Título: De portas abertas
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2006, EU & Investimentos, p. C5

Discussões no governo em torno de mudanças no cálculo da Taxa Referencial (TR) e a recente regulamentação da adoção de juros prefixados em empréstimos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH) fazem com que o futuro mutuário tenha novas variáveis para decidir pela melhor opção de financiamento imobiliário. Esta última mudança, implementada pela Medida Provisória 231 e já regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), prevê a possibilidade de bancos usarem recursos da caderneta de poupança para emprestar a taxas prefixadas até o limite de 12% ao ano mais um fator calculado a partir da variação da TR nos 90 dias anteriores a cada mês. O primeiro teto ficou em 14,2% ao ano, abaixo das taxas cobradas anteriormente em empréstimos prefixados com dinheiro próprio dos bancos.

A taxa prefixada tem um fator maior de previsibilidade para os compradores de imóveis financiados pelo SFH. Por ela, serão conhecidos antecipadamente os fatores que comporão o cálculo das parcelas. Alguns bancos já ofereciam empréstimos com juros prefixados fora do SFH, mas a juros muito mais altos - até acima de 20% ao ano - ou prazos mais curtos. Agora, com a possibilidade do uso de dinheiro da caderneta, abre-se o caminho para condições melhores. Diversas instituições já discutem novos lançamentos. Entre elas, a Caixa Econômica Federal, maior fonte de crédito imobiliário do país.

Os compradores de imóveis mais conservadores tenderão a procurar os financiamentos prefixados, diz o professor de matemática financeira e especialista em financiamento imobiliário, José Dutra Vieira Sobrinho. "Quem escolher o financiamento cuja parcela varia conforme a TR correrá mais risco, porque a taxa, em prazos mais longos, apresenta maior probabilidade de subir do que de cair." Se o cálculo da TR for revisado para baixo - conforme discutido em Brasília, segundo reportagem do Valor ontem -, seria vantagem para quem toma empréstimo pós-fixado, mas ela cairia pouco, diz Dutra. "Mas, num prazo tão longo, é impossível prever que o juro não volte a disparar e a jogar para o alto a TR." A incerteza do rumo da inflação e dos juros, portanto, é fator importante em decisão para dez ou vinte anos.

"Quem compra imóvel passou a ter mais uma alternativa de financiamento", diz José Manuel Alvarez Lopez, superintendente de crédito imobiliário do Santander. Ele diz, no entanto, que são perfis diferentes os de clientes de taxas pré e pós-fixadas. O Santander já emprestava a taxa prefixada seus recursos próprios. Inicialmente, a taxa era de 21,4% ao ano, tendo caído para 16,95% e reduzido para 14% ao ano, assim que liberado o empréstimo prefixado pelo SFH. Alvarez Lopes destaca que, mesmo antes de reduzir o juro, o Santander já concedia um terço de seus empréstimos imobiliários a taxas fixas.

Apesar da definição do teto do juro prefixado variar mês a mês, será comercialmente mais interessante determinar uma taxa para todos os meses. Essa tendência deverá ser seguida por todos os competidores, prevê Dutra.

Ele alerta, porém, para o cuidado dos mutuários em calcular esses juros, que podem ser informados ao mês ou ao ano. Essa conta não é simples, diz Dutra. O juro máximo de 1,49% ao mês cobrado pelo Itaú no crédito prefixado, por exemplo, equivale a 19,42% ao ano.

Com a possibilidade de se emprestar a juro prefixado com recursos da poupança, agora fica possível também usar dinheiro do FGTS periodicamente para amortizar parcelas do SFH.

O futuro proprietário deve estar atento porque, de acordo com a taxa oferecida nos empréstimos prefixados, pode continuar mais interessante optar pelo pós-fixado. O HSBC, por exemplo, oferece taxa de 12,68% ao ano apenas para imóveis acima de R$ 200 mil. Para valores até R$ 150 mil, por exemplo, cobra 8% ao ano, além da variação da TR. "Acreditamos que, nesse caso, não compensa oferecer taxa prefixada frente a essas condições", diz Roberto Sampaio, diretor de crédito imobiliário do HSBC.

Embora o mercado tivesse expectativas concretas, não foi desta vez que o governo instituiu a possibilidade de repactuação periódica dos contratos ou a flexibilização da portabilidade do crédito entre instituições, como ocorre na Europa e nos EUA. Dessa forma, seria mais viável contratar financiamento prefixado, na expectativa de poder alterá-lo, se o cenário mudar bruscamente, diz Dutra. Nos últimos anos, o volume financiado pelo SFH cresce com força (ver gráficos acima), acompanhando principalmente o avanço da renda do trabalhador formal, diz Décio Tenerello, presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip). "Além disso, a TR apresentou variação muito abaixo dos índices de inflação nos últimos anos, o que atrai os mutuários que prevêem pagar prestações mais baixas." A partir da implantação da Lei 10.931, de 2004, o setor ganhou regras mais claras para quem financia e para quem pegar emprestado. "Os bancos passaram a ver o crédito imobiliário como um negócio e não obrigação."

A previsão é que o setor está prestes a crescer em velocidade ainda maior, avalia Sampaio, do HSBC. Dutra espera que as taxas prefixadas caiam com a maior competitividade. Porém, ao deixar de comprar imóvel agora para adquiri-lo posteriormente apostando na redução da taxa, o comprador corre outro risco, que é o de o valor do imóvel subir.