Título: Perspectivas para 2013 favorecem o kirchnerismo
Autor: Felício , César
Fonte: Valor Econômico, 24/08/2012, Internacional, p. A13

A conjuntura externa poderá socorrer a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, no próximo ano, estratégico em termos políticos, em função da eleição de um terço do Senado e de metade da Câmara dos Deputados. A seca nos EUA e o bom ritmo de chuvas no país deve manter o mercado de commodities agrícolas aquecido em uma safra em que a Argentina poderá ter 15 milhões de toneladas de soja a mais para vender.

As perspectivas econômicas do Brasil também são vistas com atenção tanto por analistas vinculados ao governo quanto por consultores independentes. As projeções do mercado brasileiro de um crescimento do PIB da ordem de 4% no próximo ano, mais que o dobro em relação ao que deve ser obtido neste ano, devem reaquecer o setor automotivo argentino, único setor exportador de alto valor agregado no segmento industrial.

Cristina ainda conta com outro alívio no setor externo: em 2013 a dívida em dólar com o setor privado a ser liquidada será de US$ 4,5 bilhões, ou menos de 1% do PIB, um nível de desendividamento que o país não vive há cerca de 40 anos. É a chave para o governo liberar o controle sobre as importações que lançou o setor industrial em uma retração neste ano.

Segundo dados divulgados ontem pelo Indec, o instituto oficial de estatísticas, a atividade industrial recuou em julho 1,8% em relação ao mesmo mês de 2011 e 1,2% nos primeiros sete meses do ano.

As análises que projetam um 2013 alentador para a Argentina graças à conjuntura externa sempre fazem uma ressalva: todas as variáveis mudam caso a União Europeia entre em colapso, com a saída de um ou mais países da zona do euro. "A crise não terminou. O cenário da Europa é recessivo e não permite otimismo a curto prazo, o que impacta os preços internacionais", disse o economista Ricardo Delgado, da empresa de consultoria Analytica.

"Poderemos ter 5% de crescimento do PIB em 2013", disse o economista Miguel Bein, na última projeção de cenários que sua consultoria divulgou para o mercado. Não se trata de um governista: Bein foi secretário de política econômica em 2000, na ortodoxa gestão de José Luiz Machinea, ministro da Economia no governo de Fernando de la Rúa.

De acordo com Bein, a Argentina poderá obter uma receita adicional de US$ 10 bilhões com as exportações de soja no próximo ano. Neste ano, a Argentina não pôde se beneficiar do aumento da cotação da tonelada do produto da ordem de 25% ao longo dos últimos meses porque a estiagem fez com que 20% da safra fosse perdida. "As importações terão uma folga para crescer 16% e a reativação do Brasil pode garantir um crescimento industrial de 4%", afirmou.

Opiniões como a de Bein encontram eco no exterior. "O resultado recessivo do segundo trimestre deste ano parece ter sido o fundo do poço", comentou o analista Boris Segura, da consultoria de investimentos inglesa Nomura Securities, em relatório a seus assinantes. Segura prevê uma recessão de 0,5% neste ano, mas uma expansão do PIB de 4% no próximo ano, com forte demanda brasileira no setor automotivo.

"Cada ponto percentual de crescimento do Brasil significa 3,5 pontos percentuais a mais nas exportações argentinas, o que pode proporcionar em 2013 um incremento de US$ 3 bilhões", disse Jorge Vasconcelos, pesquisador chefe da Fundação Mediterrânea, um centro empresarial de estudos.

As dificuldades internas, entretanto, poderão ser um limitador caso Cristina queira ser uma protagonista da recuperação econômica. "O gasto público já está em 45% do PIB e qualquer expansão é anulada do ponto de vista do crescimento econômico por mais emissão monetária e mais inflação", disse Vasconcelos. (CF)