Título: Montadoras freiam ritmo de lançamentos
Autor: Gómez, Natalia e Nakamura,
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Empresas, p. B6

A redução dos investimentos das montadoras deve arrastar ainda mais o ritmo de lançamentos no Brasil nos próximos anos. Receosas com a estagnação das vendas internas, os fabricantes - principalmente a GM, a Ford, a Volkswagen e a Fiat - apostaram pouco em novos modelos produzidos localmente. Este ano, só o Prisma, da General Motors, e o Mégane, da Renault, foram lançados. O último lançamento da Fiat foi o Idea, em 2005.

Iniciativas como a da Renault, que anunciou ontem que colocará no mercado cinco novos modelos até 2009, serão cada vez mais raras. Na opinião de Marcelo Cioffi, sócio da PricewaterhouseCoopers (PwC), "trata-se de um reposicionamento da empresa, que chegou ao país durante o 'boom' do setor automotivo da década de 90 e que não conseguiu deslanchar até agora. Com os novos modelos, quer roubar participação de mercado dos concorrentes", disse.

Procuradas pelo Valor, as principais montadoras do país preferiram não se manifestar, por considerar a agenda de lançamentos "assunto estratégico".

Atualmente o mercado brasileiro dispõe de 550 modelos (incluindo os importados), ante os 210 existentes em 1994. Entretanto, o maior número de lançamentos ocorreu entre 1997 e 2000, quando uma nova leva de montadoras se instalou no Brasil, como PSA Peugeot-Citroën, Renault, Honda e Toyota.

Segundo o especialista do setor automotivo David Wong, da Kaiser Associates, o aumento das exportações para a Argentina e o Uruguai contribuiu para os novos desenvolvimentos. "O mercado interno também estava mais aquecido", diz. Dados da Anfavea apontam que em 1997 o consumo interno atingiu o recorde de 1,9 milhões de unidades. Com as exportações, esse número saltou para 2,5 milhões.

De lá para cá, as vendas internas caíram sensivelmente, o que afastou do Brasil planos mais ambiciosos das montadoras. Estima-se que o desenvolvimento da engenharia de um novo modelo custa entre US$ 300 milhões e US$ 500 milhões. Caso seja uma adaptação estética, a reforma consome no mínimo US$ 100 milhões, de acordo com Wong.

Com folga nas linha de produção, as montadoras foram obrigadas a buscar o mercado externo para justificar os pesados investimentos da década de 90. Mas a recente valorização do real perante o dólar fez ruir a competitividade das exportações brasileiras. Dessa forma, ficam mais difíceis os planos das montadoras instaladas no pais em atrair a produção de modelos considerados mundiais.

Com isso, o ciclo de vida de um modelo no Brasil está mais longo que na Europa e nos Estados Unidos, onde os carros ganham aparência nova depois dos três primeiros anos e uma segunda "reforma" quando completam seis ou sete anos. No Brasil, um dos veteranos é o Vectra, cuja primeira versão foi lançada pela GM no início da década de 90. No ano passado, após dez anos sem mudanças significativas, ganhou novo visual.

O Brasil também está cada vez mais afastado dos mercados europeus, assim como os outros mercados emergentes. Em média, os lançamentos brasileiros têm uma defasagem de três anos em relação aos modelos da Europa e dos Estados Unidos, de acordo com Cioffi. As montadoras japonesas conseguem manter um ritmo de lançamento mais próximo das matrizes, com cerca de um ano de defasagem, de acordo com Wong.

"No exterior, principalmente nos Estados Unidos, Europa e países emergentes, o ritmo de lançamento é crucial para a sobrevivência de uma marca. O público exige atualizações mais rápidas e tem dinheiro para pagar pelas novidades. Não é o que acontece no Brasil", disse o sócio da PwC.

A perspectiva para os próximos anos não é nada animadora. "O ritmo de lançamentos deve seguir estável", afirmou o especialista da Kaiser Associates. Este ano, o consumo interno de automóveis deve ser de 1,84 milhão de unidades. Cioffi, da PwC, disse acreditar apenas em reestilizações pontuais dos modelos nacionais.

Uma das saídas apontadas por Cioffi é a intensificação de acordos bilaterais para oxigenar o mercado interno com modelos importados e ampliar o volume das exportações. O especialista apontou o acordo com o México como um bem-sucedido exemplo de parceria. Lá é produzido o Fusion, sedã de luxo da Ford (e exportado principalmente para os EUA). Já o Brasil vende modelos como o Fox, da Volkswagen (lá rebatizado Lupo) e EcoSport, produzido pela Ford em no município de Camaçari (BA), acessíveis ao público mexicano.