Título: GM e Ford tentam revigorar imagem no salão de Detroit
Autor: Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 05/01/2007, Empresas, p. B5

Em janeiro de 2006, durante o salão de Detroit - cidade que ainda leva o apelido de capital do automóvel - , General Motors e Ford pareciam mais do que nunca à beira da bancarrota. A edição da mesma feira este ano, aberta domingo para a imprensa e quarta-feira para o público, encontrará ambiente mais calmo. A crise financeira das americanas está longe de acabar. Mas, depois de reconhecer que estavam no caminho errado, GM e Ford começam a desviar a gestão para a rota de sucesso dos japoneses e devem receber com humildade a chegada de um ano que deve consagrar a vitória da Toyota.

Detroit está sempre em festa em janeiro. É na cidade onde Henry Ford inventou a linha de montagem, há mais de um século, que os americanos não se cansam de fazer show em torno de seus carros, apesar de os incentivos fiscais e a mão-de-obra livre do domínio do poderoso UAW, o sindicato dos trabalhadores da indústria automobilística, terem feito a produção de veículos dos Estados Unidos migrar para o Sul do país nos últimos anos.

Apesar dos apelos históricos, as atenções do salão de Detroit mais uma vez estarão voltadas para o que têm a dizer os asiáticos. As notícias são boas. Em 2006, as vendas da Toyota nos Estados Unidos cresceram 12,5%. O resultado foi o melhor entre todas as montadoras do país que mais produz e vende automóveis em todo o planeta.

A fabricante japonesa de veículos ultrapassou a americana Chrysler, a marca do grupo DaimlerChrysler, para ocupar a terceira posição nos EUA. Em alguns meses chegou a ultrapassar a Ford e as projeções dos analistas indicam que não falta muito para a empresa japonesa roubar a liderança da gigante GM.

O analista brasileiro Richard Dubois, diretor da ATKearney e pesquisador da indústria automotiva, prevê que a Toyota chegará ao primeiro lugar já em 2007. Ao mesmo tempo, diz ele, este será um ano diferente para as montadoras americanas, que assumiram uma nova postura. "Passou aquele medo de que essas empresas poderiam quebrar ou recorrer ao capítulo 11 (de falência na lei americana). As montadoras americanas perceberam que tinham mesmo que encolher e resolveram tocar o barco até conseguirem fazer o tipo de carro que o consumidor quer agora", afirma.

Para Dubois, a indústria americana sentiu o momento de mudar quando o consumidor percebeu que ela não tinha o produto adequado à mudança dos tempos, em que a ordem é economia de combustível e redução de emissões de poluentes.

Os fabricantes dos carros beberrões foram punidos pelo próprio mercado . "Porque o consumidor americano mostrou que prefere cuidar do planeta do que o seu próprio país", afirma Dubois. Segundo ele, isso não quer dizer que a indústria de carros dos Estados Unidos irá se render aos modelos compactos que fazem sucesso na Europa ou Brasil.

"É possível cuidar da eficiência dos automóveis maiores, que os americanos gostam", afirma. "O americano mostra que não faz mais questão do motor com oito cilindros; ele aceita um de quatro. Só que ele não quer mais um que faz cinco quilômetros com um litro de gasolina; e sim um que percorra 10 quilômetros pelo menos com a mesma quantidade", destaca.

As marcas japonesas demonstraram habilidade para oferecer aquilo que faltava às americanas. Conseguiram avançar no mercado de luxo sem abandonar o tradicional domínio nas faixas de carros pequenos.

Há um ano, Ford e GM anunciaram o fechamento de fábricas e demissões. Com despesas muito maiores do que as receitas estagnadas, as dívidas com planos de saúde e aposentadorias dos empregados forçaram a um drástico enxugamento.

Na véspera do salão de 2006, a GM havia anunciado o plano de fechamento de 12 fábricas e eliminação de 30 mil empregos na América do Norte. A Ford esperou a feira terminar para divulgar um programa de proporções semelhantes. Com o objetivo de reduzir custos em pelo menos US$ 6 bilhões até 2010, a empresa anunciou o corte de 30 mil empregos e fechamento de 14 fábricas em seis anos. "Todos temos que mudar e todos temos que nos sacrificar", disse na ocasião Bill Ford, CEO e bisneto do fundador da companhia.

"Estamos numa indústria de altos e baixos, que agora passa por um momento de baixa", disse ontem Dominic DiMarco, presidente da Ford América do Sul e diretor executivo para o Canadá e México, logo depois da audiência com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que a Ford anunciou planos de investimentos no Brasil.

"Uma das formas de a operação brasileira ajudar a matriz da Ford é manter os negócios na região fortes e isso nos leva a investir", disse o executivo. A caminho do aeroporto para o vôo que o levaria para Detroit, DiMarco demonstrava ansiedade com a proximidade do salão americano: "É um momento de muita excitação porque trata-se do maior evento do ano na cidade. Detroit continua sendo a capital mundial do automóvel."