Título: Vendas do varejo reagem e sobem 2,3%
Autor: Santos, Chico
Fonte: Valor Econômico, 18/10/2006, Brasil, p. A3

Após dois meses consecutivos de taxas negativas, o comércio varejista brasileiro reagiu vigorosamente em agosto, com o volume de vendas crescendo 2,32% sobre julho na série com ajuste sazonal, segundo números divulgados ontem pelo IBGE. O mercado, que esperava desempenho abaixo de 1%, foi surpreendido e correu em busca de explicações. Elas vão da recuperação do crédito, após um período de aumento da inadimplência, passam pela redução dos juros, aumento do emprego e da renda, desova de estoques e chegam até a mudança de hábitos na prática de presentear no Dia dos Pais.

O bom desempenho do comércio deu-se em todas as formas de comparação. Em relação a agosto de 2005, o incremento foi de 6,27% (o mercado esperava 3,5%), após modestos 2,25% em julho. No acumulado do ano, a taxa de crescimento das vendas é 5,3%, e nos 12 meses encerrados em agosto, o resultado é de 5,1%. Entre os setores, móveis e eletrodomésticos se destacaram, com alta de 7,7%.

Na comparação com o mesmo mês do ano passado, destaque para a recuperação em Estados que estão no olho da crise do agronegócio, como Paraná (6,84%), Santa Catarina (8,39%), Rio Grande do Sul (3,2%), Mato Grosso do Sul (4,61%) e Goiás (4,67%). Mato Grosso (-12,36%) foi o único Estado com desempenho negativo.

"O IBGE havia dito que crédito tinha chegado ao fim, mas o ciclo é muito mais duradouro", disse o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas. Segundo ele, a subida da inadimplência em maio explica as quedas de junho (-0,42%) e de julho (-0,56%) na série com ajuste sazonal. O aumento do rendimento médio do trabalho e do emprego com carteira assinada, respectivamente, de 3,5% e de 5,9% sobre agosto de 2005, permitiram, na avaliação do analista, a renegociação dos débitos em bases mais vantajosas -graças à elevada liquidez trazida pela contínua conversão em reais dos dólares que seguem entrando no país-, retomando o ciclo de expansão do crédito. O crédito fácil explicaria até o crescimento em áreas assoladas pela crise agrária.

Além disso, de acordo com Freitas, os alimentos caíram de preço, graças à manutenção da valorização do real, estimulando o consumo. O analista avalia que este ano o volume de vendas no varejo irá crescer de 5,5% a 6%, superando a indústria e o movimento do ano passado (4,9%). Para 2007, ele espera a manutenção do crescimento, com quedas sazonais.

Para Nilo Macedo, da equipe de analistas do IBGE, além da melhoria nos salários e no emprego e a continuidade da queda dos juros, uma mudança nos hábitos de consumo tem forte participação no resultado de agosto. Segundo ele, há algum tempo as pessoas vêm passando a presentear em dias como o das Mães (maio) e dos Pais (agosto) mais com eletroeletrônicos do que com artigos de vestuário, como antigamente. Essa mudança, ainda não devidamente captada pelos modelos de ajuste sazonal, explicaria grande parte dos números divulgados ontem.

A economista Giovana Roca, do Unibanco, considera que os números do comércio foram tão surpreendentes que, se o próximo resultado da produção industrial (setembro) for bom, os analistas começarão a rever para cima as projeções do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano. A do Unibanco está em 3,2%. Apesar de surpreendida, disse que era estranho que com juros caindo e os indicadores de emprego melhorando não houvesse reação do comércio.

Para os analistas do Credit Suisse, que esperavam crescimento dessazonalizado de 0,4%, a reação do comércio pode estar relacionada com desova de estoques em setores como vestuário e calçados e eletrodomésticos.