Título: País precisa investir R$ 87 bi por ano
Autor: Capela, Maurício
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Brasil, p. A6

Adilson Primo pertence a uma casta de executivos que adotou a objetividade como estilo. Dono de um discurso direto, prático e longe de meias palavras, Primo, que é o atual presidente da alemã Siemens no Brasil, não é dado a voltas quando o assunto é desenvolvimento da economia no país. "O grande tema nacional de hoje é o crescimento econômico, porque todas as outras necessidades, como a redução da desigualdade social, virão a reboque", afirma.

É até por isso que Primo anda preocupado com os passos de tartaruga que a economia brasileira tem dado ultimamente. E receita uma dose cavalar de investimentos, R$ 87,7 bilhões por ano durante duas décadas no setor de infra-estrutura, para tirar o país do marasmo.

Só para se ter uma idéia do que diz Adilson Primo, que também ocupa a vice-presidência da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústria de Base (Abdib), nos anos 70 o país registrou um crescimento médio de 8,8% ao ano. Número, inclusive, bem próximo ao verificado na China nos últimos 25 anos, com média anual de 8%.

No entanto, o milagre brasileiro desapareceu. Nos anos 80, a média anual nacional foi de apenas 3%, caindo para parcos 2% nos anos 90 e alcançando algo como 2,5% ao ano na média entre 2000 e 2006.

"Não acredito em crescimento maior do que 3% do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano", decreta Primo. A decepção é tamanha que o executivo desfia um rosário de números para justificar a urgência do tema.

Dos quase R$ 88 bilhões projetados anualmente para as duas décadas, o presidente da Siemens afirma que pelo menos R$ 16,6 bilhões deveriam seguir direto para o setor de energia, outros R$ 31,5 bilhões para a indústria de petróleo e gás. Já o segmento de transporte ficaria naturalmente com R$ 16,8 bilhões e telecomunicações arremataria mais R$ 13,2 bilhões. O restante, R$ 9,6 bilhões, seria usado em saneamento básico.

"Na verdade, são números até conservadores, porque estão atrelados a um crescimento de 3,5% do PIB brasileiro", conta Primo. Mas se a cifra é considerada conservadora, como classifica-la comparada à realidade atual: no ano passado, os gastos em infra-estrutura no país não superaram R$ 14 bilhões.

Para o presidente da Siemens, cujo faturamento líquido é de R$ 6,6 bilhões no Brasil, o fato é que o modelo fiscal atual implantado no país já se exauriu. Em outras palavras, as altas taxas de juro, o aumento da carga tributária, o crescimento dos gastos correntes tiraram do governo o fôlego necessário para se investir em infra-estrutura, condição essencial para pavimentar o crescimento da economia em qualquer país.

Tanto é assim que Adilson Primo defende a adoção de uma série de medidas para aumentar o investimento público e privado no Brasil. Primeiro, é necessário que o governo faça um choque de gestão, reduzindo os gastos públicos, ou seja, fazer mais com menos. Depois, o executivo defende a criação de mecanismos que possibilitem o acesso a crédito competitivo.

Hoje, avalia Primo, só o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é capaz de emprestar recursos a taxas competitivas no país. "Uma forma de aumentar o acesso seria a criação de fundos de investimento, que necessariamente precisariam ter uma tributação diferenciada", sugere o vice-presidente da Abdib.

Além disso, Adilson Primo acredita que o ideal seria ter um ambiente que pudesse contar com a participação dos fundos de pensão nos projetos de infra-estrutura no país. E afirma que as companhias também precisariam adotar também o mercado de capitais.

Esse conjunto de propostas, no entanto, não ficou apenas no papel. O presidente da Siemens no Brasil conta que tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seus principais ministros, como o candidato a presidente Geraldo Alckmin já foram apresentados a estas idéias. A acolhida de ambos, diz, foi boa.

"Algo precisa ser feito, sob pena, por exemplo, de o país correr risco de sofrer uma nova falta de energia nos próximos anos", afirma o executivo da Siemens. Cálculos mostram que o Brasil precisará de 4 mil megawatts adicionais por ano para manter um ritmo de crescimento anual ao redor de 3%.