Título: Setor de máquinas vê riscos na abertura
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 10/10/2006, Brasil, p. A3

Newton de Mello, diretor da Mello S. A. Máquinas e Equipamentos, tomou um susto ao negociar a venda de suas retificadoras para o México. Ao conversar com o distribuidor mexicano, descobriu que a máquina pagaria apenas 3,6% de tarifa de importação para entrar no país, ao contrário dos usuais 20%. A retificadora - utilizada na fabricação de moldes para as indústrias de embalagem, autopeças, entre outras - estava na lista dos produtos beneficiados com alíquotas menores em um acordo firmado entre Brasil e México.

Mas o que seria uma boa surpresa logo se transformou em desvantagem. O distribuidor também informou ao empresário que uma companhia espanhola, uma de suas principais concorrentes no mercado internacional, exportava a mesma máquina sem pagar qualquer tarifa. A Espanha também possui um acordo de redução de taxas de importação com o México, só que nesse caso mais favorável do que o selado com o Brasil. Resultado: o distribuidor pediu mais um desconto à empresa brasileira para compensar o prejuízo.

É no dia-a-dia do comércio exterior que os fabricantes de bens de capital, tradicionalmente avessos aos acordos internacionais e à abertura da economia que eles proporcionam, estão descobrindo que é necessário mais agressividade nas negociações.

Para que os associados se orientem melhor no emaranhado de acordos na hora de exportar e para fazer um lobby mais efetivo junto aos órgãos governamentais, a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) encomendou um amplo estudo da consultoria Ecostrat sobre o tema. Em 144 páginas, o estudo, ao qual o Valor teve acesso, conclui que a abertura da economia ainda é um risco para o setor de bens de capital, que pode assistir a produção doméstica ser substituída por importações, mas aponta oportunidades em alguns mercados. Exemplos: México, África do Sul e Índia, embora o país asiático seja visto como uma "incógnita" pelas empresas.

A avaliação geral do estudo é que os países desenvolvidos, principalmente União Européia e Japão, representam sério risco, enquanto os países em desenvolvimento podem significar bons lucros. É um diagnóstico em linha com a política externa adotada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que privilegia as relações com os países pobres, embora seja pouco eficaz em efetivamente aumentar o comércio.

Maior consumidor de máquinas brasileiras no exterior, os Estados Unidos absorveram US$ 1,8 bilhão em bens de capital mecânicos do Brasil entre janeiro e agosto deste ano, quase 30% das exportações totais do setor. A percepção dos EUA como ameaça ou oportunidade varia conforme o segmento em que a empresa atua.

Newton de Mello, que também preside a Abimaq, é um entusiasta do comércio com os americanos. Ele acredita que a relação com os EUA é de complementaridade, já que o Brasil exporta máquinas mais simples e importa dos americanos equipamentos mais sofisticados. "O equilíbrio é fantástico", diz, ressaltando que o Brasil importou US$ 1,8 bilhão dos EUA entre janeiro e agosto.

O empresário não descarta um acordo de livre comércio com os americanos - uma espécie de Área de Livre Comércio das Américas (Alca) do setor de bens de capital. "Se perdermos o SGP, teremos que partir para o acordo", diz Mello, referindo-se a uma das principais preocupações do setor hoje. Os EUA estão ameaçando excluir o Brasil do Sistema Geral de Preferências (SGP), que permite a importação de diversos produtos de países pobres com tarifa zero. No Brasil, o setor de bens de capital é o que mais utiliza o mecanismo.

A conclusão da Ecostrat é mais pessimista. A consultoria identificou os produtos que o Brasil é competitivo para exportar para os EUA e concluiu que existe um mercado de US$ 15 bilhões no país. No entanto, a avaliação é que as tarifas praticadas pelos americanos são baixas e que o Brasil já possui "market share" elevado em alguns produtos. Portanto, aproveitar essas oportunidades pode ser tarefa árdua.

Para o México, o diagnóstico do estudo é distinto. Como é um país protegido por altas tarifas de importação, os acordos bilaterais podem determinar a competitividade dos fornecedores. O estudo apontou 44 produtos em que o Brasil pode ser competitivo no México, que representam um significativo mercado de US$ 3,5 bilhões por ano de máquinas e equipamentos. A participação do Brasil é de apenas 2%. Entre janeiro e agosto, o Brasil exportou US$ 368 milhões em máquinas e equipamentos para o México, quarto principal destino das vendas do setor no mercado externo. Em relação a igual período de 2005, as exportações caíram 6,3%. Mello credita o fraco desempenho à valor do real. "Os acordos comerciais podem ser uma forma de compensar essa perda de competitividade", diz.

A África do Sul representa uma pequena fatia das exportações brasileiras de máquinas. Entre janeiro e agosto, foram enviados US$ 90 milhões pelo setor ao país, ou 1,45% das exportações totais. "É um país promissor para o Brasil, já que os padrões de desenvolvimento são parecidos", avalia Mello. Segundo a Ecostrat, a África do Sul importa cerca de US$ 830 milhões por ano em produtos que o Brasil é competitivo no segmento de máquinas, montante significativo para um país em desenvolvimento. Os fabricantes brasileiros representam apenas 2,2% das importações, por conta da forte presença da Ásia e da Europa. "Um acordo bilateral pode nos ajudar", diz Mello.

Na Índia, as importações das máquinas no segmento em que o o Brasil é competitivo somam apenas US$ 577 milhões, um mercado inferior ao da África do Sul. O "market share" do Brasil é reduzido, apenas 1,4%. Nesses produtos, os indianos aplicam a tarifa de importação média de 25%, a maior entre todos os países analisados. De janeiro e agosto, o Brasil exportou para a Índia apenas US$ 49 milhões em máquinas, e recebeu a metade, US$ 24 milhões. Segundo Mello, a Índia possui uma indústria de máquinas e equipamento significativa, mas, por enquanto, voltada a atender o mercado interno. Nada garante, no entanto, que a Índia não incomode a concorrência mais tarde no mercado internacional. "A Índia é uma incógnita para o setor", diz Mello.