Título: Cezar Peluso vota pela última vez no Supremo
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 29/08/2012, Política, p. A10

"Magistrado que é magistrado não foge à luta", disse Cezar Peluso a um amigo para explicar o motivo que o levou a participar do julgamento do mensalão às vésperas de sua aposentadoria. Segundo esse interlocutor, o ministro disse que ficaria no cargo até o último dia - 3 de setembro, quando completa 70 anos - para evitar qualquer especulação de que ele fugiria da responsabilidade de votar o mensalão.

A "luta" de Peluso deve se resumir à votação de um dos sete itens da denúncia - o que trata de desvios de dinheiro público no Banco do Brasil e na Câmara dos Deputados. Ele afirmou a esse interlocutor que não faz questão de antecipar o voto e que a sua conduta no julgamento é a de votar quando for solicitado.

Se, por acaso, Peluso mudar de ideia, ampliando o seu voto sobre os outros itens, ele sabe que vai criar uma discussão tensa na Corte. Nessa hipótese, o ministro Ricardo Lewandowski pode até deixar o posto de revisor, pois ele entende que, se um ministro antecipar considerações a respeito de aspectos que o relator, Joaquim Barbosa, não se manifestou, ele passa a ser o relator. Barbosa seria o revisor e Lewandowski ficaria sem sua função.

Por causa do tamanho do processo e das delongas no julgamento, Peluso teve de esperar 15 sessões para, enfim, votar. Questionado, ontem, a respeito de seu voto, ele manteve o suspense: "Amanhã [hoje] vocês verão. Não estraguem a surpresa".

Apesar da repercussão do caso, o mensalão está longe de ser o voto de maior importância para Peluso no Supremo Tribunal Federal (STF). Para ele, a proibição da prisão por dívidas foi mais relevante. "Eu dei sentença de 23 páginas dizendo que a prisão por dívida era inconstitucional", disse, lembrando que, na ocasião, era juiz substituto, tinha pouco mais de 30 anos e atuava no interior de São Paulo. Aquela decisão foi totalmente alterada pelo Tribunal de Justiça por maioria de votos. "O interessante da história é que caiu na minha mão no STF um caso igual, com jurisprudência contrária ao meu ponto de vista", contou Peluso, em conversa com o Valor, em abril. Segundo ele, havia uma proposta de súmula do então ministro Moreira Alves para declarar lícita a prisão do devedor. "Eu peguei aquela sentença, acrescentei dois ou três argumentos e o plenário do STF mudou a jurisprudência e aprovou súmula no sentido contrário", afirmou. "Não apenas reprovaram a súmula no sentido anterior como aprovaram uma de acordo com o que eu decidi. Foi uma coisa notável!"

Vitorioso na tese que impede a prisão por dívida, Peluso deixa o STF com uma derrota: não conseguiu aprovar a PEC dos recursos. Se tivesse sido aprovada, a proposta de emenda constitucional faria com que as decisões da Justiça fossem executadas a partir da 2ª instância. Na avaliação de Peluso, a PEC daria mais valor aos juízes de instâncias inferiores, evitaria recursos aos tribunais superiores de Brasília, daria maior agilidade à tramitação de processos e credibilidade ao Judiciário. No entanto, o governo da presidente Dilma Rousseff identificou que a PEC dos recursos não obteve o apoio interno dos demais ministros da Corte e, por esse motivo, descartou-a.

Agora, ao votar o processo do mensalão, Peluso fará com que seu substituto, a ser indicado por Dilma, não possa participar do restante do julgamento. Mesmo se ele proferir voto apenas sobre um dos itens da denúncia, o substituto não vai poder participar dos demais itens do julgamento. Poderá votar apenas os embargos.