Título: Um freio na especulação
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 14/11/2010, Economia, p. 16

Bancos e bolsa de valores lançam central para dar transparência às operações com derivativos, que levaram o mundo à crise

A segurança do sistema financeiro vai aumentar. Os bancos, com a Bolsa de Valores e a Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos (Cetip), estão criando mais um sistema, desta vez voltado para o risco de mercado. Trata-se da Central de Exposição a Derivativos (CED), uma empresa privada sem fins lucrativos, na qual as instituições financeiras poderão consultar a posição total dos seus clientes nessa área, registrada na BM&FBovespa e na Cetip. A cerimônia oficial de lançamento acontecerá nesta quarta-feira, dia 17, mas a nova central de risco só deverá estar funcionando a todo vapor em dezembro.

Para Marcelo Maziero, diretor da Comissão de Tesouraria da Febraban e responsável pelo setor de derivativos do Itaú Unibanco, a ideia da criação da entidade surgiu a partir da crise financeira internacional. Foram operações com derivativos que levaram o mundo ao colapso a partir de 15 de setembro de 2008, quando o banco norte-americano Lehman Brothers quebrou.

Embora o Brasil não tenha sofrido como os demais países, ocorreram problemas isolados, de empresas que ficaram superexpostas e, por isso, enfrentaram grandes dificuldades. Os casos mais emblemáticos foram os da Sadia, que acabou sendo engolida pela Perdigão, e da Aracruz, absorvida pela Votorantim Celulose. ¿A Central contribuirá para minimizar os riscos das empresas que, ao fazerem um conjunto de operações com várias instituições, podem acabar se inviabilizando no futuro¿, explica.

Rigidez A nova entidade segue o modelo da Central de Risco de Crédito do Banco Central. Os bancos só poderão consultar a posição em derivativos dos seus clientes se forem autorizados por eles. As informações individualizadas, ou seja, que cada instituição financeira faz com seu cliente, já estão devidamente registradas na Bolsa e na Cetip. A diferença, com a CED, é que, quando o cliente permitir, o banco acessará no novo sistema a posição total, com todo o sistema financeiro. A análise de risco, portanto, será feita com base na exposição que as empresas têm no mercado e não de operações individualizadas.

Maziero diz que não são só os bancos que fazem operações de derivativos que se interessarão pela nova central. A expectativa é de que as instituições que ofertam crédito no mercado também façam a adesão necessária à nova entidade. Elas têm interesse em saber como está a saúde do caixa das empresas que pegam empréstimos. O regulamento da Febraban é bastante rígido quanto às normas de segurança. Quem aderir à CED tem que cumprir uma série de compromissos para garantir o sigilo bancário das operações e evitar vazamentos.

Benefícios As empresas, segundo Maziero, também serão beneficiadas com a nova central de risco, principalmente as médias e pequenas que exportam, mas não possuem escala para ter uma equipe de gestão de risco. ¿As companhias vão se beneficiar da experiência dos bancos nessa área, pois passarão a contar com uma gestão financeira na análise dessas operações¿, observa.

As operações de derivativos não são novidades no mercado brasileiro. Os contratos com esses ativos são amplamente negociadas aqui e têm como objetivo principal a proteção das empresas ao risco cambial. Na crise de 2008, informa a Febraban, ficou clara a necessidade de maior transparência nessas operações.

No entender de Maziero, a CED é um passo a mais, uma vez que o Brasil possui um mercado de derivativos com um nível de transparência bem maior do que o observado no mercado internacional. ¿Os derivativos negociados no mercado doméstico são registrados na bolsa e na Cetip, o que permite às autoridades acesso direto às posições consolidadas de cada um¿, explica.

O efeito colateral da nova central de risco, no entanto, pode ir na contramão do que quer o governo com relação ao ingresso de moeda estrangeira no país. Para Maziero, a nova central aumentará a transparência e a segurança das operações, o investidor estrangeiro ficará mais tranquilo para ampliar as aplicações no país, ajudando a empurrar os preços do dólar ladeira abaixo.