Título: Um conselho que vai de Campos Machado a Turco Loco
Autor: Klein , Cristian
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2012, Política, p. A12

Se o Campos Machado se jogar do alto do edifício Itália, pode ir atrás que alguma coisa tem lá embaixo". A frase atribuída ao deputado estadual paulista Roque Barbiere (PTB) ganhou mais sentido no meio político depois que a candidatura de Celso Russomanno (PRB) à Prefeitura de São Paulo deslanchou a ponto de levá-lo à liderança isolada da corrida municipal.

Campos Machado, cacique do PTB no Estado, apostou em Russomanno quando quase todos acreditavam que o candidato seria um cavalo paraguaio. A expectativa era que o apresentador e ex-deputado federal, filiado a uma legenda pequena, desidratasse tão logo começasse a propaganda eleitoral no rádio e na TV.

"Diziam que era uma loucura do PTB. Mas ele é cavalo britânico prontinho pra correr dez milhas sem cansar", afirma o deputado estadual, com seu jeito de caipira que não esconde a fama de raposa política.

Considerado o homem-forte da Assembleia Legislativa paulista, apesar de liderar uma bancada de quatro de um total de 94 deputados, Campos Machado esperou até o último momento para pôr suas fichas na coligação de Russomanno, então apoiado por apenas quatro legendas minúsculas: PTN, PTdoB, PHS e PRP.

Hoje, Antônio Carlos de Campos Machado é o comandante político da candidatura que tira o sono de petistas e tucanos, surpresos com a quebra da bipolarização na cidade.

Se Russomanno está na dúvida se deve ir ou não a um debate que seria promovido pelo portal UOL e pelo jornal "Folha de S.Paulo", é o deputado quem bate o martelo: não vá. "Ele não faz nada sem o conselho. Nada. Isso foi combinado. Só trato da parte política. E em time que está ganhando não se mexe", afirma.

Campos Machado dá o tom do conselho político que se reúne todas as segundas-feiras, às 17h, no casarão transformado em escritório de campanha, na Avenida Itacira, no Planalto Paulista, zona sul de São Paulo. Ali, um grupo de 14 políticos, além de Russomanno, se encontra para traçar as linhas de ação da candidatura. São quatro representantes do PTB, quatro do PRB, quatro das demais legendas coligadas, além de dois convidados de Campos Machado, ex-colegas seus da Assembleia: Adilson Barroso, presidente nacional do Partido Ecológico Nacional (PEN) - sigla cujo registro não saiu a tempo de disputar estas eleições - e o empresário e ex-deputado estadual pelo PSDB Alberto Hiar, o Turco Loco, dono da grife Cavalera.

O conselho político é o território de Campos Machado, que afirma comandá-lo de um modo "meio presidencialista". Sua proeminência é fruto do faro político e da experiência de quem especializou sua vida pública em São Paulo. Desde 1990, já se elegeu seis vezes a deputado estadual.

Fora desse campo de atuação política, os domínios são do PRB, que cuida dos assuntos que Campos Machado denomina de "administrativos", como contabilidade, arrecadação de recursos e propaganda. É onde está a trupe mais próxima de Russomanno, como o coronel Heldo Fernando de Souza, que coordena a segurança; o jornalista Carlos Baltazar, que elabora o programa de governo; o economista Antônio Carlos de Lima, amigo há mais de 20 anos do candidato e que cuida da agenda; o marqueteiro Ricardo Bérgamo; e a trinca de dirigentes do PRB, todos ligados à Igreja Universal do Reino de Deus: o presidente municipal, Aildo Ferreira (tesoureiro); o estadual, Vinícius Carvalho (sub-coordenador da campanha); e o nacional, Marcos Pereira (coordenador-geral). Bispo licenciado da Universal e ex-vice-presidente da Rede Record, foi Pereira quem filiou Celso Russomanno, ex-PP de Paulo Maluf, ao PRB.

A negociação de Campos Machado com Russomanno veio por intermédio do ex-governador José Maria Marin, atual presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Marin, para quem Russomanno trabalhou no início da carreira, na virada dos anos 1970 para os 80, lhe recomendou fortemente o apoio ao candidato.

O deputado, nascido no município de Cerqueira César, a 300 quilômetros da capital, gosta de cultivar a fama de político habilidoso. Durante a entrevista, um assessor interrompe a conversa pela terceira vez para lembrá-lo de que todos os líderes estão o esperando para fechar alguma coisa da ordem do dia. Campos Machado não resiste: "Você só se impõe pelo trabalho, não falam que sou o melhor orador da Assembleia?", diz.

A esperteza política do deputado, no entanto, é desafiada pela possibilidade de Russomanno traí-lo - ao dar mais espaço para partidos maiores num eventual governo. Há ainda quem diga que mesmo a decisão de se coligar com o PRB foi mais uma falta de opção do que uma escolha visionária.

"Campos Machado decidiu apoiar Russomanno com dor no coração. Ele é um sonhador e queria candidatura própria", afirma um aliado, que cita o vereador Adilson Amadeu (PTB) como um dos maiores responsáveis por levar o partido a apoiar o candidato.

Amadeu, amigo de longa data de Russomanno, teria um papel central em caso de vitória e, se reeleito, poderia assumir a presidência ou a liderança do governo na Câmara, de acordo com esta mesma fonte.

O cacique do PTB reconhece as dificuldades que resultaram no apoio a Russomanno. No início do ano passado, Campos Machado tinha conversas adiantadas com Gabriel Chalita, então no PSB, para filiá-lo ao partido. O deputado federal, porém, para sua surpresa, acabou fechando com o PMDB, a convite do vice-presidente da República, Michel Temer, o que acabou frustrando seus planos de criar uma terceira via na corrida municipal.

Neste ano, os principais concorrentes ofereceram a vice para Campos Machado, que declinou de todos os convites. O PMDB, por ter lhe roubado Chalita; o PT, por representar uma ameaça à reeleição de seu aliado, o governador Geraldo Alckmin; e o PSDB, pelo trauma da eleição de 2008.

Sua forte amizade com o governador, em tese, poderia tê-lo levado à chapa tucana de José Serra. Mas seu compromisso, diz, é com Alckmin e não com o PSDB, especialmente o grupo ligado a Serra, que, em 2008, debandou da campanha de Alckmin e apoiou o prefeito Gilberto Kassab, então no DEM. Campos Machado era o candidato a vice - como já havia sido na derrota anterior de Alckmin à prefeitura, em 2000. Por esta fidelidade já demonstrada ao governador - a quem, assegura, apoiará em 2014 - o petebista se sentiu com crédito para fazer seu próprio jogo na eleição municipal.

"O Russomanno era o que a gente queria ser. Uma terceira ou quarta via, já que no início do ano, havia a possibilidade de candidaturas de PT, PSDB e do [Guilherme] Afif [Domingos], pelo PSD", diz o deputado estadual.

Ás vésperas do limite da convenção, numa quinta-feira, 28 de junho, Campos Machado abria mão da pré-candidatura do advogado Luiz Flávio D"Urso (PTB) - que caía de 1% para zero em pesquisa eleitoral - e o indicava a vice na chapa de Russomanno.

Numa campanha marcada pelo personalismo de Russomanno e do frágil enraizamento institucional, o deputado entrou com o PTB que, se orgulha, dá a musculatura partidária à candidatura. "Oitenta por cento dos eventos, como carreata e mobilização de rua, são feitos pelo PTB. Temos mais militantes na cidade que o PT", gaba-se Campos Machado.