Título: Banco Postal conquista grandes centros
Autor: Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 17/10/2006, Finanças, p. C8

A faxineira Hosana Maria do Nascimento Cruz, o manobrista Marcos da Silva Lima e o camelô Jaelson Silva Ribeiro têm várias coisas em comum. Os três trabalham nas imediações da avenida Paulista, o tradicional centro de São Paulo, uma das vias com maior oferta produtos e serviços financeiros da cidade. Em seus 2,5 quilômetros de extensão, existem quatro dezenas de agências bancárias, praticamente duas por quadra. Nada menos que sete bancos têm sede na avenida Paulista: dos internacionais Citibank, ABN AMRO e Tokyo Mitsubishi aos brasileiríssimos BicBanco e Panamericano. Hosana, Marcos e Jaelson, no entanto, preferiram abrir conta corrente no Banco Postal localizado na alameda Santos, quase esquina com a rua Augusta.

A parceria entre o Bradesco e os Correios, que nasceu de uma licitação realizada em agosto de 2001 e começou efetivamente a funcionar em 25 de março de 2002, foi idealizada originalmente para integrar ao mundo financeiro o brasileiro dos grotões. O Banco Postal vem desempenhando bem esse papel: já tem 5.551 agências espalhadas por 4.834 municípios dos 5.561 existentes no país. Em 1.753 municípios onde foi instalado nem havia bancos - 405 deles ficam a mais de 100 quilômetros de uma praça bancária e não têm estrada pavimentada; e, em 75 deles, só se chega de barco ou avião de pequeno porte.

Com o Banco Postal, o morador de Santa Rosa do Purus, localizada às margens do rio Purus, no Acre, não precisa mais ir até Sena Madureira - a cidade mais próxima com agência bancária -, para receber a aposentadoria ou pagar uma conta. Só a viagem de ida leva oito dias de barco. Ao receber a aposentadoria, a pessoa gastava quase todo o dinheiro em compras em Sena Madureira. Pouco dinheiro circulava em Santa Rosa do Purus. Em muitos casos, o cartão de benefícios até ficava na mão do comerciante de Sena Madureira.

Mas, o surpreendente e inesperado é o sucesso do Banco Postal nos grandes centros.

Julio Bittencour/Valor A faxineira Hosana, 34 anos, natural de Timbaúba (PE), há 15 anos em São Paulo, conheceu o Banco Postal ao procurar a agência dos Correios para enviar cartas aos parentes. Há um ano resolveu abrir sua conta. Apesar de receber o salário em um dos maiores bancos de varejo do mercado, transfere o dinheiro para o Banco Postal, onde também paga as contas de água, luz, telefone e aluguel. Hosana gosta do Banco Postal porque tem pouca fila e um horário de atendimento maior do que o das agências bancárias tradicionais.

O manobrista Marcos, 24 anos, nascido em São Paulo, também recebe o salário em um grande banco de varejo público e transfere uma parte para o Banco Postal porque considera seu atendimento mais amigável, sem portas giratórias nas agências e horário de atendimento mais amplo, além cobrar menos pelos serviços.

O camelô de produtos eletrônicos Jaelson, 26 anos, de Capim Grosso (BA), há um ano e meio morando em São Paulo, prefere o Banco Postal porque há sempre uma agência "perto do serviço". Foi no Banco Postal que abriu sua primeira conta bancária e já tem até um pouco de dinheiro na poupança. O atendimento é simples e gentil, sem burocracia, acrescentou.

Outro bom exemplo é a cidade de Japeri (RJ), última parada da linha da Central do Brasil. Apesar de estar a apenas 70 quilômetros da capital do estado e ter 82,3 mil habitantes, Japeri é uma cidade dormitório que não tinha agência bancária. Os moradores de Japeri tinham que se deslocar até a cidade vizinha de Queimados para saldar contas e receber pagamentos. Com a agência do Banco Postal, o dinheiro passou a circular na cidade. Na seqüência, o Bradesco instalou quatro máquinas de auto-atendimento Bradesco Dia e Noite e, finalmente, uma agência do banco.

Dos 5,5 milhões de clientes do Banco Postal, 37% estão na região Sudeste, 30% no Nordeste, 13% no Centro-oeste, 10% no Sul e 10% no Norte. Entre os clientes, 44,67% ganham até um salário mínimo; 43,25%, de um a três salários mínimos; e 12%, mais de três salários mínimos. Um milhão são aposentados.

A experiência do Banco Postal levou o diretor executivo do Bradesco, Odair Afonso Rebelato, a concluir que "é nas cidades grandes que há proporcionalmente mais cliente de baixa renda com potencial para ser bancarizado". São pessoas com alguma renda, mas não o suficiente para serem atendidas nos bancos. Outro público do Banco Postal são estudantes, muitos dos quais recebem recursos enviados pelos pais por meio do banco.

Estima-se que o número de pessoas não bancarizadas chega a 45 milhões, ou metade da população economicamente ativa (PEA) - a maior parte está localizada nos grandes centros.

Uma das características do Banco Postal que atrai a clientela é o horário de atendimento mais amplo do que o das agências bancárias e a simplicidade das lojas dos Correios, sem portas giratórias. Em geral, as lojas dos Correios funcionam das 9 às 17 horas. Algumas abrem uma hora antes. Aos sábados, 468 agências estão abertas das 8 às 12 horas; algumas vão até às 17 horas, podendo chegar às 18 horas. "O cliente do Banco Postal se sente mais à vontade nesse ambiente", disse Rebelato

Outro poderoso chamariz é o custo mais baixo. O Banco Postal cobra apenas R$ 3,80 por mês em tarifa - um terço de uma tarifa básica de um banco convencional -, dando ao cliente o direito de possuir cartão de débito (100% possuem), realizar quatro saques, quatro depósitos, retirar dois extratos, além de pagar um número ilimitado de contas em débito automático. O cliente que quiser pode ter talão de crédito, mas apenas 16% exercem essa alternativa.

O Banco Postal aceita depósitos à vista a partir de R$ 5,00 e os clientes têm limites pré-aprovados de crédito. Cerca de 84% dos clientes investem em poupança; e 24,5% já tomaram crédito. O Banco Postal realizou um total de 3 milhões de operações de empréstimo, com valor médio de R$ 400 no caso de pessoas físicas; e de R$ 2 mil a R$ 3 mil, no de pessoas jurídicas.

O Banco Postal já emprestou R$ 1,5 milhão na linha de crédito imobiliário (0,95% ao mês); R$ 30 milhões no rural (0,7% ao mês); R$ 120 milhões no Finame, (0,50% a 1% ao mês); tem microcrédito (2% ao mês); e cartão de crédito (4% a 5%).

A expansão do Banco Postal também difundiu nas praças em que se instalou o uso do cartão de crédito, em parceria com a Visa. "A idéia é reduzir o custo e o risco do transporte de dinheiro", disse Rebelato. Nos municípios longínquos, o estímulo à filiação à Visa também levou à regularização da situação das pequenas empresas, animadas pelo aumento dos negócios, acrescentou o executivo do banco.

O Bradesco investiu R$ 450 milhões no Banco Postal, sendo R$ 200 milhões na licitação e o restante em infra-estrutura e treinamento de pessoal. "O grande racional do Banco Postal foi aumentar o atendimento bancário a um custo baixo. Foi uma oportunidade que o Bradesco viu de ampliar a rede de um modo mais barato e exercer com mais amplitude a oferta de serviços financeiros", afirmou o diretor executivo do banco. Neste momento do projeto, o retorno está empatando com os investimentos. O prazo da parceria vai até 2011.

O Banco Postal se inspirou em uma ampla experiência no mercado internacional. Na Holanda, o banco postal tem 4,2 mil pontos e US$ 25,1 bilhões em depósitos; na França, 17 mil e US$ 5,8 bilhões; na Alemanha, são 13,5 mil com 45,1 bilhões de euros; e no Japão, 24 mil pontos e US$ 2 trilhões.