Título: Mercado imobiliário inicia ciclo inédito de consolidação no país
Autor: Boechat, Yan
Fonte: Valor Econômico, 05/01/2007, Empresas, p. B6

O mercado imobiliário brasileiro se prepara para entrar em um ciclo de consolidação marcado, principalmente, por fusões e aquisições nunca antes visto na história do setor no país. Com a forte capitalização das companhias que foram à bolsa, a temporada de compras e associações começou em 2006 e promete se acelerar com rapidez nesse ano. É um novo cenário que está se formando em um dos setores mais fragmentados da economia brasileira. Ao mesmo tempo, continua a onda de abertura de capitais entre as empresas imobiliárias.

O mês de dezembro já deu o tom de como será 2007. No mês passado, quatro negócios foram fechados no setor, com destaque para a aquisição do grupo português Ergi Empreendimentos pela WTorre, por R$ 385 milhões. A Rossi fechou parceria com a pernambucana Gabriel Bacelar, a Cyrela fez o mesmo com a baiana Andrade Mendonça e a Gulfinvest arrematou 50% da Patrimóvel, a maior empresa de corretagem imobiliária carioca.

Aquisições e associações menores foram fechadas no Rio, Belo Horizonte, Recife, Salvador e São Paulo ao longo dos últimos três meses. Ao mesmo tempo, seis empresas aguardam autorização da Comissão de Valores Mobiliários para lançar suas ações na bolsa de valores.

"A temporada de compras está aberta, veremos muitas aquisições em 2007 e o ritmo de abertura de capitais será tão aquecido quanto esse ano", afirma Rodrigo Lowndes, presidente do Morgan Stanley no Brasil. Reforçando ainda mais essa tendência, o banco de investimento está trazendo ao país seu fundo imobiliário, o Morgan Stanley Real State Fund, com ativos de US$ 54 bilhões. No primeiro ano de operação no Brasil o fundo vai investir US$ 200 milhões.

Historicamente descapitalizado, o setor imobiliário brasileiro sempre atuou de forma fragmentada. Na cidade de São Paulo, que concentra 40% do mercado brasileiro, as dez maiores empresas do setor tinham juntas, em 2005, apenas 22% de participação. "Esse cenário começou a mudar em 2006. As dez maiores devem ter fechado o ano com cerca de 30% do mercado paulistano", afirma Luiz Paulo Pompéia, diretor de pesquisas da Empresa Brasileira de Estudos de Patrimônio, que acompanha as estatísticas do setor há quase 30 anos.

E deve mudar ainda mais em 2007. Com dinheiro em caixa e pressionadas pelo mercado financeiro, que espera as taxas de retorno prometidas pelas empresas, elas perceberam que não conseguirão crescer apenas acelerando o ritmo de lançamentos. "Não há como, será preciso haver crescimento inorgânico para que os resultados sejam alcançados", afirma Eurico Carvalho, diretor de Relações com Investidores da Klabin Segall, dando mostras do apetite do setor.

Por conta disso, boa parte, senão a totalidade, das companhias que foram a mercado estão de olhos abertos para oportunidades de negócio. Na maior parte dos casos estão em busca de empresas menores, com uma atuação em mercados diferentes do seu e que possam agregar valor à operação. "Não haverá muita saída para as companhias menores, principalmente as médias", diz João Carlos Robusti, presidente do Sinduscon-SP. "Ou elas se unem às grandes ou não terão dificuldades para sobreviver".

Exatamente pelo fato de haver uma grande oferta de pequenas e médias empresas no mercado poucos no setor acreditam na união de grandes companhias nesse momento. "Esse não é o momento, as grandes ainda vão crescer muito até vermos elas chegarem ao ponto de se unir", diz Ubirajara Freitas, diretor de Incorporações da Cyrela.

A exceção, nesse caso, se deu com uma das principais concorrentes da Cyrela. A compra da AlphaVille urbanismo pela Gafisa em outubro é vista pelo mercado como um caso isolado. Maior empresa de loteamentos urbanos do país, a AlphaVille vivia um momento único. Seu principal acionista, Renato de Albuquerque, não tinha herdeiros interessados em tocar o negócio e percebeu que era o momento de sair da empresa, vendida à Gafisa por cerda de R$ 380 milhões.

O que deve se repetir mesmo ao longo de 2007 são negócios como os protagonizados pela Rossi e pela própria Cyrela na última quinzena do ano. A Rossi fez uma joint venture com a construtora pernambucana Gabriel Bacelar. Pelo acordo, uma nova empresa foi criada em Recife, onde a Rossi e a Gabriel Bacelar tem 50% de participação cada. Ao longo de dois anos, inicialmente, a construtora de Recife não pode fazer nenhum lançamento de forma isolada.

Situação parecida ocorre com a construtora baiana Andrade Mendonça, que fez uma parceria com a Cyrela. Nesse caso, a incorporadora paulista detém 80% do negócio e a tem exclusividade nos mercados da Bahia e de Pernambuco em lançamentos da Andrade Mendonça.

Negócios como esses deram o tom da expansão geográfica das grandes construtoras paulistas ao longo de 2006. Pressionadas pela competição cada vez mais acirrada em São Paulo, quase todas as grandes optaram por expandir a atuação por meio das chamadas joint-ventures. Na prática, tratam-se de aquisições de pequenas empresas de outros estados. "Nós adquirimos quatro empresas, três no Estado de São Paulo e uma no Sul", diz Ubirajara Freitas, da Cyrela.

Agora, com a chegada dos fundos de investimento internacionais, começam também a ocorrer aquisições de empresas brasileiras por meio de companhias estrangeiras. Até novembro, os investidores externos estavam aplicando seus recursos nos papéis das empresas que abriram seu capital. Cerca de 75% dos mais de US$ 5 bilhões captados pelas nove companhias que foram à bolsa nos últimos 18 meses vieram de fora do país.

Mas, no final de 2006, o mercado viu a primeira aquisição de uma empresa brasileira por investidores externos. Em novembro a mineira Arco Engenharia foi comprada pelo grupo de empreendimentos imobiliários espanhol Promobarma. Até agora foi um negócio isolado mas, apostam os analistas, não será o único no cada vez mais aquecido mercado brasileiro.