Título: Ministros municiam campanha à reeleição
Autor: Costa, Raymundo e Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Política, p. A14

O Palácio do Planalto orientou ministérios a esmiuçar a administração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, nos dois mandatos, e aprofundar a comparação entre os períodos de governo do PSDB e do PT. A reunião de ministros da quarta-feira passada, na casa de Hélio Costa (Comunicações), que deveria ter sido sigilosa, não foi a primeira entre os integrantes do primeiro escalão para discutir formas de ajudar na reeleição do presidente Lula. Antes dela, houve uma outra com ministros e secretários-executivos em uma casa no Lago Norte, um bairro nobre de Brasília.

O Planalto deve centralizar as informações. Houve recomendação expressa para não se enviar nada ao PT. O presidente tem demonstrado profunda irritação com a atuação do partido na reta final de uma campanha que considerava vitoriosa no primeiro turno, e que as primeiras pesquisas recebidas pelo Planalto, após a eleição de domingo, consideram ameaçada. Ministros e secretários-executivos também têm procurado se reunir fora do horário do expediente, para não caracterizar o engajamento da máquina pública nas eleições.

Alguns ministérios receberam orientação específica. Este é o caso, por exemplo, do Ministério da Saúde, que deve passar um pente fino no trabalho do médico Luiz Roberto Barradas Barata quando ocupou a assessoria especial do então ministro José Serra, governador eleito de São Paulo. Barradas, que estava no ministério desde Adib Jatene, é secretário de Saúde de São Paulo, nomeado pelo candidato tucano à Presidência Geraldo Alckmin e mantido no cargo por seu sucessor, Cláudio Lembo. É cotado para continuar na secretaria.

Um e-mail que circula entre gestores da administração pública aponta o engajamento da máquina na eleição. Em anexo, uma planilha eletrônica com dados comparativos entre os oito anos de FHC e os quatro do governo Lula. Trata-se de um resumo com os principais números das áreas "externa", "economia, crescimento e emprego", "área social" e "programa social". Entre outras comparações, diz que o aumento da carga tributária foi de 3% do PIB em três anos do governo Lula, contra 21% do PIB em oito anos de Fernando Henrique Cardoso - na verdade, a elevação foi de 8% do PIB, um ponto percentual por ano.

O Planalto avalia que é ampla a vantagem comparativa de Lula em relação ao período tucano, o que deve ser mais explorado pela campanha. No e-mail que circula entre os gestores públicos, Alckmin é identificado como "um dos integrantes das privatizações do PSDB/PFL que vendeu a Vale do Rio Doce por menos de 10% do que a empresa valia na época para ser paga em 10 anos com recursos do BNDES". A Vale, de acordo com o e-mail, "somente no semestre passado obteve em lucro equivalente a duas vezes o valor a ser pago em dez anos por ela". E arremata: "É uma empresa de soberania nacional que junto com a Petrobras jamais poderia ser vendida, pois representa nosso solo, (nossa) terra".

O engajamento de ministros na campanha tem explicação. O governo e o comando da campanha de Lula estão preocupados com pesquisa qualitativa feita por um instituto de pesquisa para um partido aliado. A pesquisa, cuja autoria não pode ser revelada porque ela não foi registrada no TSE, diz que na sexta-feira passada, a dois dias da eleição, além da queda de intenção de voto, ocorreu uma deterioração em todos os atributos de Lula. "Caiu especialmente o atributo 'corrupção'", diz a pesquisa, que ficou pronta no dia 2 e foi imediatamente informada ao governo.

Os sinais da trajetória de queda se mantiveram no fim de semana, particularmente, na região que vai do Rio Grande do Sul a Minas Gerais - nessa área, com exceção de Minas, Lula ficou atrás de Alckmin em todos os Estados. "Além disso, o teto de Alckmin aumentou", conta a pesquisa à qual o Valor teve acesso.

Quanto ao segundo turno, o instituto de pesquisa analisou 99 eleições (federais, estaduais e municipais) e chegou à conclusão que, quando um governante disputa a reeleição, as chances de ganhar no segundo turno são de 74% se a avaliação "ótima ou boa" de sua gestão estiver entre 40% e 50%. Se passar de 50%, a chance aumenta para 92%. Como a popularidade de Lula está acima de 50%, o cenário favorece "amplamente" o presidente-candidato.

A pesquisa mostra, no entanto, que, mesmo num cenário favorável, "fatos políticos" podem colocar tudo a perder. "Os 26% que não são reeleitos não o são por causa de fatos políticos. Não é possível afirmar se esta eleição ficará nos 74% ou nos 26%", advertem os pesquisadores. "A confrontação entre fatos políticos e cenário indica que o segundo turno será acirrado. O cenário pode não ser suficiente para Lula. Para que isto aconteça, Alckmin precisa alimentar muito a fogueira dos fatos políticos."