Título: Com soja em crise, arroz e algodão recuperam espaço no Mato Grosso
Autor: Bouças, Cibelle
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2006, Agronegócios, p. B14

Argino Bedin, tradicional produtor de soja em Sorriso (MT), decidiu mais que dobrar a área cultivada com arroz na safra 2006/07. Ele iniciou o plantio na semana passada e pretende destinar 650 hectares para o cereal, contra 300 no ciclo anterior. A expansão do arroz se dará em áreas que na safra passada foram ocupadas com a soja. Para a oleaginosa, ele reservou 9,5 mil hectares, 4% menos que em 2004/05. "Há sinais de que o preço do arroz terá uma lucratividade pouco melhor que a soja o ano que vem", afirma o produtor.

Otaviano Pivetta, ex-prefeito de Lucas do Rio Verde (MT) e que planta em Nova Mutum, Sinop e Diamantina, reduziu a área de soja em 1 mil hectares, para 64 mil. A sua aposta, porém, foi no algodão. Dono do Grupo Vanguarda, ele vai ampliar o cultivo da pluma em 9 mil hectares, para 30 mil. "A empresa fechou contratos de exportação e ampliou a área para atender a esses clientes", informa Wellington de Lima, agrônomo do grupo.

A decisão tomada por Bedin e Pivetta, dois dos maiores produtores de soja do país, repete-se em todo o Estado - hoje o maior produtor de soja do país, responsável por 30% da oferta do grão na última safra, ou 16 milhões de toneladas. O alto endividamento e as perspectivas de preços baixos e rentabilidade negativa para a soja estimulam agricultores a substituir parte da área antes destinada à oleaginosa por arroz e algodão.

A previsão de entidades do setor é de que as duas culturas ocuparão uma área 36% superior ao registrado no ciclo 2005/06, o que representa um salto de 230 mil hectares, para 873 mil no total. Já a área de soja deve diminuir 15%, para 5 milhões de hectares, conforme a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato).

Seneri Paludo, analista da Agência Rural, observa que o arroz tem sido a principal escolha dos pequenos e médios produtores para substituir a soja, enquanto o algodão é adotado pelos grandes. "Há uma tendência de expansão do arroz no norte do Estado e do algodão no sul", afirma Paludo. Em Campos de Júlio, por exemplo, produtores optam pela primeira vez pelo arroz. A cultura no município deve ocupar 3 mil hectares.

A opção é explicada principalmente pelos custos. Conforme levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) no Estado, o arroz tem o menor custo de produção por hectare, de R$ 1.458, contra R$ 1.688 da soja e R$ 4.550 do algodão. Também foi a única cultura que registrou queda no custo, de 16% sobre 2005/06.

Antônio Galvan plantou 2 mil hectares de soja em Vera (MT) na safra passada, e este ano vai reduzir para 1,5 mil. Parte dessa área será destinada à pastagem para gado e, pela primeira vez, vai plantar 100 hectares de arroz. "O mercado melhorou para o arroz, embora seja mais difícil vender arroz que soja, por causa da demanda restrita ao mercado interno", diz Galvan.

O produtor Argino Bedin observa que os agricultores tiveram problemas há dois anos atrás para comercializar o arroz, quando o Estado elevou a produção em 23%, influenciados pelos altos preços alcançados em 2004. No ciclo passado aconteceu o inverso. Os baixos preços levaram produtores a reduzir a área, que caiu 63%, de 777 mil para 287 mil hectares.

O efeito direto dessa redução foi uma queda de 64% na oferta de arroz, para 739 mil toneladas. E como grandes empresas - como Camil, Josapar, SLC Alimentos e Urbano Agroindustrial - investiram em indústrias no Estado nos últimos cinco anos, ampliando a capacidade de processamento de 900 mil para 1,65 milhão de toneladas, a oferta escassa de arroz traduziu-se em aumento de preços na atual safra.

Conforme dados da Federação dos Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), o preço médio da saca de 60 quilos no Estado sai hoje a R$ 22, contra R$ 11 no mesmo período do ano passado. "A alta de preços no Mato Grosso e a previsão de redução de área no Rio Grande do Sul em pelo menos 10% devem fomentar a expansão do plantio no Centro-Oeste", avalia Marco Aurélio Tavares, diretor da Federarroz.

Já no caso do algodão, a rentabilidade superior à da soja é apontada como principal fator para a substituição. José Luiz Pessa, sócio do grupo Fazenda Nova, vai ampliar a área de algodão de 7 mil para 20 mil hectares e reduzirá a área com soja em 20%. "Os preços futuros do algodão estão 15% maiores no mercado externo", diz. Wilhelmus Uitdewilligen, assessor técnico da Associação dos Produtores de Algodão do Mato Grosso (Ampa), observa que o custo de produção do algodão é de US$ 1,8 mil por hectare e gera receita de até US$ 4 mil. A soja, por sua vez, custa US$ 350 e gera receita de US$ 1.500 por hectare. "Outra vantagem do algodão é que os sojicultores podem cultivar a pluma logo que colhem a soja precoce", observa.