Título: Carteira de crédito inflou durante a crise
Autor: Cristino, Vânia; Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 15/11/2010, Economia, p. 9

Mesmo com a deterioração do cenário econômico global, instituição continuou ampliando empréstimos para pessoas físicas

A fraude no Banco PanAmericano ocorreu no ponto forte da instituição, que são as operações de crédito. Daí, segundo analistas do mercado financeiro, a dificuldade do Banco Central em enxergar as irregularidades. Mesmo com a crise econômica internacional, o financiamento não secou. Com o apoio do governo, a oferta de crédito no mercado para as pessoas físicas continuou crescendo, conforme comprovam os dados do Banco Central. Assim como outros bancos de médio porte, o PanAmericano foi beneficiado pelo incentivo do BC para a compra de carteiras de crédito pelos grandes bancos. O PanAmericano usou e abusou dessa medida, contabilizando em dobro as operações.

Descoberta a fraude, a antiga diretoria está agora sofrendo as consequências. Processo administrativo, já aberto pelo BC, deverá intimar os responsáveis nos próximos dias. E, para dar uma satisfação ao público, o próprio Grupo Sílvio Santos publicou ontem no jornal O Estado de São Paulo comunicado anunciando que irá processar, civil e criminalmente, os ex-diretores do banco e também a empresa de auditoria Deloitte, responsável pela análise do balanço. A Polícia Federal já entrou na história e o Ministério Público deverá apresentar denúncia à justiça tão logo disponha de mais elementos.

Antes da crise, em junho de 2008, a carteira de crédito do banco somava R$ 3,626 bilhões, saltando para R$ 4,204 bilhões em junho do ano seguinte, um aumento de 16%. Em junho último, dados do balanço semestral da instituição apontam operações de crédito no volume de R$ 5,875 bilhões. O incremento é de 39,7% em relação a 2009 e de 62% em relação a 2008. As operações de crédito do sistema financeiro como um todo passaram de R$ 1,276 trilhão em junho de 2009 para R$ 1,528 trilhão em junho último, um crescimento de quase 20% no período. Segundo o BC, só as operações de financiamento de veículos, outro destaque do Panamericano, cresceram 42,5% em 12 meses, até setembro.

CVM O Banco Central não foi o único enganado nessa história. Se conseguiu camuflar as operações fraudulentas durante anos ¿ existe a suspeita de que a contabilidade fictícia vinha sendo feita nos últimos três ou quatro anos ¿, os gestores do banco também enganaram a Bolsa de Valores e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O banco pode ter aberto capital já com irregularidades em seus balanços. A oferta inicial de ações do Panamericano foi feita em novembro de 2007. Na época, a instituição conseguiu levantar R$ 700,4 milhões. Para ir ao mercado, a instituição ainda passou pelo crivo da Deloitte, sua auditoria independente, e dos demais intermediários na operação, que foram o UBS Pactual, BBI (Bradesco) e Itaú BBA.

Para a CVM existe a suspeita de que o Panamericano não prestou todas as informações devidas, como por exemplo, que pagava bônus aos executivos. Entre as motivações da fraude está justamente a de que os gestores do banco inflavam o balanço para auferirem lucro. Segundo o banco informou à CVM, os diretores tinham salário fixo e benefícios, como plano de previdência, seguro de vida e assistência médica e odontológica. Nada foi comunicado com relação a bônus ou participação no resultado.

R$ 539 mil ao ano Os executivos do Panamericano ganhavam, em média, R$ 539 mil ao ano. A informação foi prestada pelo próprio banco. Como as demais companhias abertas, o PanAmericano divulgava seus números, rotineiramente, ao mercado. Segundo o banco, 85,7% da remuneração dos executivos corresponde a salário e os demais 14,3% a benefícios, como, por exemplo, plano de previdência complementar. Os ganhos da diretoria são reajustados anualmente, tendo como base a média dos percentuais aplicados nas várias sociedades do grupo Sílvio Santos. Segundo o Panamericano, nenhum indicador de desempenho é levado em consideração para determinar os salários.

Em 2009 o Panamericano pagou R$ 5,863 milhões aos administradores (diretoria, conselho de administração e conselho fiscal). O valor é bastante próximo do previsto para este ano, de R$ 5,845 milhões. Coube à diretoria, com sete executivos, ficar com a maior parte da remuneração. Cerca de R$ 4,543 milhões foram pagos em salários e os demais R$ 650 mil gastos em benefícios. A maior remuneração paga foi de R$ 960 mil no ano. A menor foi de R$ 480 mil.

Dívida A diretoria anterior, investigada por fraude, já está afastada. Oito novos executivos, sendo cinco indicados pela Caixa Econômica Federal, assumiram a gestão da instituição. Ainda não se tem informação sobre a mudança de critérios para a remuneração dos profissionais, uma vez que o grupo Sílvio Santos não deverá permanecer como controlador do banco.

O próprio Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que deu o empréstimo de R$ 2,5 bilhões para salvar o banco, já deixou claro que a instituição será vendida para pagar parte da dívida do grupo. Esse poderá ser o caminho das demais 43 empresas de Sílvio Santos ¿ como o Baú da felicidade e o SBT ¿ pois elas não geram caixa suficiente para arcar com as prestações semestrais de R$ 357 milhões, atualizadas pelo IGP-M acumulado em 12 meses. De acordo com o FGC, o valor consolidado das empresas do grupo, dadas como garantia ao empréstimo, é de R$ 2,7 bilhões (VC e VV).

EUA: Deficit pode atingir os títulos » Os Estados Unidos devem agir para controlar o seu enorme deficit orçamentário ou correm o risco de uma crise no mercado de títulos, afirmou o ex-presidente do Federal Reserve, o Banco Central norte-americano, Alan Greenspan. ¿Temos que resolver esse problema antes que sejamos forçados¿, disse Greenspan em referência à crescente dívida dos EUA. Os comentários foram feitos no momento em que o ex-chefe de gabinete da Casa Branca Erskine Bowles e o ex-senador Alan Simpson se preparam para entregar um relatório sobre a dívida em 1º de dezembro. Um relatório preliminar divulgado na semana passada ofereceu uma série de possibilidades de impostos e redução de gastos politicamente difíceis, que visam reduzir a dívida em US$ 4 trilhões até 2020. As sugestões foram recebidas com pouco entusiasmo por alguns políticos e total condenação por outros, incluindo Nancy Pelosi, que definiu as ideias como ¿simplesmente inaceitáveis¿. Greenspan afirmou acreditar que ¿algo equivalente¿ ao que Bowles e Simpson recomendam vai acabar sendo aprovado pelo Congresso dos EUA. Ele acrescentou que o deficit dos EUA, que atingiu US$ 1,3 trilhão este ano, pode começar a assustar o mercado de títulos, o que poderia prejudicar a recuperação e empurrar a economia de volta à recessão.