Título: Acionista disputa voto a voto na Telemar
Autor: Vieira, Catharina e Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 18/10/2006, Empresas, p. B3

A campanha pelos votos está a todo vapor, e não se trata da disputa pelo Palácio do Planalto. Nos bastidores da maior reestruturação societária já proposta no Brasil, alguns detentores de ações ordinárias e preferenciais da Telemar tentam obter votos suficientes para barrar ou aprovar a operação.

A reestruturação propõe a conversão de todas as ações em ordinárias e a migração da nova empresa, a Oi Participações, para o Novo Mercado. A origem da disputa está na diferente relação de troca proposta para as ações ordinárias (ON) e preferenciais (PN). Os donos de ON receberão 2,6 vezes mais ações que os preferencialistas. É o maior prêmio aos donos de ordinárias de todas as empresas que foram para o Novo Mercado.

É uma corrida contra o tempo. A assembléia que selará o futuro da companhia está marcada para 13 de novembro. E o que está em jogo é mais do que a aprovação da operação. O que acontecer com a Telemar provavelmente vai sinalizar o futuro da Brasil Telecom, outra reestruturação de grande porte esperada pelos investidores. Além disso, em meio ao complicado processo, um parecer da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que acaba tornando o voto de aprovação da operação apenas possível aos preferencialistas, colocou mais lenha na fogueira do debate.

Enquanto a apresentação da operação a investidores segue a todo vapor, com a realização de reuniões para mais de 160 grupos, os acionistas minoritários se movimentam: desde setembro já há registros de mais de dez consultas ou reclamações de investidores e advogados no site da CVM. Alguns acionistas estrangeiros, como o Genesis, preferiram se manifestar na Securities Exchange Comission (SEC, a CVM americana).

Os que possuem ações ordinárias estudam maneiras de fazer valer o direito de voto na assembléia. Já um grupo de preferencialistas, liderados pela gestora local Pólo e pela estrangeira Brandes Partners, deram entrada na autarquia com pedido de interrupção da assembléia geral extraordinária. Também pedem reconsideração da última posição do colegiado da CVM, que abre caminho para aqueles que possuem ONs e PNs possam votar com estas últimas.

Analistas, investidores e a própria empresa já começaram a fazer as contas a partir da lista de acionistas atualizada. Detentores de cerca de 65% das preferenciais (seja no mercado local ou por meio de American Depositary Receipts - recibos de ações negociados nos EUA), os investidores estrangeiros podem ser decisivos para o futuro da reestruturação da Telemar, mas não se sabe quantos deles se apresentarão para votar. Além de Brandes, o gestor inglês de recursos Genesis já anunciou que é contra a operação (ver nesta página).

Dos acionistas que fazem parte do acordo de acionistas da companhia, apenas BNDES e Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) têm também ações preferenciais. O Valor apurou que a Previ tem cerca de 4,41% das PNs e o BNDES, 2,15%, o que somado daria pouco mais de 6,5%. Nenhuma das duas instituições quis comentar sobre a assembléia. De acordo com fonte ligada a uma delas, ainda não há decisão formal sobre a possibilidade de votar na assembléia. Advogados e especialistas vêm sendo consultados para tirar dúvidas sobre a questão. No entanto, se Previ e BNDEs votarem, a posição será a favor da reestruturação. "A migração para o Novo Mercado promove alinhamento de interesses", justifica.

Para um gestor que está acompanhando de perto o processo, a ida para o Novo Mercado não justifica uma relação de troca que prejudica os preferencialistas. "Outras empresas migraram para o Novo Mercado e as relações de troca não eram tão diferentes", afirma ele. A relação de troca foi estabelecida pelos controladores de forma a permitir que eles recuperassem o valor investido na privatização, em 1997, atualizado até hoje. A avaliação dos sócios é de que, no caso de outras empresas que migraram para o Novo Mercado, como a Embraer, não havia necessidade de prêmio aos controlaodres por causa da valorização dos papéis da companhia nos últimos anos e do retorno aos acionistas.

É difícil saber como será o desfecho da votação. Há investidores de porte, como a Templeton e a Capital, que não se posicionaram a respeito e ainda que a Brandes Partners e a Genesis tenham se colocado contra a proposta, num cenário de quórum reduzido, como pode ocorrer caso não se atinja o percentual necessário na primeira e na segunda assembléia (50% mais um), os percentuais mudam de peso, de acordo com os presentes (25% mais um) em uma terceira chamada.

Segundo o sócio da Pólo, Marcos Duarte, o objetivo do seu grupo é impedir que a assembléia ocorra. "Entendemos que há abuso de poder de controle e desvio de finalidade. Sem a oferta secundária (venda das ações dos controladores, prevista no desenho original da operação, anunciada em abril), seria como se o controlador recebesse o prêmio de controle sem fazer o desinvestimento", completa. Ele diz que estuda ainda eventuais medidas legais que possam ser tomadas. Esta é a segunda vez que a Pólo trava uma disputa com a Telemar. A primeira foi na incorporação da operação de celular, a Oi.

Já o advogado e ex-presidente da CVM, Luiz Leonardo Cantidiano, que defende um grupo que possui ações ordinárias, diz que seus clientes deveriam ter o direito de voto normal. Na visão dele, a autarquia errou ao mexer nos direitos dos acionistas, dando o poder de voto apenas aos preferencialistas. "O certo seria a CVM questionar a relação de troca das ações, ver se ela é injusta realmente", diz Cantidiano. Ele lembra de quando era presidente da autarquia, em 2003, colocou-se contra a incorporação da Tele Centro Oeste Celular pela Telesp Celular exatamente porque na relação de troca as ordinárias levavam um prêmio de 160%.

Outra dúvida no mercado é sobre o aluguel de ações PN. Os investidores ainda não têm certeza sobre quem vota neste caso: aquele que comprou o papel ou aquele que alugou a ação do proprietário original. Segundo o diretor financeiro da Telemar, José Luis Salazar, a listagem de acionistas que vai valer é aquela que for apresentada pelo banco responsável no dia da assembléia. "Não tenho como entrar nesse nível de detalhe", afirma o diretor.

O aluguel de ações preferenciais de Telemar Norte Leste Participações (TNLP4) cresceu muito, especialmente desde abril, quando começou a reestruturação. Há atualmente cerca de 21 milhões de ações alugadas, o maior número desde 2003. Ao preço de fechamento do papel na bolsa na segunda-feira, de R$ 32,46, isso significa R$ 681,66 milhões em aluguel.

Segundo Salazar, a empresa tem feito todos os esclarecimentos solicitados por acionistas no mundo todo. "Já estivemos com cerca de 80% dos investidores. Foram cinco dias nos EUA, mais vários na Europa e as reuniões os gestores e a Apimec (reunião com analistas) no Brasil. Além disso, estamos visitando investidores específicos, como fundos de pensão e gestores", diz.

Com relação às críticas, ele considera que elas sejam em menor número. "É natural que surjam questionamentos. Cada um está no seu direito. Assim como os analistas, há relatórios que desfavoráveis e outros positivos. A opinião que vai prevalecer só vamos saber no dia 13", conclui Salazar.

A operação está sendo monitorada com atenção por analistas e investidores porque servirá de exemplo para outras empresas. "Espera-se que essa operação abra caminho para a da Brasil Telecom (BrT), cujas ações já são influenciadas pelas notícias que impactam as ações da Telemar", lembrou um gestor. "E muitos do que estão posicionados em Telemar estão também com posições em BrT", completou. (Colaborou Raquel Balarin)