Título: Taxa de crescimento varia muito por região
Autor: Lamucci, Sergio e Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 16/10/2006, Brasil, p. A4

O câmbio, a crise agrícola e os programas de transferência de renda provocaram um crescimento desigual no país. Há uma enorme disparidade entre os Estados na produção industrial, nas vendas e na geração de empregos. De janeiro a agosto, a indústria no Pará cresceu 15,4% em relação ao mesmo período do ano passado, enquanto no Rio Grande do Sul houve queda de 3,5%. O comércio varejista na Bahia, por sua vez, aumentou 9% de janeiro a julho, um desempenho bem diferente da alta de apenas 0,8% do Paraná.

Em geral, a produção vai bem nos Estados em que a indústria extrativa mineral é forte, como Pará, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo, beneficiados pela forte demanda externa por produtos como minério de ferro e petróleo. O comércio, por sua vez, tem o melhor resultado nos Estados do Norte e Nordeste, regiões mais favorecidas por transferências de renda como o Bolsa Família e o pagamento de aposentadorias.

O pior desempenho fica por conta dos Estados do Sul, afetados pela crise agrícola e pelo câmbio valorizado. As indústrias da região, como a de calçados, têxteis e de madeira e mobiliário, têm sofrido muito com o dólar barato.

Para a economista Débora Nogueira, da Rosenberg & Associados, o desempenho nos Estados é fundamental para entender a distribuição de votos na atual eleição presidencial. No Norte e no Nordeste, as taxas de crescimento superam a média do país. Por isso, a preferência é pelo atual presidente, o candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. No Sul e no Centro-Oeste, o desempenho é bem pior. Essas regiões são redutos da candidato da oposição, o tucano Geraldo Alckmin.

O economista Paulo Miguel, da Quest Investimentos, vê com preocupação o comportamento da economia brasileira. Na indústria, quem mais cresce é a extrativa mineral, que acumula expansão de 4,8% nos 12 meses terminados em agosto. No Pará, beneficiado pelo aumento das exportações de minério de ferro, alumínio e produtos siderúrgicos, a indústria extrativa cresceu 18,3% de janeiro a agosto, como nota o diretor de pesquisa macroeconômica do Bradesco, Octavio de Barros. As exportações do Estado cresceram expressivos 38,3% de janeiro a setembro, bem acima da média nacional de 16,3%. No Rio de Janeiro, as vendas externas aumentaram 45,9%, principalmente devido às exportações de petróleo.

A demanda externa por esses produtos, principalmente da China, explica o resultado, que ajudou também o Espírito Santo, onde a produção cresceu 6% nos primeiros oito meses, bem acima da média nacional, de 2,8%. O problema, diz Miguel, é que o segmento extrativo representa menos de 10% da indústria geral.

Nos Estados do Norte e no Nordeste, chama a atenção o ritmo de crescimento da vendas no varejo. No Amazonas, de janeiro a julho, o comércio cresceu 15,4% na comparação com o mesmo período de 2005. No Ceará, a alta é de 8,7%. "Esse resultado se deve principalmente às transferências de renda", diz o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero.

O Bolsa Família é uma das explicações para o fenômeno, assim como o aumento do salário mínimo, que corrige dois terços das 24 milhões de aposentadorias do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), boa parte dos quais nessas regiões. Miguel observa que, em prefeituras do Norte e do Nordeste, muitos funcionários públicos têm salários vinculados ao piso salarial no país.

A criação de empregos formais no Nordeste, porém, deixa um pouco a desejar. Nos oito primeiros meses do ano, o saldo de postos de trabalho aumentou 2,8% na Bahia e 2,6% no Ceará em relação ao número registrado no fim do ano passado. É um número inferior à média do país, de 4,6%. Para o economista Fábio Romão, da LCA Consultores, a questão é que há muita informalidade no mercado de trabalho nordestino, principalmente no comércio, justamente o setor da economia que vai muito bem por lá.

Um dos Estados que vão bem na criação de empregos em relação ao fim de 2005 é São Paulo, com aumento de 6,4% no período de janeiro a agosto. Romão diz que o desempenho é positivo principalmente no interior do Estado, com destaque para o setor de açúcar e álcool. A criação de postos de trabalho na construção civil também influencia o resultado, com peso importante na expansão do mercado de trabalho nas metrópoles.

O Sul do país apresenta o pior desempenho em todos os indicadores macroeconômicos, afetado pela crise agrícola e pelo impacto do câmbio valorizado sobre a competitividade de indústrias importantes como a de calçados, móveis e têxteis, diz Montero.

No Rio Grande do Sul, a produção industrial caiu 3,5% de janeiro a agosto em relação a igual período do ano anterior. As vendas do comércio recuaram 1,3% de janeiro a julho ante o mesmo intervalo em 2005 e o emprego cresceu apenas 1,76% de janeiro a agosto em relação a dezembro. Todos e estão abaixo da média nacional.

O peso da agricultura, que está sofrendo com o câmbio valorizado e a queda do preço das commodities, é expressivo no Sul do país. Com a crise agrícola, a renda do produtor fica comprometida, o que se reflete no comércio. A agroindústria também é afetada.

No Paraná e em Santa Catarina, o desempenho é um pouco melhor que o dos gaúchos, mas segue desalentador. A produção industrial recuou 2,8% no Paraná e 0,1% em Santa Catarina, de janeiro a agosto em relação a igual período do ano anterior. As vendas do comércio paranaense e catarinense cresceram, respectivamente, 0,8% e 2,2% de janeiro a julho ante o mesmo intervalo em 2005. As exportações do Paraná caíram 0,7% de janeiro a setembro deste ano ante o mesmo período de 2005.

Outro fator que prejudica o desempenho da economia do Sul do país é o câmbio. No Rio Grande do Sul, estão situados pólos das indústrias calçadistas e de móveis. Já Santa Catarina concentra indústrias de tecidos e confecções. Esses setores sofrem duplamente com o real forte: as exportações se tornam menos competitivas e a produção da indústria doméstica é substituída pelos importados, principalmente da China.

Barros, do Bradesco, acredita em "algum grau de convergência" na performance dos Estados a partir de 2007. "A boca de jacaré que se abriu entre os Estados chegou ao limite", diz. Ele espera uma recuperação modesta da atividade nas regiões Sul e Centro-Oeste no próximo ano e prevê crescimento mais moderado no Norte e Nordeste.