Título: Surto de bactéria mata 11 bebês
Autor: Sakkis, Ariadne; Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 13/11/2010, Cidades, p. 31

Superlotação e falta de médicos são apontados como as causas para o alto índice de mortalidade registrado desde o início de outubro no Hospital Regional da Asa Sul. Apenas nos primeiros 10 dias de novembro, seis recém-nascidos perderam a vida na unidade

Três meses depois do aparecimento da superbactéria Klebsiella Pneumoniae Carbapenemase (KPC) no Distrito Federal, mais um surto de infecção hospitalar ameaça a rede pública. E agora, os pacientes atingidos pelo problema são ainda mais vulneráveis. Desde o início de outubro, 11 recém-nascidos morreram no Hospital Regional da Asa Sul (Hras) em virtude da contaminação por três tipos de bactérias. Nos primeiros 10 dias de novembro foram seis óbitos por infecção hospitalar, mais do que o total registrado no mês passado, quando cinco bebês morreram depois de contraírem as bactérias no hospital.

Com a UTI neonatal superlotada e diante do risco de disseminação dos micro-organismos, o Hras começou ontem a transferir gestantes que chegam ao local para realizar partos. A unidade de tratamento intensivo neonatal do hospital tem 30 leitos, mas o número de bebês internados chega a quase 40. O ideal é que a unidade tivesse 45 vagas para cuidados intensivos, mas, para isso, a Secretaria de Saúde teria que contratar mais 30 médicos ¿ missão quase impossível diante da dificuldade do governo em encontrar pediatras dispostos a trabalhar na rede pública.

O excesso de pacientes e a falta de funcionários são a fórmula ideal para a proliferação de infecções hospitalares. Sem tempo para cuidar de todos os bebês internados, muitos enfermeiros e médicos não seguem todas as normas técnicas que devem ser adotadas em unidades neonatais, como a rigorosa higienização das mãos. A direção do Hras já sabe que os bebês que morreram foram infectados pelas bactérias Estafilococos, Serratia ou pela Klebsiella ¿ o mesmo tipo da bactéria KPC, porém, essa variedade não sofre mutação nem é resistente a antibióticos. Atualmente, há quatro bebês isolados por conta de infecção hospitalar.

O Hras é o hospital de referência da rede pública para atendimento pediátrico e obstétrico no DF. Mas Viviane Pereira dos Santos, 17 anos, não conseguiu receber assistência para realizar seu parto na unidade. Ela chegou ao local por volta das 16h30 e, logo depois, foi informada de que o nascimento de seu primeiro filho não poderia acontecer lá. ¿Os médicos disseram que eu não teria o meu filho aqui por causa de um problema de contaminação no berçário. Se o meu bebê tivesse qualquer complicação, ele não poderia ir para a UTI¿, explicou a paciente, que foi imediatamente encaminhada ao Hospital Regional da Asa Norte.

Apesar dos rumores de que os recém-nascidos podem ter sido infectados pela superbactéria KPC, o diretor do Hospital Regional da Asa Sul, Alberto Henrique Barbosa, garante que não há casos de infecção por esse micro-organismo no local. Ele reconhece, no entanto, que há um surto de infecção hospitalar na unidade. ¿Isso é resultado da superlotação e da falta de profissionais, o que ocasiona uma quebra dos protocolos de segurança para controle das infecções hospitalares¿, explica. Segundo o diretor, o número aceitável de mortes de bebês seria de, no máximo, dois ou três por mês.

Exceções Para resolver o problema, a saída encontrada pela equipe do Hras foi restringir os atendimentos na maternidade. Agora, somente os casos graves serão recebidos. Mulheres com menos de 30 semanas de gravidez ou aquelas que estão entre a 38ª e a 40ª semana, mas que apresentam complicações como hipertensão ou má-formação do feto, terão assistência assegurada. As outras mães serão encaminhadas a unidades da rede pública como o Hran e o Hospital Regional de Taguatinga.

Não fossem essas exceções, Naldirene Ferreira da Silva, 36 anos, teria encontrado mais uma porta fechada após percorrer hospitais públicos no Gama, em Samambaia e em Taguatinga. ¿A gravidez dela é de risco. O médico disse que se o parto não for feito imediatamente há o risco de ela perder o bebê¿, disse a amiga Ângela Aparecida de Campos. Por conta da situação delicada, Naldirene conseguiu atendimento no Hras.

O presidente da Sociedade Brasiliense de Pediatria, Dennis Alexander, conta que o problema das infecções hospitalares sempre fez parte da rotina das equipes do Hospital da Asa Sul. ¿Infelizmente, isso é rotineiro. Volta e meia há um descontrole das infecções hospitalares. É um problema crônico¿, relata o especialista. ¿Na rede pública do Distrito Federal, não há muito investimento na área de UTI neonatal. E as infecções são sempre perigosas para os bebês, que nascem desprovidos de defesas naturais¿, acrescenta Dennis.

PARA SABER MAIS Cuidados especiais

A neonatologia é o ramo da pediatria que se dedica a cuidar dos recém-nascidos sadios ou doentes. São considerados recém-nascidos as crianças entre um e 28 dias. A partir dessa idade, os bebês podem receber os cuidados de um neonatalogista caso apresentem pouco peso ou outras complicações que os levem à hospitalização em unidades neonatais ¿ os antigos berçários ¿ ou mesmo nas Unidades de Terapias Intensivas. Crianças com má-formação, que apresentaram problemas respiratórios no momento do parto, icterícia, anemia e convulsões, por exemplo, precisam do tratamento especial. No momento do nascimento, ele deve estar de prontidão para eventuais emergências, como a necessidade de reanimação. A atenção do especialista é fundamental, já que uma das características do período neonatal são as altas taxas de mortalidade devido à fragilidade dos bebês, em especial a de crianças prematuras.

Crescimento assusta

Número de mortes de recém-nascidos por infecção hospitalar no Hras:

Agosto - 2 Setembro - 3 Outubro - 5 Novembro (até dia 10) - 6