Título: Com receio, investidores tiram dinheiro da China
Autor: Orlik , Tom
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2012, Internacional, p. A13

Os investidores e as empresas estão tirando cada vez mais dinheiro da China e do yuan, um gesto de desconfiança quanto às perspectivas de crescimento do país que pode minar as tentativas de Pequim de promover uma virada.

Dados novos divulgados ontem pelo banco central da China mostraram que um saldo equivalente a 3,8 bilhões de yuans (US$ 507 milhões) em moeda estrangeira deixou os bancos chineses em julho, sugerindo que os exportadores da China não estão convertendo suas receitas em dólar para yuan e que alguns investidores estão retirando seu dinheiro do país.

Os bancos da China compraram só 145 bilhões de yuans em moeda estrangeira durante os últimos dez meses, consideravelmente menos que os 905 bilhões de yuans em moeda estrangeira que entraram no país como resultado do superávit comercial.

Trata-se de um flagrante contraste com a maior parte da década passada, quando a confiança no crescimento da China e o apetite por yuans implicavam que os bancos do país asiático não só estavam comprando todo o superávit, mas também influxos consideráveis de capital especulativo, conhecidos como "hot money". Nos primeiros dez meses de 2008, os bancos da China compraram um saldo líquido de 3,6 trilhões de yuans em moeda estrangeira.

Os grandes influxos de capital foram um fator fundamental na avalanche dos empréstimos bancários na China, que aumentou o preço dos ativos e valorizou o yuan. Agora, o dinheiro está fluindo na direção oposta, contribuindo para uma derrubada generalizada nos preços, desde imóveis até ações e o próprio yuan.

Menos fundos fluindo para o sistema financeiro da China implica aperto nos mercados de capital, tornando mais difícil para os bancos emprestar dinheiro, e complicando os esforços de Pequim para impulsionar o crescimento. O banco central da China já injetou mais de 1,4 trilhão de yuans no sistema financeiro neste ano, mas os empréstimos bancários continuam escassos.

"Desde o segundo semestre de 2011, a piora da crise europeia, os choques no sistema financeiro mundial e a desalavancagem causaram uma corrida por portos seguros, com capital de curto prazo deixando os mercados emergentes e migrando para os Estados Unidos", escreveu o pesquisador do governo chinês num relatório recente. "Esses fluxos deram um choque na economia da China."

Parte disso inclui dinheiro de investidores privados cada vez mais empenhados em transferir fundos para o exterior, embora a quantia exata seja difícil de apurar. Numa pesquisa com 2.600 indivíduos de alto patrimônio conduzida pela China Merchants Bank and Bain & Co. para um relatório de 2011, quase 60% já haviam realizado uma transferência de investimento para fora do país ou estavam estudando fazê-lo.

Rupert Hoogewerf, fundador da Hurun Report, que acompanha a riqueza da elite chinesa, diz que os ricos do país estão procurando diversificar sua fortuna. "Os empreendedores chineses estão fazendo investimentos puros em imóveis comerciais e ações, e estão fazendo investimentos pessoais em imóveis, principalmente nos EUA e Hong Kong", disse ele. "Essa tendência poderia continuar pelos próximos dez anos."

O apetite por dólares vem contribuindo ainda para uma grande virada nas taxas de câmbio da China. O yuan já caiu 0,7% contra o dólar desde o começo do ano, pondo o banco central chinês na inusitada posição de combater as pressões do mercado para desvalorizá-lo ainda mais. A China ainda mantém o seu câmbio em rédea curta, limitando as flutuações diárias dos mercados domésticos a um estreito intervalo. Mas, dentro desse intervalo, os investidores podem pressionar a moeda para cima ou para baixo.

Muitas das empresas locais estão optando por conservar suas receitas no exterior em dólares em vez de yuans, dizem analistas, reduzindo as compras de moeda estrangeira dos bancos chineses. "As empresas estão menos confiantes sobre o cenário da economia chinesa e mantendo uma parte maior do seu faturamento em dólares. Com o yuan continuando a cair, não consigo ver isso mudando nos próximos meses", disse He Weisheng, estrategista de câmbio do Citibank.

Os fluxos de capital para fora da China ajudaram a diminuir os preços dos ativos chineses. O índice Xangai Composite caiu 17% em relação a um ano atrás. Os preços dos imóveis também estão mais baixos, refletindo em parte as tentativas do governo de desaquecer o setor.

Desinflar bolhas de ativos é um benefício de longo prazo para a China. Mas, com o governo concentrado no crescimento, preços em queda ameaçam corroer a confiança do investidor. O capital levantado pelas empresas chinesas nos primeiros sete meses deste ano foi 35% menor que um ano antes, segundo o provedora de dados CapitalVue. A construção de novos espaços residenciais caiu 13,4% na comparação ano a ano.

O superávit comercial da China e o investimento direto do exterior implicam um influxo quase constante de capital estrangeiro na economia. No passado, as expectativas de valorização do yuan faziam com que esse capital fosse rapidamente convertido para a moeda. Dados mensais da compras de moeda estrangeira pelos bancos capturam essas transações. Compras de moeda estrangeira que ficam abaixo do influxo mensal do comércio e investimento indicam ou que o dinheiro quente está saindo do país, ou que as empresas decidiram manter em dólares suas receitas no exterior. (Colaboraram (Stefanie Qi e Kersten Zhang)