Título: Conta salário afeta venda de Besc e BEP
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 09/10/2006, Finanças, p. C1

A nova conta salário, aprovada no mês passado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), cria mais uma dificuldade para a venda dos dois antigos bancos estaduais - hoje federalizados - que estão na fila de privatização, o de Santa Catarina e o do Piauí.

O principal ativo desses bancos é justamente a administração da folha de pagamento do funcionalismo dos Estados e de suas empresas. A privatização ainda não havia sido tocada porque há resistências políticas, sobretudo em Santa Catarina, e porque o Tesouro e o Banco Central negociavam com os Estados os contratos para manter o pagamento do funcionalismo nos bancos.

Com a nova conta salário, porém, os bancos perdem poder de mercado perante os clientes nos novos contratos que forem assinados a partir da resolução do CMN ou naqueles que forem renovados ou sofrerem alteração.

Os bancos deverão garantir isenção de tarifas para quem quiser sacar o salário na boca do caixa. Também vão ter que garantir a transferência automática e gratuita dos recursos para uma conta corrente apontada pelo cliente, no próprio banco em que ele recebe salário ou em uma instituição financeira concorrente.

O BC informou que ainda está fazendo a avaliação dos impactos da mudanças na legislação das contas salários, e que não irá se pronunciar enquanto não concluir esse trabalho.

Embora a nova conta salário retire parte do poder de mercado dos bancos, porém, não é esperado que ele seja completamente eliminado. No início da década de 1990, foi concedido aos funcionários públicos federais o direito de escolher o banco em que querem receber os salários, até então pago pelo Banco do Brasil. A instituição manteve, entretanto, a maior parte dos funcionários, e hoje responde por uma fatia de cerca de 90% do mercado.

A tendência é que, mesmo com as mudanças nas contas salários, os bancos que administram as folhas de pagamento do funcionalismo tenham vantagens para manter a clientela. Uma delas é a possibilidade de, diante do avanço de outros bancos, oferecer condições mais vantajosas para os clientes, cobrindo a oferta dos concorrentes.

Outra vantagem dos bancos estaduais na sua disputa pelos funcionários públicos é que sua rede de agências foi, em grande parte, desenhada para atender esse segmento da clientela. O BB, por exemplo, manteve a liderança de mercado graças a investimentos pesados em atendimento. Concorrentes que porventura resolvam disputar esse nicho teriam que fazer grande investimento em ativos fixos para tomar mercado dos antigos bancos estaduais.

Os bancos de Santa Catarina e do Piauí são as duas últimas instituições financeiras socorridas pelo Programa de Incentivo à Redução do Setor Público no Sistema Financeiro Nacional (Proes) que aguardam privatização. O Tesouro concedeu empréstimos, com juros subsidiados, com o compromisso de que eles fossem privatizados ou extintos. No banco de Santa Catarina (Besc), a injeção foi de R$ 2,019 bilhões; no do Piauí (BEP), de R$ 145,88 milhões.

Em 2002, chegaram a ser lançados editais para a privatização desses dois bancos, mas o processo acabou suspenso dentro da disputa eleitoral daquele ano. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então candidato à Presidência, assumiu o compromisso de não vender o banco, juntamente com o governador Luiz Henrique (PMDB), então seu aliado. Neste ano, os compromissos foram renovados, embora estejam em palanques diferentes.

O governo de Santa Catarina chegou a ameaçar, neste ano, com a retirada do pagamento do funcionalismo do Besc. O BC sustenta, porém, que o Estado está obrigado a mantê-las até que seja concluída a privatização.

No Piauí, o governador Wellington Dias (PT), reeleito, também impunha restrições à venda. Isso não impediu que ele abrisse negociações com o Tesouro uma solução para a venda do banco, que envolveria a transferência de recursos para o Estado e a abertura de uma instituição financeira de fomento. Em troca, o Estado manteria o pagamento dos funcionários no BEP.