Título: Dívida "adia" fim da crise no Centro-Oeste
Autor: Rocha, Alda
Fonte: Valor Econômico, 09/01/2007, Agronegócios, p. B10

A previsão de um ano mais favorável para os grãos em 2007 - devido à recuperação dos preços internacionais e aos custos menores de produção - não significa o fim da crise que golpeou o setor no país a partir da safra 2004/05.

Estudo da Agroconsult contemplando o período de 2007 a 2011 estima que a geração líquida de caixa do setor de grãos no país deve melhorar este ano, alcançando R$ 26,4 bilhões enquanto as dívidas totais devem somar R$ 20,3 bilhões. Em 2011, a geração de caixa deve ser de R$ 35,7 bilhões para um total de dívidas de R$ 8 bilhões.

Para chegar aos números de receita e dívidas, respectivamente, a Agroconsult levou em consideração o cenário de produção e preços para as principais lavouras e as dívidas que vencem nos próximos cinco anos. Nesses débitos, estão incluídas as dívidas dos produtores referentes às safras 2004/05 e 2005/06 junto a fornecedores de insumos e tradings, não pagas até 30 de setembro passado ou renegociadas, dívidas de custeio mais FAT, investimentos, fundos constitucionais e Tesouro Nacional.

Os números totais do Brasil estimados pela Agroconsult indicam que o setor de grãos deve ter fôlego para fazer frente às dívidas até 2011, mas o quadro muda quando são analisados os Estados separadamente. "Os efeitos nocivos da crise se prolongarão até 2011", pondera o diretor da Agroconsult. A situação é mais grave no Centro-Oeste, que enfrentou aumento de endividamento e preço e câmbio desfavoráveis nos últimos dois anos. O Mato Grosso é o Estado que deve demorar mais a se recuperar, segundo o estudo.

"No Mato Grosso, a geração de caixa não é suficiente para fazer frente a todas as dívidas", afirma André Pessôa, sócio-diretor da Agroconsult. No Estado, a geração líquida de caixa deve ser de R$ 1,5 bilhão este ano, e os débitos estão estimados em R$ 4,3 bilhões. Para o ano que vem, a previsão é de "empate", em R$ 2 bilhões. Em 2009, a geração de caixa sobe para R$ 2,7 bilhões e as dívidas devem somar R$ 1,7 bilhão. Para 2010, a previsão é de um caixa de R$ 3 bilhões e débitos de R$ 1,4 bilhão. Finalmente, em 2011, a Agroconsult estima uma geração de caixa de R$ 3,2 bilhões e dívidas de R$ 1,2 bilhão.

Com esse desempenho, o Mato Grosso só conseguirá fazer frente às dívidas em 2011, observa Pessôa. É que só então o saldo de geração de caixa acumulado - R$ 12,3 bilhões - será superior às dívidas acumuladas, de R$ 10,6 bilhões.

Diante desse quadro no Mato Grosso, o consultor defende intervenção do governo, como o alongamento de dívidas de investimento, para "acelerar o processo de recuperação" no Estado. Ele reconhece que a recuperação virá, mesmo sem intervenção, em algum momento, mas uma das consequências deve ser a concentração da atividade. O motivo é que em períodos de crise a tendência é que produtores mais capitalizados assumam negócios dos mais endividados, o que já se viu nesta safra.

A recuperação também deve ser mais lenta nos demais Estados do Centro--Oeste e no cerrado do Nordeste, prevê a Agroconsult, mas o quadro é mais favorável no Sul do Brasil. "Algumas regiões já poderão voltar a investir e a crescer este ano", avalia o consultor. No Paraná, por exemplo, a geração líquida de caixa no setor de grãos deve ser R$ 4,9 bilhões este ano, para uma dívida de R$ 2,5 bilhões, segundo a Agroconsult. A previsão é que em 2011, o caixa alcance R$ 6,6 bilhões para um débito estimado de R$ 1 bilhão. "A conclusão [dos números] no Paraná é que não é preciso prorrogar mais nada", afirma André Pessôa.

Ele defende que eventuais apoios do governo a produtores de regiões com mais dificuldade para solucionar a crise não devem ser estendidos "automaticamente" às regiões com menos dificuldade.