Título: Escritor turco vence o Nobel de Literatura
Autor: Borges, Robinson
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2006, Internacional, p. A11

O binômio política-literatura sempre sensibilizou os votantes do Prêmio Nobel de Literatura. Neste ano, a escolha do turco Orhan Pamuk, divulgada ontem, não fugiu da tônica de boa parte dos últimos laureados. No ano passado, o vencedor foi o dramaturgo Harold Pinter, crítico da participação de seu país, o Reino Unido, na guerra do Iraque. Em 2004, a escolhida foi a inexpressiva Elfriede Jelinek, ferrenha opositora dos políticos conservadores da Áustria. Em 2000, o chinês Gao Xingjian, "persona non grata" em Pequim. E, em 1997, o anarquista italiano Dario Fo.

Nascido em Istambul, em 1952, Pamuk conquistou a crítica literária por sua prosa lírica, organicamente estruturada para costurar histórias a respeito do choque de civilizações. Seus romances exploram não apenas as diferenças radicais entre Ocidente e Oriente, como também os sentimentos dos que vivem essa divisão.

Em "Meu Nome é Vermelho", lançado no Brasil em 2004 pela Companhia das Letras, Pamuk alia trama policial, amor proibido e reflexões sobre as culturas ocidentais e orientais. Construída por narradores múltiplos, como um cachorro, um cadáver e o pigmento, cuja cor dá nome ao livro, a história, para boa parte da crítica internacional, é uma ode ao estilo. O júri do Nobel reconheceu tais recursos. Com o anúncio de seu nome, a Academia sueca justificou a escolha: "Na busca pela alma melancólica de sua cidade natal, descobriu novos símbolos para o combate e a mistura de culturas".

Neste mês, a Companhia das Letras vai lançar outro livro do autor, intitulado "Neve", que segue a mesma toada. Segundo Pamuk, esse é "seu primeiro e último romance político". O livro conta a história de um poeta exilado na Alemanha, que viaja a uma pequena cidade turca sob o pretexto de investigar a onda de suicídios entre jovens muçulmanas que assola o vilarejo.

O requinte literário de Pamuk, entretanto, pode ser ofuscado por suas posições políticas. Mais que por suas palavras habilmente escritas, são suas declarações que têm chamado a atenção. Por comentar o genocídio de armênios e curdos - temas tabus na Turquia -, em entrevista a um jornal suíço, o escritor chegou ir aos tribunais.

Ao se considerarem as últimas escolhas do Nobel, que tem privilegiado autores em confronto com seus países - Pinter, Elfriede, Xingjian -, a premiação de Orhan Pamuk soa mais como uma opção política. Mas a polêmica é antiga. Em seu livro "The Nobel Prize: A History Of Genius" (O Prêmio Nobel: A História de Gênios), Burton Feldman comenta que "os comitês dos prêmios políticos e de literatura nem sempre aprovam seus laureados em coro. Os premiados de países periféricos podem se tornar heróis da noite para o dia pela vitória, mas podem ser vítimas de alvos políticos e ideológicos".

De acordo com Horace Engdahl, secretário da Academia Sueca, os ataques às escolhas não são pertinentes. Para ele, não há intenção política nas escolhas, mas sempre há interpretações políticas.

O Nobel de Literatura concede 10 milhões de coroas suecas (1,1 milhão de euros, ou US$ 1,35 milhão) ao ganhador e será entregue em 10 de dezembro, aniversário da morte de Alfred Nobel, fundador dos prêmios.