Título: Pane em empresa brasileira afeta apuração no Equador
Autor: Uchoa, Rodrigo
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2006, Internacional, p. A11

Uma pane no sistema da empresa brasileira E-vote, que fazia a contagem dos votos da eleição geral de domingo, no Equador, lançou o país andino numa espiral de acusações de fraude por parte de candidatos que se sentiram prejudicados, entre eles o nacionalista Rafael Correa. O Tribunal Superior Eleitoral do país rescindiu unilateralmente o contrato com a E-vote e fala em pedir indenização.

A empresa brasileira foi contratada, por meio de licitação, para fazer a contagem preliminar dos votos e a transmissão minuto a minuto da apuração. O contrato total era de US$ 5,2 milhões, dos quais US$ 3 milhões já foram pagos, segundo autoridades equatorianas.

Antes da eleição, a E-vote havia se comprometido a finalizar a contagem preliminar para a Presidência duas horas depois de fechadas as urnas. A contagem total dos votos para deputados se daria em no máximo cinco horas.

Como a votação no país não é eletrônica, o trabalho da empresa era essencialmente o de processar os números enviados por telefone pelos mesários. O sistema é o seguinte: após o fim da votação, os mesários fazem a contagem no próprio local e confeccionam dois relatórios. Um é o de contagem preliminar, entregue a um policial ou outra autoridade, que o repassa à E-vote; o outro relatório, oficial, segue para o Tribunal Superior Eleitoral e serve de contra-prova para a contagem preliminar.

Às 20h (22h em Brasília) de domingo, três horas após o fechamento das urnas, o sistema da E-vote entrou em pane. Até aquele momento, pouco mais de 70,5% dos votos para presidente haviam sido apurados; não havia nenhum registro dos votos para deputados. Na contagem parcial, o bilionário Álvaro Noboa, maior exportador de banana do país, aparecia com 26,6% dos votos, contra 22,5% de Correa, o que os levaria para o segundo turno em 26 de novembro.

Os representantes da E-vote no Equador não quiseram se manifestar, mas o presidente do TSE, Xavier Cazar, disse que os problemas podem ser, entre outros, resultado do diminuto número de computadores instalados pela empresa.

Ainda que o problema possa ter sido exclusivamente de ordem técnica, contribuiu para acirrar os ânimos da disputa presidencial. O candidato Correa, apoiado pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que nos dias anteriores à eleição já vinha dizendo que uma grande fraude contra ele estava sendo preparada, foi ao ataque: "Fui roubado, a fraude está evidente. Não há como negar agora."

Correa não apresentou provas de que uma fraude realmente tenha ocorrido. Disse apenas que as pesquisas o mostravam, menos de uma semana antes da eleição, com 30% das intenções de voto. "Agora a apuração mostra nove pontos percentuais a menos. É óbvio que fui roubado", disse. Ontem, ele chegou a se proclamar vencedor do pleito no primeiro turno: "Ganhamos, temos a nossa própria apuração, feita por nossos delegados". Analistas dizem, porém, que ele deve se conformar e aceitar a disputa do segundo turno.

A Martha Roldós, sobrinha do candidato a presidente León Roldós e ela mesma candidata a deputada, jogou dúvidas sobre o processo de apuração, mas preferiu não fazer acusações diretas: "É tudo muito suspeito, não sabemos o que acontece ali na apuração". "O problema é que temos um longo histórico de fraudes no país."

León Roldós, que liderou as pesquisas até dois meses atrás, estava em quarto lugar na apuração parcial, com 15,5%, atrás de Gilmar Gutiérrez, irmão do presidente deposto Lucio Gutiérrez, com 16,5%.

O TSE tem dez dias para proclamar o resultado oficial. Por ora, não há indícios de fraude, relata o observador especial da OEA, Rafael Bielsa, ex-chanceler argentino. Autoridades equatorianas disseram que pode levar três dias para finalizar o cômputo dos votos para presidente. O dos votos para deputados deve demorar bem mais.

A empresa brasileira Probank, uma das integrantes do consórcio batizado de E-Vote contratado para trabalhar nas eleições do Equador, disse estar apurando o que ocorreu no processo de apuração.

Empresa de tecnologia da informação e comunicação, a Probank tem entre seus clientes estão estatais e empresas do setor privado. Em 2004, no Brasil, estreou em eleições prestando suporte à Justiça Eleitoral. Participou do Referendo do Desarmamento de 2005 e foi novamente escolhida para atuar nas eleições deste ano. Não há menções no site da empresa a experiências em eleições internacionais. (Colaborou Marcos de Moura e Souza)