Título: Governo vai tirar construção de ferrovias da Valec e adotar PPPs
Autor: Borges , André
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2012, Brasil, p. A4

O pacote das concessões de infraestrutura, que será anunciado hoje pelo governo, embute uma mudança profunda no modelo de atuação da Valec, estatal federal que até agora vinha conduzindo de forma direta os investimentos da União na expansão da malha ferroviária do país.

A Valec, apurou o Valor, deixará de ser a grande construtora das novas ferrovias planejadas pelo governo. Todos os projetos, a partir de agora, serão repassados para as mãos da iniciativa privada. Nas ferrovias, será dada total prioridade para o modelo de concessão baseado em parcerias público-privadas (PPPs).

Pela nova modelagem de negócio, o governo oferecerá os projetos ferroviários para as empresas, as quais se encarregarão de construir os trechos e, uma vez concluídos, farão a manutenção das linhas. Caberá, então, à Valec o papel de gestora dessa malha. A estatal ficará responsável por oferecer a capacidade de tráfego de carga das novas ferrovias. A oferta será feita para diversas empresas interessadas, e não mais para uma única operadora logística, como acontece atualmente.

A receita que a Valec obtiver com esses contratos será usada para remunerar o construtor da ferrovia. Cada concessão deverá ter duração de 25 anos. Como o investimento na construção das ferrovias é extremamente alto, o governo sabe que não conseguirá cobrir todo o recurso aplicado nos empreendimentos apenas com os contratos de transporte. Por isso, também haverá injeção direta dos cofres da União para bancar o investimento feito.

O BNDES, mais uma vez, será protagonista para financiar as obras. Para não perder tempo e antecipar a geração de receita, os trechos serão inaugurados por etapas, à medida que ficarem prontos, e não somente após toda a via ser concluída.

As únicas obras que ainda continuarão nas mãos da Valec são a conclusão da parte sul da Ferrovia Norte-Sul (FNS), entre os municípios de Uruaçu (GO) e Estrela D"Oeste (SP), e da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), que liga os municípios baianos de Ilhéus e Barreiras. Como essas obras já foram iniciadas e têm contratos com empreiteiras em andamento, o governo decidiu que o mais viável é concluí-las.

O Valor teve acesso aos principais trechos de ferrovias que serão concedidos pelo governo, volume que deverá ultrapassar 8 mil km de malha. Boa parte da malha já estava sob concessão da Valec. Outra parte refere-se a trechos que foram passados para concessionárias privadas, mas que estão subutlizados.

Uma das vias mais importantes que saem da alçada da estatal é aquela que ligará o município de Açailândia, no Maranhão, até Belém, no Pará. Essa malha adicional de 480 km conclui o eixo norte da Norte-Sul até o extremo do país e abre nova opção de acesso da FNS, que hoje só pode chegar ao Atlântico por meio da Estrada de Ferro Carajás, malha exclusiva da mineradora Vale. A estatal também passará para a iniciativa privada toda a extensão da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico) que liga Lucas do Rio Verde (MT) a Uruaçu (GO), chegando ainda até o litoral norte do Rio de Janeiro.

Os 2,5 mil km de projetos ferroviários da região Sul, que recentemente tiveram estudos de viabilidade técnica e econômica contratados pela Valec, também migrarão para as empresas. Na lista, estão empreendimentos de extrema relevância para o escoamento agropecuário do país, como o prometido trecho da Ferroeste, que ligará Maracaju (MS) ao porto de Paranaguá, no Paraná, passando por Cascavel (PR). Outra malha da região ligará Dourados (MS) até Panorama, em São Paulo.

O pacote das concessões ferroviárias também incluirá uma grande malha que, atualmente, está nas mãos de concessionárias, mas que serão devolvidas à União, porque estão subutilizadas pelas empresas. A Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), controlada pela Vale, vai devolver dois trechos extensos ao governo: a linha entre o Rio de Janeiro e Vitória e a malha entre Belo Horizonte e Salvador. O assunto já foi tema de reunião entre o Palácio do Planalto e o presidente da Vale, Murilo Ferreira. Segundo fonte do governo, a empresa não teria feito nenhum tipo de obstrução. Procurada pelo Valor, a FCA informou que não iria se manifestar sobre o assunto.

Outro trecho que será concedido é a antiga malha que liga São Paulo e Rio Grande, linha que avança pela região Sul, paralelamente à BR-116. Ainda no Estado de São Paulo, o pacote inclui as obras do Ferroanel.

Com a reformulação total de seu modelo de atuação no setor ferroviário, o governo espera reduzir substancialmente o prazo de execução de obras que, sob a condução da Valec, têm enfrentado uma série de dificuldades e irregularidades. A estatal tira de seus ombros a missão de atuar diretamente no setor, e passa a ser um orgão de gestão e fiscalização das ferrovias do país.