Título: Maior parte das despesas pendentes é de investimentos
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2006, Especial, p. A14

A União pagou, até setembro, pouco mais da metade - 51,2% - do total de restos a pagar existentes no início deste ano em relação a investimentos e custeios. Incluindo aqueles não sujeitos à limitação pelo decreto de programação financeira, em janeiro de 2006, o volume de empenhos não pagos de orçamentos de anos anteriores era de R$ 31,27 bilhões nesses dois grupos de despesa. Uma parte, de R$ 2,31 bilhões, acabou sendo cancelada posteriormente. Faltando apenas três meses para acabar o ano, R$ 12,95 bilhões continuavam pendentes de pagamento, R$ 6,75 bilhões dos quais relativos a investimento.

Dos cerca de R$ 16 bilhões que foram pagos nesses nove meses, os investimentos responderam por R$ 6,246 bilhões. Do que foi cancelado, por R$ 280,31 milhões. Os cancelamentos de restos a pagar ocorrem normalmente quando a despesa, embora empenhada, não chegou a ser objeto de efetiva contratação. Isso acontece, por exemplo, quando a licitação de uma obra prevista no orçamento acaba não saindo ou atrasando demais, podendo ser incluída em orçamento posterior.

Dos restos que continuavam pendentes de pagamento no início de outubro, a maior parte, R$ 10,87 bilhões, era do orçamento de 2005. Mas um volume expressivo, de R$ 2,08 bilhões, referia-se a empenhos realizados até 2004. O número foi extraído do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI) pelo consultor Francisco Lúcio Pereira Filho, da consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados.

A revalidação de empenhos não-pagos por diversos anos "evidencia um desvirtuamento do instituto dos restos a pagar", na opinião do consultor. Ele defende que, em princípio, se não forem pagos até o final do ano seguinte ao de inscrição, pelo menos os restos a pagar não-processados deveriam ser cancelados, o que nem sempre acontece. Os não-processados são aqueles cujo empenho ainda não foi objeto de liquidação de fato, para efeitos de pagamento ao credor. Diferente daquela meramente contábil e provisória, que ocorre no próprio ato da inscrição em restos a pagar, a liquidação de fato é o momento em que a obra, serviço ou bem é considerado entregue pelo poder público.

Os restos a pagar processados, que referem-se a empenhos já liquidados sob este ponto de vista, são mais difíceis de cancelar justamente porque, em tese, o credor já cumpriu sua parte e estaria habilitado a receber. Por outro lado, pelo mesmo motivo, eles não deveriam ficar sendo adiados por anos. Entretanto, dos R$ 2,08 bilhões herdados de empenhos realizados até 2004 e ainda em aberto no início deste mês, R$ 1,3 bilhão eram processados.

Paulo Henrique Feijó, coordenador geral de contabilidade do Tesouro Nacional, esclarece que isso não significa inadimplência da União frente a esses fornecedores. Há outros motivos que impedem o pagamento de empenhos liquidados. Um dos mais comuns, segundo ele, é a falta de certidões que comprovem que o credor está em dia com suas obrigações perante a União (impostos, Previdência, etc). Sem essa comprovação, a legislação não permite ao governo pagar, mesmo que o bem, obra ou serviço tenha sido entregue.

Outro motivo da existência de restos a pagar processados muito antigos são os convênios para repasse de recursos voluntários a Estados e municípios. Quando o investimento da União se dá dessa forma indireta, legalmente o empenho é dado por liquidado e o resto a pagar por processado na publicação do convênio. Entretanto, o desembolso efetivo do recurso só pode ocorrer quando o Estado ou município comprova que a obra ou etapa de obra ou serviço foi realizada, explica o subsecretário de orçamento do Ministério da Saúde, Arionaldo Bomfim Rosendo. Entre todos os ministérios, o da Saúde é o que mais tem restos a pagar processados anteriores a 2005. Conforme Rosendo, o motivo é que muitas obras de saneamento básico iniciadas a partir de convênios firmados em 2000 e 2001 ainda não acabaram. (MI)