Título: Contas não melhoram e cresce temor de que Portugal pedirá mais auxílio
Autor: Wise , Peter
Fonte: Valor Econômico, 27/08/2012, Internacional, p. A10

Quando os líderes de Portugal estiverem reunidos com credores internacionais nesta semana, para negociar um pacote de ajuda financeira de € 78 bilhões para o país, o principal ponto da agenda será como compensar a perda de receita fiscal que tornou impossível atingir a meta de déficit fiscal para este ano.

Os mais recentes dados orçamentários mostram que a receita fiscal está € 2,8 bilhões abaixo da meta, tendo caído 3,5% nos primeiros sete meses de 2012 em comparação ao mesmo período do ano passado, renovando os temores dos analistas de que Lisboa poderá precisar de um segundo socorro.

"Não é uma questão que pode ser respondida com 100% de convicção, mas tendo a duvidar que Portugal conseguirá retornar aos mercados de capital no ano que vem [conforme pretendido]", disse na sexta-feira Jörg Krämer, economista-chefe do Commerzbank da Alemanha.

Quando os números foram ajustados para os efeitos das medidas emergenciais, os dados mostraram que o país não avançou nada na redução do déficit fiscal neste ano, disse ele. Isso não vai melhorar a confiança dos investidores de que os portugueses conseguirão retornar aos mercados em 2013.

O governo de coalizão de centro-direita de Portugal vem insistindo que não precisará solicitar aos seus emprestadores internacionais - a troica formada pela União Europeia, Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Central Europeu (BCE) - uma ajuda financeira adicional ou mais tempo para pagar suas dívidas.

Mas muitos economistas temem que Portugal não conseguirá cumprir suas metas de consolidação fiscal ou fazer a economia crescer o suficiente para restabelecer a confiança internacional e retomar as emissões de bônus do governo de longo prazo até setembro do ano que vem, como planejado em seu acordo de ajuda financeira.

Um funcionário do Ministério das Finanças disse que a possibilidade de o país não atingir a meta de déficit para 2012, ou introduzir novas medidas fiscais, será discutida com os representantes da troica nas negociações agendadas para esta semana sobre os progressos de Lisboa no acordo de resgate.

"Não podemos esperar a recuperação de toda a queda de receita fiscal, embora uma parte dela possa ser compensada por economias no lado dos gastos... Ao proceder com o que planejamos, chegar ao fim do ano com um déficit de 4,5% do PIB está ficando mais difícil", disse o funcionário do Ministério das Finanças.

Em termos de reformas bem-sucedidas, analistas descrevem Portugal como posicionado em algum lugar entre a Irlanda e a Grécia, os dois outros países da zona do euro que negociaram pacotes nacionais de ajuda financeira. Recentemente, o governo irlandês conseguiu recorrer aos mercados de capital com uma emissão de bônus cerca de um ano antes do programado. Mas Krämer disse que "tal sucesso é improvável no caso de Portugal".

Enquanto a Grécia pressiona a Alemanha e a França por mais tempo para implementar as reformas, Pedro Passos Coelho, o primeiro-ministro de Portugal, descartou um pedido similar e já prometeu que a economia portuguesa vai se "estabilizar" em 2013, depois de dois anos consecutivos de recessão.

Mas Lisboa enfatizou que a Comissão Europeia e o FMI se comprometeram em continuar apoiando Portugal se "circunstâncias além do controle do governo" tornarem impossível um retorno aos mercados no ano que vem.

Ao comentar, em julho, as metas de déficit de Portugal, Abebe Aemro Selassie, chefe da missão do FMI para Portugal, disse que o Fundo mantém a cabeça aberta ao estabelecer as metas. "Elas não são lavradas na pedra e são revistas para termos certeza de que são consistentes com os acontecimentos econômicos", disse ele.

O fato de a Comissão Europeia ter permitido à Espanha aumentar duas vezes sua meta para o déficit fiscal para este ano sugere que a troica poderá também mostrar flexibilidade em relação a Portugal. Lisboa progrediu no aumento da competitividade dos preços, liberando as negociações salariais e vem cortando os gastos no setor de serviços públicos. Mas isso não tem sido suficiente para compensar a economia fraca, que deverá contrair pelo menos 3% este ano.

Líderes empresariais dos setores automobilístico e de combustíveis, e outros, vêm criticando o governo por ele não dar atenção aos alertas de que aumentos excessivos no imposto sobre valor agregado e outros tributos irão reduzir o consumo, ao mesmo tempo em que não conseguirão aumentar a receita fiscal.

Helder Pedro, presidente da associação que representa o setor automobilístico, disse que as vendas de automóveis caíram 43% nos primeiros sete meses do ano, a maior queda no âmbito da União Europeia. Pedro disse que isso é reflexo de um aumento "brutal" dos impostos sobre as vendas de veículos e da escassez de crédito bancário.