Título: Crédito cresce a taxa sustentável, diz BC
Autor: Travaglini , Fernando
Fonte: Valor Econômico, 31/08/2012, Finanças, p. C3

O ritmo de expansão do crédito divulgado ontem, de 17,7% nos últimos doze meses, está bem próximo do que seria a taxa de equilíbrio para a economia brasileira do ponto de vista do Banco Central, na casa dos 16%. A estimativa está em um estudo publicado no site da autoridade monetária e que tem entre seus autores o diretor de regulação do BC, Luiz Awazu Pereira da Silva.

De acordo com o trabalho, que também é assinado pela chefe do Departamento de Estudos e Pesquisas do BC, Adriana Soares Sales, e por Wagner Piazza Gaglianone, também do banco, o crédito no Brasil cresceu de forma significativa nos últimos anos, mas hoje apresenta um "ritmo sustentável" de expansão, ao contrário de outros países como Estados Unidos e Europa, que passam por processo de redução da alavancagem.

O cálculo para se chegar aos 16% leva em conta o que eles chamam de hiato da razão crédito/PIB. A medida é semelhante ao que os economistas chamam de hiato do produto, indicador que tenta mostrar a diferença entre o desempenho da economia e o seu potencial.

No caso do crédito, o raciocínio é o mesmo, indicando se a expansão está acima ou abaixo de um nível ótimo de equilíbrio - resultado esse obtido com uma série de cálculos econométricos.

Como esse hiato no Brasil hoje está próximo de zero, a conclusão é que o atual ritmo de expansão do crédito é "sustentável", ou seja, não leva a um risco para a estabilidade do sistema financeiro.

No caso dos Estados Unidos e da Europa, citados no estudo, esse gap mostra um amplo espaço para crescimento. Isso indica ainda que o sistema bancário no Brasil funciona de forma não sincronizada com essas regiões, o que é positivo neste momento de turbulências.

O estudo, chamado "Estabilidade Financeira no Brasil" ("Financial Stability in Brazil"), tem um objetivo ainda mais amplo, de criar definições para os termos "estabilidade financeira" e "risco sistêmico" - algo que não existe na maioria dos países.

Segundo os autores, um sistema financeiro é estável quando desenvolve suas funções de forma contínua através do tempo e sem riscos para o sistema. Além disso, a estabilidade deve resistir a choques "normais", voltando ao seu padrão anterior. Já o risco sistêmico é medido como a probabilidade de ruptura dos serviços financeiros.

A partir dessas definições, é possível encontrar indicadores para acompanhar essas duas condições no caso do sistema financeiro brasileiro. A principal medida seria a da expansão do mercado de crédito, visto como o mais importante elemento de estabilidade financeira.

Além desse, outros indicadores descritos pelo estudo são a liquidez do sistema, identificada como superior, hoje, em relação aos EUA e à Europa; e a interconectividade entre as instituições financeiras. As 25 maiores instituições brasileiras são responsáveis por 90% das transferências do sistema financeiro, enquanto as oito maiores bancos concentram 76% da movimentação. Esses níveis são considerados adequados. O país também tem ainda uma das menores exposições a linhas externas do mundo, entre outros indicadores abordados na análise.

Como mostra o trabalho, os indicadores mudaram ao longo dos últimos anos. A liquidez, por exemplo, se mostrou um problema após a crise de 2008, superando a alavancagem, que assustava anos antes em decorrência da forte expansão do crédito.

A partir desses dados, que podem ser acompanhados pelo regulador, é possível calcular a "probabilidade de ruptura do sistema financeiro" ao longo do tempo, importante instrumento para a autoridade monetária.

O estudo avalia que essa medida poderia ser usadas pelo Comitê de Estabilidade Financeira do BC - com um nível pré-estabelecido de tolerância para a "estabilidade financeira". Isso permitiria determinar o exato momento em que o conjunto de adequadas políticas e medidas macroprudenciais devam ser ajustadas e fortalecidas.

No trabalho, os autores apontam que a probabilidade de ruptura (a partir de patamares definidos apenas para o estudo) chegou a 69% no último trimestre de 2008, recuando para 9% no fim de 2010 e voltando a subir marginalmente no ano passado. "Vale notar que apesar de uma volta de alguns fatores de risco no fim de 2011, o indicador continua em níveis baixos nos últimos trimestres", concluem os autores. Essa condição, ressaltam, resulta das melhores condições dos fundamentos da economia e das políticas macroeconômicas e "claramente contrasta com o observado décadas atrás".