Título: Relatório de Péres pede cassação de Suassuna
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2006, Política, p. A5

O senador Jefferson Péres (PDT-AM) recomendou ontem a cassação do senador Ney Suassuna (PMDB-PB), ex-lider do partido acusado de envolvimento com a máfia das sanguessugas. Na sessão de ontem no Conselho de Ética do Senado, o pedetista - relator do caso - apresentou duro parecer sobre o colega. Péres classificou a relação entre o gabinete de Suassuna e a quadrilha como "emblemática", já que se trata de "um modelo político exaurido e em decomposição".

No relatório, o envolvimento direto de Suassuna com a quadrilha é descartado. "Não há qualquer prova de seu envolvimento com a quadrilha das sanguessugas. Não há sequer indícios de que o senador houvesse se locupletado dos valores pagos a título de comissão a seu assessor Marcelo Cardoso", escreveu o senador do PDT, ao citar o funcionário do gabinete do pemedebista, que mantinha contato com a família Vedoin.

O pecado de Suassuna, na opinião de Péres, não está relacionado ao recebimento ou não de dinheiro. "O que macula a reputação do senador Suassuna e, por conseqüência, deste Senado Federal, de maneira inaceitável, é a absoluta leniência, especialmente de um líder de bancada".

O senador aponta um episódio ocorrido em 2005 para demonstrar a leniência de Suassuna. Em dezembro daquele ano, uma emenda assinada pelo senador foi encaminhada ao Ministério da Saúde. O documento era ilegal, pois aplicava dinheiro em uma organização não-governamental do Rio de Janeiro para a compra de ambulâncias na Paraíba. A idéia teria partido dos Vedoin. Marcelo Cardoso, assessor de Suassuna, fez a emenda e a assinatura do senador foi falsificada por uma funcionária. A emenda repassava R$ 1,6 milhão.

O Ministério da Saúde alertou Suassuna, que pediu explicações a Marcelo. O assessor informou "que tinha sido um mal-entendido". E o senador deu o assunto por encerrado. "O senador não demonstrou ter adotado providências para punir os responsáveis por tamanha violação da confiança que ele teria depositado. Não se queixou às instâncias administrativas do Senado, não afastou os funcionários responsáveis, não chamou a Polícia Federal para que abrisse inquérito, sequer mudou a rotina em seu gabinete", disse Péres.

O relator aponta também outro delito cometido por Suassuna. Destaca uma foto estampada na "Folha de S. Paulo", na qual aparece uma ambulância com a inscrição "apoio do senador Ney Suassuna". E critica: "Se trata de mais uma ocorrência de ofensa ao princípio da impessoalidade na administração pública. Decerto a atuação de seu assessor tanto agradava o senador Suassuna também por esse tipo de frutos que lhe gerava: sua negociação com os prefeitos rendia ao senador uma propaganda direta junto ao eleitorado". Tal benefício, segundo Péres, configura abuso de prerrogativas.

No fim do relatório, Péres discorreu sobre as relações pouco republicanas entre governo, empresários e parlamentares. "Este processo põe a nu as relações promíscuas entre parte da classe política e o empresariado. Mesmo quando não configuram ilícitos penais, essas práticas se constituem desvios éticos que parecem-me inaceitáveis". No penúltimo parágrafo, as linhas mais duras sobre Suassuna: "Não há dúvida de que o senador não é um réu sem culpa, vítima dos próprios erros. Por isso, sai desse triste episódio com a reputação de tal modo trincada que a sua permanência no Senado contribuiria para fragilizar mais o já abalado prestígio da instituição".

Suassuna pediu a palavra. Defendeu-se. Afirmou que confiava em Marcelo Cardoso e a palavra dele, ao dizer que a emenda era um "mal-entendido" lhe bastava. Disse, também, que mandou ofício a todos os prefeitos para retirarem seu nome das ambulâncias. Mas o tom de sua fala foi o bate-boca com Péres. "Está bonito, o relatório. Mas está subjetivo. O relator quer um símbolo dessa crise, mas eu não me presto a virar símbolo". "O relator gostaria de reformar toda a República aqui. O esquema foi feito nas minhas costas. Fui traído! Até Cristo foi", afirmou.

Em seguida, reclamou do comportamento de Péres, que declarou à imprensa que não era pizzaiolo. "Essa declaração foi veiculada 20 vezes na véspera da eleição. Perdi seis pontos e a eleição. O senhor me surpreendeu, me decepcionou. O senhor quer crucificar o sistema, mas eu não sou o sistema", criticou. E acusou: "Eu não tenho nenhum parente no meu gabinete. O senhor emprega a sua esposa". Péres pediu a palavra. "Minha mulher não é nem nunca foi minha funcionária. Não leve para esse lado. Pedi sua cassação por achar que o senhor quebrou o decoro". Suassuna ameaçou prosseguir, mas desistiu. No fim da sessão, o presidente do conselho, senador João Alberto (PMDB-MA), concedeu vista coletiva. O relatório será votado no dia 8 de novembro.