Título: Aos poucos, Rural recupera depósitos e linhas externas
Autor: Balarin, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 05/01/2007, Finanças, p. C3

Pouco mais de um ano depois da transação, o Banco Central acaba de homologar a aquisição e incorporação, pelo Banco Rural, da RS Financeira. Em dezembro de 2005, o Rural, que já tinha 51% de participação na RS, incorporou-a depois de a financeira ter resgatado 49% de suas ações que estavam em poder de minoritários.

A homologação, já prevista, era uma das últimas etapas do difícil processo de reestruturação do Rural, que foi abatido primeiro pela quebra do Banco Santos e, em 2005, pelo envolvimento no escândalo político do mensalão. Os dois episódios levaram a uma grave perda de depósitos.

Com o apoio de um grupo de quatro notáveis, entre eles o ex-presidente do BC Gustavo Loyola e o ex-presidente do Banco do Brasil Paolo Zaghen, a holding que controla o Rural redefiniu o foco do banco, fechou agências e reduziu o patrimônio. Os cortes "na carne", como define um de seus dirigentes, ocorreram entre o fim de 2005 e o primeiro semestre de 2006. No segundo semestre do ano passado, especialmente entre bancos estrangeiros, e trazer de volta os depósitos. O balanço voltou ao azul, após um prejuízo superior a R$ 200 milhões em 2005. Para 2007, o foco será voltar a crescer.

O empréstimo consignado (com desconto em folha de pagamento) é hoje o carro-chefe do Rural. Para atuar nesse segmento, o banco decidiu tirar de cena o nome da RS Financeira e adotou uma nova placa, a do Banco Simples. Em dezembro, o volume de novos consignados foi de R$ 30 milhões e a meta é fechar 2007 com média mensal de R$ 40 milhões.

Os empréstimos consignados são usados como lastro de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) adquiridos por bancos estrangeiros como o Credit Suisse, o JP Morgan e o Mellon. No total, são quatro fundos, cada um de R$ 100 milhões (cota sênior). Esses fundos são responsáveis por 100% dos recursos usados pelo Rural para conceder os empréstimos.

Dirigentes acreditam que o fato de o Rural ter se especializado em alguns nichos pouco explorados - como os empréstimos para funcionários de pequenas prefeituras - lhe dá uma vantagem no consignado. "No caso do INSS, a carteira do consignado cresce quase de forma vegetativa e alguns bancos têm partido para operações mais arriscadas, como empréstimos para pessoas mais velhas. Também há muita concorrência para servidores da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, por exemplo", explica um representante do Rural.

Embora os planos do banco sejam de crescimento no consignado, espera-se que outras duas áreas eleitas como foco cresçam ainda mais. Uma delas é a de empréstimos para clientes corporativos com faturamento anual entre R$ 2 milhões e R$ 50 milhões - a carteira de crédito que mais sofreu na crise do Rural. Em outubro, o volume de financiamentos nessa modalidade já alcançava R$ 963,9 milhões. Em novembro, passou para R$ 975,8 milhões. Nessa modalidade, a maior parte das operações são de antecipação de capital de giro, em que a empresa entrega como pagamento recebíveis de curto prazo (entre 45 e 90 dias).

O "funding" (recursos necessários) para as operações de crédito corporativo vem de duas fontes principais. Uma é a captação via emissão de Certificados de Depósito Bancário (CDB), que está se recuperando lentamente. Em outubro, os CDB do Rural somavam R$ 809 milhões. Em novembro, já chegavam a R$ 829 milhões. O diretor de uma instituição financeira concorrente informou ao Valor que o Rural terá dificuldade para vender CDB a investidores institucionais, especialmente os fundos de pensão, já que muitas deles alteraram sua política de investimentos após a quebra do Santos e o escândalo do mensalão. "Mas os FIDC com bancos estrangeiros, sem dúvida, melhoram a percepção de risco da instituição", diz.

Além do CDB, os FIDC são, de novo, outra fonte de recursos para o crédito corporativo. Um FIDC, de R$ 20 milhões, já está em operação. O banco estrutura outro, que pode chegar a R$ 250 milhões.

O terceiro foco de negócios do Rural é internamente chamado de câmbio, internacional e agronegócios. Para realizar operações nesse segmento - como os pré-pagamentos securitizados de exportações - o banco tem usado duas fontes principais de recursos: a captação própria nas unidades de Nassau e de Portugal e as linhas externas.

Os dirigentes do Rural não gostam de comentar, mas também têm trabalhado para recuperar os empréstimos que colocaram a instituição no epicentro do escândalo do mensalão. Cobram na Justiça os financiamentos para o publicitário Marcos Valério e suas empresas e fecharam um acordo com o PT para receber R$ 8 milhões. O pagamento está em dia, segundo apurou o Valor.