Título: Sílvio Santos negocia o PanAmericano
Autor: Cristino, Vânia; Batista, Vera
Fonte: Correio Braziliense, 12/11/2010, Economia, p. 14

Depois de o banco ser flagrado em fraudes de R$ 2,5 bilhões, empresário admite vender as suas ações. A operação tem o aval da Caixa Econômica, sócia na instituição

O controle acionário do Banco PanAmericano já está sendo negociado pelo empresário e apresentador Sílvio Santos. Foi o que sinalizou ontem o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, ao detalhar, em depoimento na Câmara dos Deputados, como foi o processo de socorro à instituição flagrada com uma fraude contábil de R$ 2,5 bilhões. O rombo foi coberto por meio de um empréstimo do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), cujo caixa é formado por contribuições de todos os bancos.

"É plausível pensar que uma das medidas pode ser a venda dessa participação acionária (de Sílvio Santos) para pagar o FGC", disse. Ele ressaltou ainda que esse parece ser o desejo da Caixa Econômica Federal, que arrematou 49% do capital votante do PanAmericano sem se dar conta do rombo nas contas da instituição. "A Caixa começará a executar seu plano de negócio juntamente com o sócio, possivelmente com o novo sócio que entrar no lugar do (atual) sócio controlador", ressaltou.

A possibilidade de venda do PanAmericano movimentou o mercado. A expectativa é de que pelo menos dois dos maiores bancos privados - Bradesco e Santander - se animem em arrematar as ações do PanAmericano que estão em poder de Sílvio Santos. Mas também instituições estrangeiras poderão entrar na disputa, diante do potencial de crescimento da economia brasileira e do crédito. O PanAmericano atende, principalmente, as classes C e D, justamente as que mais estão recorrendo ao crédito para o consumo. As especialidades do PanAmericano são o empréstimo consignado e o financiamento de veículos.

Em meio a essa expectativa, as ações do PanAmericano, que haviam caído quase 30% anteontem, quando as fraudes se tornaram públicas, subiram ontem 4,61%, cotada a R$ 4,99. "É claro que as ações ainda estão longe de recuperar as perdas. Mas já foi um bom sinal", disse um analista. Ele explicou que foram feitos 8.762 negócios, que movimentaram R$ 63,5 milhões. No dia anterior, haviam sido contabilizadas 15.311 operações, totalizando R$ 162,9 milhões.

"Muita gente estava assustada e esperava um desastre. Depois que as notícias começaram a chegar, com a operação de salvamento do PanAmericano, o povo se acalmou", complementou.

Constrangimento Apesar de Meirelles ter assegurado que o BC agiu "a tempo e a hora" para evitar a quebra do PanAmericano, há um desconforto no corpo técnico da instituição. "Mais uma vez, uma fraude ocorreu envolvendo operações de crédito. Já tínhamos visto isso no Nacional, há 15 anos", disse um chateado funcionário da área de fiscalização.

Há também um clima de constrangimento, pois, desde o estouro da crise mundial, em agosto de 2008, o BC apertou a fiscalização sobre os conglomerados financeiros, focando, sobretudo, as carteiras de crédito consignado e de automóveis. A justificativa era evitar os subprimes brasileiros - uma alusão aos créditos imobiliários podres dos Estados Unidos, que desencandearam os problemas que afetam a economia mundial até hoje. Nada, porém, foi pego.

Além das fragilidades do BC, Bernardo Fiaux, analista da Personale Investimentos, ressaltou que há um grande questionamento sobre o papel das empresas de auditoria. "Algo grave aconteceu e nenhuma das empresas (Delloitte e KPMG) viu", observou. Em nota, a Delloitte, primeira auditoria a analisar os ativos do PanAmericano quando a Caixa Econômica se interessou pelo banco, informou que colaborará com as autoridades para o esclarecimento dos fatos e se manifestará quando tirar as suas conclusões do episódio.

O BAÚ DO "SEU SÍLVIO"

Grupo SS administra mais de 40 empresas, entre elas, canais de televisão, instituições financeiras, empreendimentos imobiliários e até um centro cultural. As principais são:

Instituições financeiras Banco PanAmericano PanAmericano Distribuidora de Títulos e Valores Liderança Capitalização Consórcio Nacional PanAmericano PanAmericano Distribuidora de Cartões de Crédito PanAmericano Arrendamento Mercantil Silvio Santos Participações

Seguros PanAmericana de Seguros Perícia Administradora e Corretora de Seguros

Comunicação SBT Internacional Corporation TVSBT Canal 11 do Rio de Janeiro TVSBT Canal 3 de Nova Friburgo TVSBT Canal 4 de São Paulo TVSBT Canal 5 de Belém TVSBT Canal 5 de Porto Alegre TV Studios de Jaú TV Studios de Ribeirão Preto TV Studios de Brasília TV Alphaville Sistema de TV por assinatura

Comércio/Varejo BF (Baú da Felicidade) Utilidades Domésticas Auto Moto Shopping Vimave Promolíder Promotora de Vendas SSF Fomento Comercial PanAmericano Promoções e Vendas

Outros PanAmericano Prestadora de Serviços Sisan Empreendimentos Imobiliários GSS Centro de Serviços Compartilhados SS Comércio de Cosméticos e Prod. de Higiene Pessoal (Jequiti) Hotel Jequitimar Centro Cultural do Grupo Silvio Santos

Fonte: Grupo Sílvio Santos

OLHO GRANDE SOBRE AS EMPRESAS

Gabriel Caprioli

Além da venda do Banco PanAmericano, considerada como certa pelo mercado e pelo próprio Banco Central, o empresário Sílvio Santos deve considerar nos próximos dias ofertas pelas companhias (mais de 40) que compõem o grupo comandado por ele. Dois dias depois do anúncio do megafinanciamento de R$ 2,5 bilhões tomado no Fundo Garantidor de Crédito (FGC) para cobrir fraudes contábeis, a primeira demonstração de interesse veio do empresário Eike Batista. O dono do grupo EBX afirmou ontem que está atento a eventuais oportunidades que possam surgir com a venda de parte do grupo Silvio Santos, especialmente o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT). Mais tarde, o mesmo Eike negou, via Twitter, interesse pelo canal de tevê, mas reafirmou que "avalia todas as oportunidades de negócios". O SBT também estaria sendo visado pelo Grupo Abril.

A venda de ativos será necessária para que Sílvio Santos pague o empréstimo para tapar o rombo contábil descoberto no banco. Analistas acreditam que a empresa mais fácil de ser vendida é o PanAmericano. "Depois do empréstimo do FGC e da mostra de disposição em sanear as contas, o banco voltou a ser bastante interessante", avaliou Ricardo Teixeira, professor do FGV Management e especialista em gestão empresarial.

Um segundo conjunto de empresas que deve despertar a atenção dos investidores é o dos emblemáticos Baú da Felicidade e Liderança Capitalização, que administra a Tele-Sena. "Os empresários já perceberam há alguns anos que as classes C e D são o caminho para a ampliação dos negócios, desde que a renda e o emprego foram reforçados. Portanto, vão aparecer interessados em ingressar ou aumentar sua atuação nesse nicho", afirmou Teixeira.

Sílvio Santos rejeitou em um primeiro momento vender as empresas de comunicação do grupo, mas, de acordo com o professor, pode considerar a hipótese, dependendo da oferta. Outra forma de honrar a dívida feita com o FGC sem dilapidar todo o patrimônio empresarial e pessoal é arquitetar um planejamento financeiro que diminua o impacto da dívida. "Silvio Santos é um empresário experiente. Deve, em princípio, utilizar a carência de três anos do empréstimo e vender apenas parte do grupo", avaliou. O financiamento do FGC tem prazo de 10 anos e carência de três para as primeiras prestações.

O valor estimado das empresas do grupo (R$ 2,7 bilhões) é um pouco superior ao crédito obtido no FGC, mas a retomada do preço das ações do PanAmericano na BM&FBovespa deve facilitar a devolução do empréstimo.

Consumidor protegido O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) informa que o rombo descoberto no PanAmericano não deve prejudicar os clientes da instituição. "A fraude contábil de R$ 2,5 bilhões não deverá acarretar prejuízos diretos aos consumidores, uma vez que a instituição atua apenas na oferta de crédito e não possui o segmento de conta-corrente", assinala o órgão. O Idec ressalta ainda que não há nenhum impedimento àqueles que desejarem fazer um novo empréstimo, desde que sejam observadas as recomendações para qualquer financiamento: pesquisa e comparação das melhores taxas de juros.

LIVRE POR UM TRIZ

A Caixa Econômica Federal livrou-se por pouco de ter que arcar com parte do empréstimo de R$ 2,5 bilhões ao Banco PanAmericano, do empresário Silvio Santos. A Caixa fechou a compra de parte do banco no final no fim do ano passado, mas só entrou efetivamente no seu controle, inclusive participando da nova diretoria, depois que o Banco Central aprovou a operação, quando as fraudes contábeis já tinham sido detectadas pela autoridade monetária.

"Não tem responsabilidade solidária da Caixa", garantiu ontem presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, durante audiência na Câmara dos Deputados. O presidente do BC explicou para os parlamentares que o banco público só estaria envolvido caso já tivesse tomado posse no PanAmericano anteriormente à descoberta da maquiagem em seu balanço. Dos oito novos diretores, cinco foram indicados pela instituição federal esta semana. Se já estivesse participando da gestão, o banco público poderia não só ter que bancar parte dos recursos, como também ver seus funcionários investigados.

Meirelles contou aos deputados que o BC já fez a comunicação ao Ministério Público Federal sobre a suspeita de PanAmericano estar envolvido em fraudes. Diretor de Fiscalização, Alvir Hoffmann explicou que o BC não citou nomes. Apenas indicou indícios de crime contra o sistema financeiro praticado na gestão da instituição, conforme determina a Lei do Colarinho Branco. (VC)