Título: Aquisições de títulos pelo BCE poderão ser limitadas
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 03/09/2012, Internacional, p. A16

O Banco Central Europeu (BCE) poderá decepcionar nesta quinta-feira quem espera por um grande plano de compra maciça e imediata de títulos soberanos, para fazer baixar os custos de financiamento de países europeus em crise como Espanha e Itália.

As expectativas são grandes sobre uma nova orientação da gestão da crise europeia. Primeiro, em razão do projeto de união bancária lançado em fins de junho pelos líderes europeus. E segundo, pelas declarações do presidente do Banco Central Europeu, Mário Draghi, de que a instituição fará "tudo que é necessário" para preservar o euro, o que foi imediatamente interpretado como sinal de compra de dívida de títulos da dívida dos países em dificuldade.

Mas especialistas mostram-se prudentes sobre o que esperam dos detalhes que Draghi poderá fornecer do novo programa de compra de ativos, após a reunião da diretoria do banco esta semana, que abrirá na prática o movimento esperado de bancos centrais no segundo semestre.

Só que os parâmetros para a intervenção do BCE causam fortes controvérsias, em particular diante da oposição do Bundesbank, o banco central alemão.

O mais provável é que Mário Draghi insista para que as compras de papéis soberanos sejam limitadas e que não comecem antes que o fundo de resgate anti-crise europeu tenha também já comprado títulos soberanos. E poderá ignorar demandas para o BCE fixar um objetivo formal sobre spreads dos títulos soberanos da periferia europeia.

Assim, a proposta do BCE poderá ser considerada insuficiente pelo mercado, especialmente considerando que a Espanha pode não estar preparada para pedir assistência financeira da União Europeia nos próximos dias, observa Phillipe de Gudin, do banco Barclays.

Mas com os países centrais da região - encabeçados pela Alemanha e França - sendo empurrados neste momento para a recessão, o BCE deverá compensar, adotando mais medidas para apoiar a economia.

Uma possibilidade é de novo corte da taxa de juro para 0,5%, embora os analistas estejam divididos sobre essa baixa na reunião de quinta-feira. Alguns economistas notam que, em todo caso, o movimento faria pouco para melhorar as perspectivas econômicas, pois a taxa efetiva no mercado já é virtualmente zero.

Outra alternativa para o BCE é encorajar os bancos comerciais a também emprestar para a economia real. Acredita que há muita liquidez no mercado, desde suas operações de empréstimo de mais de €1 trilhão para os bancos. Assim, para que o dinheiro chegue às companhias e famílias, o BCE poderia seguir o exemplo do Banco da Inglaterra.

A autoridade monetária britânica adotou um novo "Funding for Lending Scheme", esquema pelo qual os bancos comerciais têm acesso a dinheiro barato do banco central sob a condição de não reduzir seus empréstimos.

Uma terceira possibilidade seria o Banco Central Europeu comprar títulos das companhias diretamente. Benoit Couré, um dos membros da diretoria do BCE, insistiu que todo mecanismo para facilite o acesso de crédito para as companhias e famílias está sendo considerado.

Mas o foco será mesmo nos parâmetros da compra de títulos anunciada em agosto por Draghi. Em todo caso, essas compras terão caráter condicional, para Jean-Luc Proutat, do BNP Paribas. O banco vai intervir por demanda dos países e depois que estes tenham assinado um acordo se engajando a respeitar objetivos de redução de seus desequilíbrios macroeconômicos.

Para permanecer no âmbito de seu mando, o BCE só vai intervir com compras de títulos de curto prazo, limitados a três anos, que é a duração máxima dos empréstimos que concedeu até agora.

Outra questão é sobre quanto o Banco Central Europeu poderia comprar. A analista Jennifer McKeown, sediada em Londres, nota que o banco comprou cerca de € 50 bilhões de títulos da Grécia desde maio de 2010, ou 15% do total da divida naquele momento. Levando em conta essa base, no caso da Espanha o montante seria de € 110 bilhões.