Título: Transferir dívidas já tem regras
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2006, Finanças, p. C1

O Ministério da Fazenda concluiu a regulamentação que permitirá aos devedores transferir, sem custos, as suas dívidas bancárias para outro credor, com quem negocie melhores condições de pagamento. A regulamentação, que será divulgada na próxima semana, permite a quitação da dívida com o credor original, sem pagamento de CPMF, pela instituição que passará a deter o crédito renegociado. A medida havia sido decidida no início de setembro, pelo Conselho Monetário Nacional, entre outras iniciativas para aumentar o poder de barganha dos consumidores e facilitar a redução dos custos financeiros.

O governo ainda discute detalhes para a regulamentação de outras três medidas, que, a depender do resultado dessa discussão, poderão até ser abandonadas, ou modificadas, segundo apurou o Valor. São elas o chamado "crédito consignado" para empresas, pelo qual as firmas poderão contratar empréstimos oferecendo contratos de clientes como garantia; a chamada "portabilidade" dos créditos consignados, pela qual devedores poderão mudar de credor mais facilmente; e a "portabilidade" também para empréstimos imobiliários. Essas medidas fazem parte de um conjunto de dez iniciativas do gênero, em análise pelo Ministério da Fazenda e o Banco Central. Ainda não há prazo para o anúncio das que forem escolhidas pelos economistas do governo.

A portabilidade dos créditos consignados, por exemplo, equivale, na prática, a um refinanciamento da dívida, e permitirá um devedor, com empréstimos a juros muito altos, buscar bancos que lhe ofereçam custo menor dos empréstimos e transferir a dívida para esse novo credor, com menor burocracia e sem encargos tributários adicionais. As empresas que participam do sistema mantém contratos com os bancos fornecedores do crédito, garantido por descontos diretos nas folhas de pagamento. A portabilidade poderia criar custos adicionais imprevistos a essas empresas, e esse é um dos empecilhos à mudança.

Os encarregados da discussão sobre as mudanças rejeitam os rumores de que pressões dos bancos poderiam reduzir o pacote de medidas. Eles argumentam que há obstáculos ou implicações jurídicas e de custo para o Tesouro Nacional, que estão sendo levados em conta. No caso da "portabilidade" dos créditos imobiliários, por exemplo, há custos de cartório que terão de ser compensados; no caso do crédito consignado às empresas, há dúvidas sobre o impacto real da medida no mercado.

Também neste semestre será regulamentada a "portabilidade" das contas- salários, pela qual empregados poderão transferir para o banco de sua preferência, sem ônus e burocracia, as contas-salário recebidas em um banco escolhido pelo empregador. Uma parte dos assalariados pode ingressar no ano que vem sem o benefício, porém. Segundo informou ao Valor um graduado integrante da equipe econômica, é possível que as contas-salário hoje mantidas em contrato entre bancos e empregadores (ou por decreto, em caso de governos estaduais e prefeituras) continuem sem o benefício da portabilidade após o prazo determinado para a medida, 1º de janeiro de 2007. A intervenção nesses contratos é um assunto considerado delicado juridicamente, e, no governo, já se admite que se pode chegar até o fim do ano sem solução jurídica. Nesse caso, seria garantida a portabilidade para novos contratos e assalariados sem essa amarra contratual, e o restante ficaria para uma segunda etapa.

Essas iniciativas têm a intenção de aumentar o poder de barganha dos consumidores e estimular a competição entre instituições. O resultado, na avaliação da Fazenda, deverá ser a redução das taxas de risco (os spreads) cobrados sobre empréstimos bancários.