$ 56, em abril, caiu para menos de R$ 50. Resultados decepcionantes influenciaram nessa queda. Mas o preço está pressionado nesse patamar justamente pelo peso do temor de uma nova reorganização societária.

Nos relatórios, os analistas tentam tranquilizar investidores. Especialmente porque a Telefónica afirmou que não planeja nada para este ano, pois não há qualquer decisão tomada sobre o que e como fazer com as operações na América Latina.

Mas também isso é um problema para o investidor, pois se recriou um ambiente de incerteza. Ficou a informação de que há interesse em se criar uma Telefônica Latam, com todas as companhias do continente, mas não há outros dados concreto. Só preocupações.

O grupo espanhol se espelha no concorrente regional, a América Móvil, do bilionário Carlos Slim, atualmente avaliada em quase US$ 100 bilhões.

Do atual valor de mercado do grupo Telefónica, listada na bolsa de Madri, de € 46,4 bilhões, 45% equivalem à Telefônica/Vivo, avaliada na bolsa brasileira pelo equivalente a € 21 bilhões.

A companhia entende que há um valor escondido nos demais ativos - especialmente os latino-americanos - que não está sendo devidamente atribuído à companhia pelos investidores.

Procurada pelo Valor, a Telefônica Brasil não concedeu entrevista. Reiterou que "está analisando possíveis alternativas para levar à bolsa os seus negócios na América Latina". Segundo a empresa, tais alternativas seguem em estudo e não há previsão de conclusão para implementação antes de 2013. A operadora do grupo espanhol também negou que haja uma decisão a respeito da transferência da diretoria da América Latina, atualmente em Madri, para o Brasil. Essa mudança foi dada como certa no mercado há algumas semanas, o que acentuou os temores.

Ao anunciar que poderia vender ativos, inclusive na América Latina, grupo espanhol criou temores no mercado

Enquanto os investidores remoem suas preocupações, que também incluem os resultados, os bancos de investimentos assediam o grupo espanhol com planos sobre o que e como fazer com os ativos da região. E garantem que há apetite para o que a empresa quer vender.

Um peixe do tamanho da Telefónica desperta muito apetite nessa ressaca do mercado. Há de tudo um pouco na mesa.

A Telefônica Brasil é a maior operação do grupo na região e a única com ações listadas em bolsa. A matriz tem 82% das ações ordinárias e 65% das preferenciais da empresa brasileira - somando 74% do capital total.

Cada banco tem um projeto para melhorar as finanças da matriz espanhola com os ativos regionais e há diversas opções para o espanhóis estudarem. Desde usar a companhia brasileira para receber os ativos, sendo ela própria a holding, até a criação de um veículo de consolidação novo com sede num paraíso fiscal para listagem de BDRs no Brasil - os certificados representativos de ações de emissão de companhias abertas, com sede no exterior.

Também está entre as alternativas que essa companhia principal continue com sede na Espanha, mas com BDRs aqui, negociados em paralelo com os da Telefônica Brasil.

A única certeza é que, seja uma cesta de empresas ou uma cesta de ações, o tema é complexo.

As equações a serem equilibradas não são simples. É preciso unir a melhor estrutura fiscal (dado o risco de bitributação) com o melhor formato regulatório, e ainda atender ao objetivo principal: gerar valor à Telefónica sem incomodar minoritários da matriz espanhola e da companhia brasileira.

Por isso, há entre os banqueiros quem prefira listar cada companhia em seu mercado de origem, sem unir todas numa só.

Já seria difícil se a Telefónica soubesse exatamente o que quer. Tudo fica ainda mais complicado quando o grupo não tem clareza de seu projeto societário. E mais, quando não há uma unidade de pensamento nem dentro da matriz, conforme apurou o Valor.

A companhia fechou junho com € 58 bilhões em dívida líquida, equivalentes a 2,65 vezes o lucro operacional antes das depreciações e amortizações. A meta é chegar a 2,35 vezes - ou seja, precisa levantar cerca de € 7 bilhões.

Entre os banqueiros, contudo, há certo consenso de que se a Telefónica tiver pressa - dada a complexidade da criação de uma unidade latino-americana - só há uma coisa a fazer: uma oferta secundária do excesso das ações de controle da Telefônica Brasil.

No limite, a empresa pode vender em bolsa todas as suas preferenciais, cujo valor de mercado é da ordem de R$ 24 bilhões. Nesse cenário, ficaria com o controle, mas apenas 34% do capital total de um ativo que rende dividendos bilionários. Se quisesse manter 50% de toda a empresa, ainda teria disponível para venda R$ 15 bilhões.

Embora menos complexa, essa opção também é temida pelos analistas, já que uma oferta volumosa tende a deprimir as cotações, ao menos durante sua realização.

Pelo seu valor de mercado, a Telefônica Brasil teria condições de usar o registro expresso para emissões da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Entretanto, a matriz não gosta da ideia de vender ações nos preços atuais. Em sua última transação, quando pagou € 7,5 bilhões para comprar as ações da Portugal Telecom e dos minoritários da então Vivo, avaliou só a operação móvel em € 25 bilhões. Agora, juntas, fixa e móvel estão valendo na bolsa € 21 bilhões.

O mercado, portanto, segue em compasso de espera, no aguardo de sinais da Espanha.