Título: Enfim, BC vai limitar bônus de executivos
Autor: Cristino, Vânia; Batista, Vera
Fonte: Correio Braziliense, 12/11/2010, Economia, p. 14

Manobra utilizada pela diretoria do PanAmericano apressa envio de medidas ao CMN. Alto escalão de instituições é o alvo

O rombo de R$ 2,5 bilhões descoberto no Banco PanAmericano, levado a público na terça-feira, deve obrigar o Banco Central a acelerar o envio ao Conselho Monetário Nacional (CMN) de um conjunto de medidas para regular o pagamento de bônus e outras premiações extras aos diretores e aos executivos de alto escalão das instituições financeiras. A manobra realizada pela antiga diretoria do banco ¿ que permitia que carteiras de crédito vendidas permaneçam contabilizadas como patrimônio ¿ aponta que havia interesse em aparentar uma saúde contábil inexistente na instituição, possivelmente para inflar artificialmente os resultados. Apesar da hipótese ter sido afastada por Silvio Santos, que considera ter havido ¿erro, mas sem má-fé¿, a possível fraude pode parar nos tribunais criminais.

O Banco Central não comenta detalhes da revisão do projeto, colocado em audiência pública entre fevereiro e maio, mas informa que, depois de consideradas as sugestões colhidas no período de consulta, o texto está prestes a ser encaminhado ao CMN, para aprovação. A proposta da autoridade monetária atende aos compromissos assumidos pelo G-20 (grupo dos 20 países mais ricos do mundo) em reunião em abril do ano passado em Londres e setembro, em Pittsburgh, nos Estados Unidos.

O texto original busca alinhar as políticas de remuneração das grandes instituições financeiras a ¿uma prudente filosofia de gerenciamento de riscos¿, reformar a governança corporativa e ¿os padrões de estrutura de remuneração, trazendo ainda recomendações destinadas a elevar a transparência das políticas e práticas de remuneração de administradores e empregados¿.

A proposta cita uma política de remuneração variável que deve levar em conta, entre outros fatores, os ¿riscos correntes e potenciais; o resultado geral da instituição, excluídos os resultados extraordinários; a capacidade de geração de fluxo de caixa e o ambiente econômico e suas tendências¿.

Comitê As instituições passariam a ser obrigadas a criar um órgão estatutário denominado ¿Comitê de Remuneração¿, que será responsável por elaborar a política salarial da instituição, propor ao Conselho de Administração as diversas formas de honorários, fixos e variáveis; supervisionar a implementação e operacionalização da política de remuneração da instituição; e zelar para que essa política esteja permanentemente compatível com a de gestão de riscos, com as metas e a situação financeira atual e esperada da instituição e com o disposto na regulamentação.

Apesar de serem diretamente afetados, os bancos evitam se pronunciar sobre o assunto. Procurada pelo Correio, até mesmo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) não se manifestou. Na época em que a proposta foi colocada em consulta, a entidade afirmou, em nota, que os bônus pagos aos executivos no Brasil eram conservadores, mas prometeu participação ativa na audiência pública.

CVM exige informações » Para alinhar os preceitos de transparência propostos pelo BC com o controle da remuneração extra e contemplar as companhias abertas, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou a Instrução Normativa nº 480, assinada em dezembro do ano passado pela presidente Maria Helena Santana. A medida exige mais informações sobre a remuneração dos administradores das companhias abertas, inclusive a proporção de cada elemento no total dos honorários. As empresas serão obrigadas a informar o maior e o menor salário, além da média por órgão administrativo. Na proposta original da autarquia, cada companhia deveria relacionar o salário dos profissionais da diretoria e do conselho de administração. o Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef), entretanto, entrou com recurso para evitar a publicação dos rendimentos individuais. (LV)

CARTÕES FURADOS

» Vânia Cristino Parte das irregularidades cometidas pelo Banco PanAmericano ocorreu na área do cartão de crédito. A novidade foi contada ontem pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Segundo ele, além do problema detectado nas operações de crédito, no valor de R$ 2,1 milhões, a própria diretoria do Panamericano disse ao BC que tinha problemas envolvendo cerca de R$ 400 milhões nas operações de cartões.

Meirelles disse que o BC não tem detalhes dessas irregularidades. ¿O Banco Central não fiscaliza as empresas de cartão de crédito. Sua jurisdição se limita ao sistema financeiro¿, observou. Depois das declarações de Meirelles o mercado passou a especular o que poderia ser uma prática irregular com cartão de crédito. Uma das hipóteses levantadas é o não repasse às administradoras do montante devido.

Meirelles deu as explicações durante a realização da audiência pública para a prestação de contas do BC à sociedade. Ele procurou tranquilizar o mercado dizendo que o BC não constatou problemas semelhantes aos do Panamericano em outros bancos. ¿A análise feita pelo BC não encontrou nenhuma ocorrência em outras instituições, mas nenhum BC do mundo pode garantir responsabilidades futuras¿, ponderou.

Pressionado sobre se o BC teria ou não que ter avisado a Caixa Econômica Federal de problemas no balanço do Panamericano, antes da efetivação da compra, Meirelles foi taxativo. ¿A resposta é não¿, disse. De acordo com Meirelles não pode haver garantia implícita do governo em instituição privada. Caso o Banco Central fizesse isso ¿ analisasse o balanço dos bancos com o objetivo de garantir a venda ¿, Meirelles disse que haveria um ¿passivo incomensurável, além de risco moral¿.

¿O Sistema Financeiro tem regras prudenciais, é supervisionado pelo Banco Central, mas o BC não substitui processos de gestão, a cargo da diretoria e conselhos das instituições¿, esclareceu. Para Meirelles, o que falhou no Panamericano foi a estrutura de controle da instituição. ¿O Banco Central vai apurar responsabilidades, inclusive das auditorias. Os processos administrativos já estão abertos e punições haverão, se forem devidas¿, assegurou.

Dívida de R$ 42,5 bi » Vera Batista

As irregularidades no Banco PanAmericano provam que é possível o mercado financeiro resolver, sozinho, os seus problemas. Pela primeira vez, a conta de um rombo de grande porte não caiu no cofre do governo, como ocorreu nos anos de 1990 com o Programa de Estímulo à Reestruturação do Sistema Financeiro (Proer), nem prejudicou correntistas e credores, como em 2004, quando Banco Santos foi à bancarrota. Por meio do Proer, o governo liberou recursos para proteger os poupadores e salvar o que restou dos bancos Nacional, Econômico, Bamerindus e Mercantil de Pernambuco. As massas falidas dessas instituições ainda devem ao Banco Central R$ 42,5 bilhões. No caso do Banco Santos, por falta de patrimônio, os clientes ainda lutam na Justiça para receber mais de R$ 2 bilhões.

Justamente por oferecer várias de suas empresas como garantia ao empréstimo de R$ 2,5 bilhões concedido pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), o dono do PanAmericano, Silvio Santos, não viu a instituição ser liquidada pelo BC e nem os seus bens pessoais serem bloqueados. O ex-controlador do Econômico Ângelo Calmon de Sá, por exemplo, seguiu na direção contrária. Perdeu o banco e está até hoje com boa parte de seus bens presos para que os empréstimos do Proer sejam ressarcidos. Calmon de Sá alega, porém, que toda a sua dívida, de R$ 21,4 bilhões, está paga e ele deve ser compensado em mais de R$ 1 bilhão. O mesmo acredita a família Monteiro, ex-dona do Mercantil de Pernambuco, que espera reaver mais de R$ 500 milhões do BC, apesar de a instituição dever R$ 2 bilhões ao Proer.

Os ex-controladores do Econômico e do Mercantil de Pernambuco ¿ que continuam ricos ¿ questionam o BC na forma de correção das dívidas das massas falidas. Alegam que os débitos devem ser atualizados apenas pela variação da TR (Taxa Referencial) ¿ algo entre 1% e 2% ao ano. O BC, no entanto, alega que a correção deve ser feita pelas taxas previstas nos contratos.