Título: Novo presidente no Brasil adota estilo de Ghosn
Autor: Gómez, Natalia e Nakamura,
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Empresas, p. B6

Havia pouco mais de um mês que um novo carro, a mais moderna geração do sedã Mégane, havia sido lançado no mercado brasileiro quando Jérôme Stoll assumiu o cargo de presidente da operação, em maio passado. De cara, ele notou falhas no processo e, para espanto de toda a engenharia local, mandou interromper imediatamente o ritmo de produção do automóvel no qual a Renault depositava esperanças de recuperar participação. A empresa perdeu vendas. Mas Stoll não se arrepende.

"Eu disse: estamos aqui para construir o futuro da Renault. É melhor parar agora a linha de um produto do que seguir adiante com um processo errado".

O presidente mundial da Renault/Nissan, o brasileiro Carlos Ghosn, parece ter escolhido para o comando das operações no Mercosul um executivo com estilo bem parecido ao seu.

Logo que chegou ao Brasil, há cinco meses, Jérôme Stoll chacoalhou a operação. Mudou o comando das principais áreas, como vendas, marketing, engenharia e compras. Novos executivos estão à frente dessas funções desde que Stoll lançou um plano de reestruturação da operação que tenta acompanhar o que Ghosn desenhou para toda a companhia até 2009.

O modelo se baseia na sua própria experiência. Ghosn tirou Stoll da Coréia do Sul, onde o executivo passou seis anos organizando uma empresa que surgiu com a aliança da Renault com a Samsung.

A convivência com os coreanos lhe forneceu bagagem para lidar com culturas diferentes. Stoll é desembaraçado, tem raciocínio veloz e fala sobre detalhes da indústria automotiva mundial com a destreza dos executivos que mais a conhecem. Diz que o setor precisa passar por um grande processo de reestruturação. "As grandes empresas estão passando por problemas sérios. Mas precisam entender que o que é bom num país não é necessariamente bom em outro mercado", afirma.

Stoll tem se esmerado nas aulas de português porque considera que "a língua ajuda a entender a cultura de um povo". Talvez por isso não se importe com as falhas de pronúncia do seu nome.

O executivo já conseguiu perceber as diferenças entre a indústria automobilística coreana e a brasileira. A primeira já sai na frente porque conta com empresas próprias, como o grupo Hyundai-Kia, um dos maiores fabricantes de veículos do planeta. No Brasil, lembra, atuam as subsidiárias de companhias estrangeiras. Além disso, diz, na Coréia o setor encontra mais respaldo do governo.

O número de fabricantes de veículos no Brasil impressiona o executivo. "E eu achava que o mercado europeu era o mais competitivo do mundo", afirma. Quando as montadoras planejaram os investimentos no Brasil acreditava-se que o mercado chegaria a 3 milhões de veículos por ano. As vendas estão em 1,8 milhão. "Eu não sei se há montadoras demais no país, mas não me importaria se alguma decidisse sair", afirma o executivo.

O cenário macroeconômico do país o entusiasma. Ele diz que o Brasil está amadurecendo. "Não se vêem os altos e baixos de antigamente", afirma. Apesar disso, para o executivo, a taxa de crescimento econômico do país é muito baixa. O crescimento anual do Produto Interno Bruto deveria ser 6% no mínimo. "Taxas mais baixas representam um risco", completa.

A trajetória da história de Jérôme Stoll também tem uma certa semelhança com a de Carlos Ghosn. O presidente mundial da Renault nasceu no Brasil, mas tem formação francesa. Com 52 anos de idade, Stoll nasceu na Tunísia. Mas sua nacionalidade é francesa. Foi na França que ele cursou a escola superior de comércio antes de entrar para o grupo Renault, em 1980. Para o Brasil ele trouxe esposa e dois dos quatro filhos. Stoll é o terceiro presidente da Renault no Brasil desde que a companhia investiu na construção da fábrica inaugurada no final de 1998. (MO)