Título: Uma bandeira verde-amarela em terras argentinas
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2006, Empresas, p. B6

A rivalidade Brasil-Argentina não se restringe mais aos campos de futebol e aos contenciosos na economia. Cinco ex-executivos brasileiros se associaram na empresa Yuhan S.A. para comprar a Finca Don Otaviano. Ela fica aos pés dos Andes, na província de Mendoza, e lá produzem o vinho Penedo Borges Malbec Roble. O produto chega ao mercado nacional com um slogan provocante: "Já está no Brasil o 'nosso' vinho argentino". A primeira safra de 30 mil garrafas será distribuída pela Reloco.

A idéia de investir em vinho surgiu quando Otavio Paiva, economista e engenheiro, ex-Vale do Rio Doce e ex-Odebrecht, se aposentou na empreiteira. "Depois de ficar 20 anos na empresa, cheguei à conclusão que não dava mais para trabalhar full time e decidi partir para meu próprio negócio. Optei por fazer um hedge geográfico, investindo num projeto fora do Brasil, no Chile ou na Argentina e, para esta aventura, convidei alguns amigos", disse Paiva.

Ele se refere a Euclides de Penedo Borges, engenheiro civil, ex- Vale do Rio Doce; João Carlos Tourinho Dantas, economista e ex-Opportunity ; José Caetano Lacerda, também ex-Odebrecht, residente em Miami, onde trabalha na área imobiliária; e Ricardo Moraes Pinto, advogado. A convite de Paiva, todos decidiram juntar suas economias e investir US$ 1 milhão num empreendimento considerado por eles mais um "desafio" em carreiras bem sucedidas no mundo dos grandes negócios.

Paiva, já com o "sinal verde" dos futuros sócios, percorreu terras do Chile e da Argentina, até atracar em Mendoza, a maior fronteira vitivinícola do país vizinho. Lá, o ex-executivo procurou um "corretor rural", figura muito conhecida na região, que lhe mostrou umas 30 áreas, localizadas em lugares 'primes', que lhe tinham sido indicadas por Euclides Penedo Borges, o sócio enófilo da Yuhan, que acabou por dar nome ao vinho.

"Nós decidimos adquirir uma propriedade por US$ 600 mil, com plantação de 24 hectares de parreiras malbec e cabernet sauvignon. O terreno todo tem 70 hectares e pertencia a uma empresa que estava concordatária, a Gipse", relatou.

Na hora de fechar o negócio, capitalizou-se a empresa recém-criada, a Yuhan S.A., com os recursos enviados do Brasil através do Banco Central. Adquirida a Finca, a sociedade dos amigos na Yuhan foi repartida da seguinte maneira: Paiva e Caetano ficaram majoritários, cada um com 28% do capital da empresa, Ricardo e João Carlos com 20% cada e Euclides, com 4%.

"Nós tomamos posse da propriedade em início de 2005, batizamo-la de Finca Don Otaviano, nomeamos um presidente, escolhemos um gerente para a empresa, contratamos um enólogo para supervisionar o empreendimento. Ou, seja, nos estabelecemos lá criando uma administração e, para nossa alegria, até colhemos uma primeira safra em abril do ano passado, que nos gerou um caixa líquido de US$ 120 mil por conta da venda de 350 toneladas de uva", contou Paiva.

A partir de 2006, os investidores resolveram aplicar recursos na melhora da qualidade da fruta, pois têm um plano estratégico de produzir uma das melhores uvas da região para atrair compradores. Com este objetivo, estão investindo mais US$ 400 mil num projeto que inclui ainda ampliação da capacidade de produção da fruta. Isto, porque a melhoria da qualidade acabou levando a uma redução da produção para 260 toneladas, volume colhido em abril último.

Entre 2009 e 2010, dos 70 hectares da Finca Don Otaviano, 48 hectares vão estar em produção. Atualmente, existem 24 hectares produzindo e outros 24 estão em plantio. A expectativa de Paiva e seus sócios é colher nos próximos três anos 520 toneladas de uvas, com capacidade de produção de 300 mil litros de vinho. "Com isto, poderemos gerar um caixa líquido da ordem de US$ 750 mil, computando venda de uva e de vinho".

Para o ex-executivo, que fez o plano financeiro do projeto grande Carajás, da Vale do Rio Doce, o grande desafio neste negócio é ser um grande produtor de vinho. "Já somos produtores de uva. Se ficarmos só nisso, podemos garantir geração de caixa líquida de US$ 200 mil por ano. Na pior das hipóteses, investimos US$ 1 milhão e vamos agora gerar US$ 200 mil/ano só com a venda de uva. Já é a melhor caderneta de poupança. Agora, o up grade, o grande desafio, é produzir muito vinho".

Mas, para chegar lá o grande teste para o investidor é a comercialização, a conquista do mercado, avisa Paiva. "Isto é o que estamos começando a fazer ao colocar agora nossa marca no Brasil." O próximo passo dos brasileiros em Mendoza, é partir em busca de um parceiro estrangeiro, de preferência europeu, que tenha os canais de distribuição, para ajudá-los a desbravar o mercado global de uma das mais antigas bebidas do mundo.