Título: Analistas divergem sobre retomada do crescimento
Autor: Lorenzo, Francine De; Machado, Tainara
Fonte: Valor Econômico, 04/09/2012, Brasil, p. A2

Mesmo com a série de estímulos já adotados pelo governo para tentar induzir a retomada do setor industrial, como a redução de juros, desvalorização do câmbio e benefícios tributários para alguns segmentos, a visão de que a produção industrial iniciará o segundo semestre com recuperação está longe de ser consenso.

As estimativas de 11 departamentos econômicos e consultorias variam de queda de 1,2% a alta de 0,4% da indústria em julho, na comparação com junho, feitos os ajustes sazonais. Desses, cinco projetam queda, cinco estimam crescimento e um espera estabilidade. Na média, os economistas projetam que a produção industrial tenha encolhido 0,15% na comparação com junho, feitos os ajustes sazonais. O resultado oficial será divulgado hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os incentivos à indústria, avalia o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, ainda não produziram efeitos positivos sobre a produção. Pelas suas contas a atividade manufatureira encolheu 1,2% em julho na comparação com junho, feitos os ajustes sazonais, indicando que a alta de 0,2% no mês anterior ainda não deve ser interpretada como o início de um processo de recuperação. "Nem mesmo as vendas de Natal, que costumam reforçar as encomendas nesta época, fortaleceram a indústria", avalia Vale, que projeta queda de 2,5% na produção do setor em 2012.

Vale argumenta que os números da Anfavea, entidade que reúne as montadoras instaladas no Brasil, sinalizam que o ajuste de estoque ainda não foi finalizado. A produção de veículos em julho, segundo a Anfavea, cresceu 8,8% em relação a junho, mas recuou 3,6% na comparação com julho de 2011.

Como as vendas de automóveis em comparação com o mesmo mês do ano passado avançaram 18,9%, José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, também avalia que até agora o principal efeito da redução do IPI foi a venda de unidades que estavam encalhadas nos pátios das montadoras. Gonçalves afirma que sua projeção de queda de 1% da produção industrial em julho toma como base, além dos dados da Anfavea, a redução de 5,2% no Indicador de Nível de Atividade (INA) da indústria paulista, medido pela Fiesp, e o recuo de 4,1% da produção de aço bruto, sempre na comparação com julho de 2011.

Já de acordo com as estimativas do Bradesco, houve alta de 0,3% na produção industrial entre junho e julho, descontados os efeitos sazonais. Robson Pereira, economista do banco, observa que é natural que em momentos de viradas de ciclo econômico o número de setores com aumento de atividade na passagem mensal seja pequeno, por isso é possível que a produção de bens intermediários ainda não responda aos estímulos concedidos pelo governo. "Mas com o tempo isso tende a ficar mais disseminado."

Thovan Tucakov, da LCA Consultores, é mais otimista e acredita que, "se não for para ajudar, o segmento intermediário pelo menos não vai atrapalhar o resultado de julho". Em junho, os bens intermediários foram os únicos entre as categorias de uso a registrar queda na produção industrial. A redução foi de 0,9% em relação a maio, feitos os ajustes sazonais.

Pelos cálculos do economista da LCA, a produção industrial em julho aumentou 0,3%. O avanço, segundo ele, deriva não só do desempenho das montadoras, mas também dos reflexos promovidos por elas nos segmentos químico, de plástico e borracha. "As empresas de peças e acessórios para veículos voltaram a contratar para atender a demanda das montadoras, que já baixaram os estoques e estão retomando a produção. Alguns modelos de automóveis têm até fila de espera."

O mercado, segundo a economista Fernanda Consorte, do Santander, subestimou o impacto do corte do IPI no desempenho da indústria. Para ela, a produção industrial dessazonalizada vai crescer 0,4% entre junho e julho, e a tendência é de melhora daqui para a frente. "Há um efeito dominó grande provocado pela indústria automotiva. Aos poucos, ela vai possibilitando expansão aos demais segmentos de toda a cadeia."

Essa também é a percepção de Tucakov, da LCA, que acredita que o período de contração na indústria está ficando para trás. Sua expectativa é de crescimento paulatino do setor nos próximos meses, com a recuperação gradual da confiança do empresário. De acordo com a Fundação Getulio Vargas (FGV), a confiança do setor industrial aumentou 1,4% em agosto, na comparação com o mês anterior, para o maior nível desde julho de 2011.

Pereira, do Bradesco, ainda argumenta que o aumento da atividade deve depender do consumo doméstico. A Sondagem Industrial da FGV registrou alta de 2,6% na percepção sobre demanda interna, enquanto o nível de demanda externa caiu 4,7% na comparação entre julho e agosto, com ajuste sazonal. Essa dinâmica, segundo o economista do Bradesco, não deve se alterar nos próximos meses. "Apesar do câmbio mais favorável, temos demanda global mais fraca, além de parceiros comerciais importantes que adotaram medidas protecionistas."