Título: É impossível dar o reajuste do piso a professor, diz Tarso Genro
Autor: Máximo , Luciano
Fonte: Valor Econômico, 10/09/2012, Brasil, p. A4

O embate entre governadores estaduais e professores por causa da lei nacional do piso para docentes de escolas públicas voltou aos holofotes na semana passada. Indignados com o mecanismo de reajuste da legislação, Mato Grosso do Sul, Goiás, Piauí, Rio Grande do Sul, Roraima e Santa Catarina entraram com uma nova Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a regra de aumento anual que segue valor estabelecido pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

Entre 2011 e 2012, o índice foi de 22% e o valor passou de R$ 1.187 para R$ 1.451. A previsão para 2013 é de alta de mais de 21%. Os Estados argumentam que o aumento é determinado por portaria ministerial e impede qualquer planejamento orçamentário dos entes federados, explica o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), um dos signatários do processo, junto com colegas do PMDB, PSDB, PSB e PSD. Em entrevista ao Valor, o gaúcho não esconde que seu Estado não cumpre as regras atuais. "É impossível."

Valor: Em 2008, governadores questionaram no Supremo a constitucionalidade da lei do piso salarial dos professores e perderam. Por que essa nova Adin agora?

Tarso Genro: É falsa a informação de que essa Adin é contra a constitucionalidade da lei do piso. A Adin anterior foi contra a constitucionalidade e sempre me manifestei contrário a essa ideia. A ação de hoje questiona o modelo de reajuste do piso. Defendemos a constitucionalidade da legislação, mas achamos inconstitucional a determinação de aumento real por meio de portaria ministerial.

Valor: Mas o Supremo já decidiu, em 2011, que a lei deve ser cumprida por todos os Estados e municípios. A Adin de agora não traz mais confusão no entendimento da lei e no pagamento efetivo do piso?

Genro: Para entender isso, eu preciso falar da gênese da legislação. A lei do piso foi instituída a partir de um conjunto de movimentos e de decisões que começaram quando eu estava no Ministério da Educação e consolidada quando já estava no Ministério da Justiça. Todas as negociações que eu acompanhei indicavam que o piso seria de um valor e sua correção deveria compor a inflação. O conceito de piso vem daí. É um valor constante. Sua correção pela inflação significa atualização. O que a lei está propondo é um aumento real contrabandeado para dentro do orçamento estadual ou municipal via portarias anuais do MEC. Ou seja, com essa regra o processo de aumento salarial real é decretado fora do âmbito dos Estados.

Valor: Ferindo a autonomia federativa...

Genro: Fere totalmente e não permite planejamento. A correção pela inflação é previsível no âmbito orçamentário e dá atualização real ao salário.

Valor: Por que os Estados não se planejam para cumprir a lei?

Genro: É totalmente impossível pagar. É uma superposição de mais de 20% na folha de pagamento da educação neste ano e mais 20% no ano que vem, o que tornaria totalmente inviável o custeio dessa folha. Mais que triplica o valor da inflação em um ano. No Estado nós temos assegurado reajuste [nominal] de 76,5% nos salários dos docentes até 2014 - aumento real de cerca de 50%. A aplicação do reajuste traria um reflexo totalmente impossível para a carreira.

Valor: A lei foi criada nesses termos. Por que reclamar agora?

Genro: A confusão foi feita por decisão irresponsável do Congresso, que fixou a correção pelo Fundeb, desconfigurando o conceito de piso [ao fixar um indexador de correção baseado em portarias] ao não prever que ele seja atualizado por um indexador de inflação.

Valor: O Rio Grande do Sul dá os reajustes anuais como manda a lei?

Genro: Fizemos as correções através de um completivo salarial obedecendo os R$ 1.451 do piso. A partir daí aprovamos os reajustes até 2014. Não usamos o reajuste do Fundeb porque a lei é inconstitucional, não pode ser cumprida por ninguém. Se o Supremo mantiver a constitucionalidade, os Estados perdem autonomia sobre seus orçamentos e capacidade negocial que têm com os sindicatos.

Valor: O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, disse que a judicialização da lei é um equívoco.

Genro: É uma visão equivocada do assunto, de quem está por fora.