Título: Yeda vai adotar leilão de descontos para pagar dívidas
Autor: Bueno, Sérgio
Fonte: Valor Econômico, 07/02/2007, Brasil, p. A4

A crise das finanças públicas do Rio Grande do Sul levou a governadora Yeda Crusius (PSDB) a decidir pela realização de um leilão de descontos para pagamento de R$ 1,3 bilhão em dívidas com fornecedores de produtos e serviços contratados até o fim do ano passado. O decreto será finalizado este mês e fará parte de um conjunto de medidas adotadas pelo novo governo para tentar reduzir pela metade o déficit estimado em R$ 2,2 bilhões sobre o orçamento de R$ 20,6 bilhões de 2007.

O mecanismo, já adotado pelo ex-prefeito de São Paulo (hoje governador) José Serra quando assumiu o cargo em 2005, e no primeiro mandato do governador de Minas Gerais, Aécio Neves, ambos também do PSDB, garantirá prioridade à liquidação das dívidas com os credores que oferecem maior taxa de desconto ao governo, limitada a 30%. "No preço de outros tempos está embutida a insegurança do pagamento", disse a governadora em entrevista ao Valor.

De acordo com ela, o leilão vai limpar uma "montanha" de contratos de pequeno valor, que "roubam confiança, tempo e recursos" do governo estadual. O tempo médio de atraso nos pagamentos está em sete meses, mas com a adoção do regime de caixa desde o início de janeiro o governo promete agora comprar apenas o que tiver condições efetivas de honrar. "O nível geral de contratações do Estado vai diminuir, mas só vamos contratar o que puder ser pago", afirmou.

A governadora também admite que, ainda este ano, será necessário retomar o "debate" sobre a necessidade de aumento de alíquotas de ICMS para fazer frente às dificuldades financeiras do Estado. Antes da posse, ela negociou com o sucessor, Germano Rigotto (PMDB), o envio de projetos de lei à Assembléia Legislativa que elevavam o imposto sobre produtos como bebidas, perfumes, brinquedos, cigarros e armas e prorrogava por mais dois anos alíquotas ampliadas em 2004 para energia, combustíveis e telecomunicações. As propostas foram derrotadas.

"Quando o regime de caixa mostrar que não tem (dinheiro) para pagar, deve haver um debate de toda a sociedade", comentou. Segundo ela, o Rio Grande do Sul tem as menores cargas de ICMS do país e em algum momento o governo irá "liderar" a discussão sobre como levar o assunto adiante. Em dezembro, no dia da votação do pacote, o vice-governador, Paulo Afonso Feijó (PFL), participou de uma passeata de empresários contrários ao aumento do imposto.

O leilão de dívidas e a possibilidade de reabertura do debate sobre aumento de impostos somam-se a providências anunciadas ainda em janeiro por Yeda para reduzir o déficit em quase R$ 1 bilhão. Deste total, pouco mais da metade deverá ser alcançada com medidas como a modernização da Secretaria da Fazenda para reforçar a cobrança da dívida ativa, a revisão dos incentivos fiscais concedidos às empresas e a reavaliação dos critérios para a liberação da transferência de créditos de ICMS pelas empresas exportadoras.

O restante deverá vir de outras iniciativas como o corte de despesas de custeio em 30%, do gasto com funcionários em cargos de confiança em 20% e do congelamento de despesas ordinárias por 100 dias. A adoção do regime de caixa, que implica no ajuste permanente do cronograma mensal de pagamentos e das metas bimestrais de arrecadação e resultados primários de acordo com o efetivo desempenho do Tesouro, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, também ajudará a garantir uma gestão mais realista dos gastos ao longo do ano, entende a governadora.

De acordo com Yeda, o volume anual de renúncia fiscal no Rio Grande do Sul chega a R$ 6 bilhões, desde a redução de alíquotas de ICMS para produtos da cesta básica, a desoneração das exportações e o programa estadual de incentivos Fundopem, que reduz por até oito anos o imposto recolhido por empresas que investem em novos empreendimentos no Estado.

No caso da mudança das regras para transferência de créditos de ICMS, que já constava dos projetos encaminhados em dezembro à Assembléia e que agora será implementada por decreto, a idéia é estabelecer um teto de R$ 300 milhões ou um pouco mais, ante os mais de R$ 500 milhões liberados em 2006.

Junto com a tentativa de aumentar alíquotas, a alteração nas liberações de créditos de ICMS aos exportadores foi o que mais despertou a ira das entidades empresariais contra o então futuro governo em dezembro. Agora, a governadora acredita que os empresários estão mais dispostos a negociar "olhando para o futuro".